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A Equação de Heckman e o investimento em educação no Brasil

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Em 2010, o brasileiro Flávio Cunha, junto com o americano e Nobel em economia James Heckman, escreveu um artigo chamado “Investing in Our Young People”. O trabalho é um resumo das principais descobertas publicadas pela literatura acadêmica sobre o desenvolvimento de habilidades por meio da educação.

Um dos frutos do trabalho da dupla está no que ficou conhecido como Equação de Heckman. Tal equação, colocando em poucas palavras, diz que, quanto mais cedo se investe na educação de uma criança, maior é o retorno. Disse Cunha: “Quando você investe US$ 1 nessa fase [de 0 a 5 anos], você recebe em troca US$ 6 quando a criança vira adulta. Isso é um retorno de investimento gigantesco de 13%, 14%. Se oferecesse [essa proposta] aos banqueiros de Wall Street, eles topariam na hora”. O trabalho dos pesquisadores também mostra que recuperar adolescentes e adultos que não tiveram uma boa educação na infância é possível, porém é bastante caro. Ou seja, alocar os recursos na primeira infância é o gasto público mais eficiente. Então, a pergunta que fica é: por que o governo não investe pesado na educação básica?

Ora, por acaso a criança vota? Não, quem vota é quem tem mais de 18 anos. Em outras palavras, abrir universidades públicas dá voto. Investir no ensino básico, não. A ciência chama isso de desigualdade intergeracional: o processo político é dominado por uma geração que não necessariamente tem os mesmos interesses que as gerações mais novas. Ressalto que a busca por maiores retornos privados não é um problema, pois é assim que agentes econômicos racionais funcionam em uma economia de mercado. Porém, cabe ao Estado conciliar retornos sociais e privados com o objetivo de maximizar o bem-estar social.

Seguramente, investir pesado no ensino superior não é a melhor maneira de se fazer isso. De acordo com os dados do INEP (2010), 52% dos alunos que ingressaram em uma instituição federal de ensino no país em 2010, em algum momento da graduação, desistiram do curso. Por que o contribuinte médio deveria subsidiar isso? Por que a população brasileira deveria arcar com esse risco?

Sim, os estudantes podem se formar e ganhar muito dinheiro, mas quem vai colher o grosso desses benefícios serão eles próprios, não a sociedade. É o que mostra Rodrigo Zeidan no seu livro Os problemas da educação no Brasil. De acordo com o colunista da Folha, o investimento em educação gera dois benefícios: o privado e o social. Cada real investido no ensino superior dá benefícios privados muito maiores que os sociais, enquanto no investimento na educação de base ocorre justamente o contrário.

Parênteses aqui para explicar a diferença entre benefícios privados e sociais. É sabido que, quanto mais educada a pessoa é, menor a probabilidade de ela ficar desempregada. Uma pesquisa da FGV mostrou que uma pessoa pós-graduada tem 422% a mais de chances de conseguir um emprego do que quem não se alfabetizou. Uma pesquisa em 2018 do IBGE mostrou que os mais afetados pelo desemprego são aqueles que têm ensino médio incompleto. Para esse grupo, a taxa é de 20%, contra 6,2% para os profissionais com curso superior. Assim, uma pessoa com educação de alto nível tende a ter um trabalho bem remunerado (benefício privado) e não fica dependente de programas assistencialistas (benefícios sociais). Agora voltemos ao tema principal.

Quando o governo paga por educação superior, está efetivamente arriscando o dinheiro do contribuinte médio – dinheiro que teria um uso mais eficaz para a sociedade se fosse direcionado para outros locais – em benefício de uma pequena parcela da população. Vale lembrar que, dos 10 países com melhor nota no PISA, TODOS investem mais no Ensino Básico do que no superior – mas no Brasil isso não acontece. Por que? Bem, a resposta está no terceiro parágrafo.

Há também uma questão que não está tão ligada à eficiência mas sim à moral. Vamos pegar por exemplo o setor de tecnologia da informação. Para quem não sabe, este é um setor extremamente carente de mão-de-obra qualificada – arrisco dizer que não há uma empresa de base tecnológica no Brasil que não tenha vagas em aberto na área. Em 2019, apareceu a seguinte manchete na revista Exame: “No radar de empresas estrangeiras, profissionais de TI deixam o País”. Para ilustrar a reportagem, o periódico trouxe o profissional Lucas Albuquerque, que tinha acabado de se mudar para a Polônia. Ele está longe de ser o único: “O grupo no WhatsApp de brasileiros de TI em Cracóvia tem 207 pessoas”. Eu achei o LinkedIn do rapaz e ele se formou na Universidade Federal de Campina Grande e foi bolsista do CNPq.

Eu não consigo imaginar como alguém pode não se indignar com isso. O Brasil está desesperado por mão-de-obra no setor, gastamos uma fortuna de dinheiro público para formar um profissional como o Lucas e o que ele faz depois de formado? Vai gerar valor no exterior!!! Só pode ser uma piada uma coisa dessas! Esse fenômeno se chama “fuga de cérebros”, e o Brasil está longe de ser o único país com esse problema. Há cerca de 9 mil médicos nigerianos trabalhando nos EUA e Reino Unido. Um detalhe interessante: na Nigéria há universidades públicas gratuitas (onde 60% dos universitários estudam), mas o mesmo não ocorre na Inglaterra nem nos EUA. Por mais bizarro que possa parecer, a verdade é que o pagador de impostos nigeriano está contribuindo para os sistemas de saúde inglês e americano.

Termino este texto dizendo o óbvio: não existe faculdade gratuita. A universidade pública transfere renda de toda a sociedade, incluindo os mais pobres, para uma parcela da elite intelectual e/ou econômica que, desse modo, não precisa pagar pelo curso universitário. Ela é um motor da nossa desigualdade.

*Artigo publicado originalmente por Conrado Abreu na página Liberalismo Brazuca no Facebook.

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