fbpx

Wilhelm Röpke: breves notas sobre o pensamento de um liberal na Alemanha do pós-guerra (Pt. 1)

Print Friendly, PDF & Email

Arthur Dalmarco*

Esse primeiro artigo é introdutório, parte de um esforço – deste que vos escreve – de lançar luz sobre um segmento de ideias liberais ainda pouco abordado nesta terra brasilis. Para tanto, elegi a vertente ordoliberal alemã para iniciar uma reflexão mais longa, da qual, espero, possamos extrair insights para melhor avaliarmos o panorama brasileiro.economic-growth

“To what extent and with what degree of lasting success has that economic order which is appropriate to a free society, namely, the market economy, been able to hold its own against the collectivist economic order, which is incompatible with free society in the long run?”

Com essa simples indagação, tão distante de frequentar as mentes da intelectualidade brasileira em tempos mais atuais, Wilhelm Röpke abre o caminho em sua obra “A Humane Economy – The Social Framework of the Free Market”[1] (1960) para uma refinada análise sobre os caminhos e problemas que envolvem a resoluta opção de se buscar uma sociedade livre, baseada na defesa dos direitos individuais e na confiança sobre os princípios que regem os mercados.

Pertencente à tradição ordoliberal alemã, Röpke é possivelmente o mais sensível interlocutor das ideias que acabaram por moldar os fins a serem perseguidos pela Alemanha Ocidental no período de pós-guerra – uma reconstrução baseada centralmente no indivíduo, e na sua busca por prosperidade em meio a um cenário caótico, e de resiliente disputa ideológica.

Apesar de declarar[2] que após algum tempo a disputa em sua dimensão ideológica foi atenuada pelos resultados positivos da orientação fornecida pela Escola de Freiburg (por mentes como Ludwig Erhard, Walter Eucken e Franz Böhm) no período – que ficou conhecido como “milagre econômico” –, Röpke era categórico ao afirmar que “em uma época de constantes “lapsos de memória” pelas pessoas, é de grande utilidade relembrar o quanto o futuro para a defesa da economia de mercado parecia nebuloso ao fim da Segunda Grande Guerra”.

Após 10 anos de inflação reprimida e severa mutilação política (1935-1945), a Alemanha foi, contrariamente ao esperado, o país capaz de nadar contra a corrente coletivista e inflacionária que se alastrava pelos demais países da Europa (com base, fundamentalmente, em posturas keynesianas) para criar e manter uma estrutura que abraçou, a sua própria maneira, o livre-mercado e a disciplina monetária.

O impacto de tal postura, no período de 15 anos subsequentes, culminou no ponto de erguer severas interrogações sobre as direções adotadas pelos demais países – fato curioso é que a galopante falha das posturas estatizantes (conduzidas por socialistas) na Grã-Bretanha, associada ao progressivo descrédito da União Soviética, produziram o efeito de conduzir o país que perdeu a guerra, em médio prazo, a ocupar melhor posição que os seus vencedores[3].

Observando os efeitos de um nacionalismo exagerado e sua ligação direta com as expressões de efeito da Europa no pós-guerra, a saber, “nacionalização” e “planejamento central”, Röpke também destacou que apesar do sucesso alemão em conduzir sua política de “austeridade”, 1/3 do mundo ainda se encontrava sob o controle desse tipo de inclinação, o que fortalecia sua crença de que apesar das experiências bem sucedidas no mundo ocidental, nenhum dos frutos oriundos da defesa do livre-mercado estavam plenamente garantidos[4].

Além disso, nas Universidades e em outros “âmbitos chave” das sociedades ocidentais (seja no governo, ou na sociedade civil), a mentalidade centralizadora resistia – menos evidente em seu caráter socialista, mas seguramente em sua acepção estatizante.

A partir desse ponto, Röpke passa a descrever um elemento chave de suas ideias: a conquista das liberdades individuais, e a sua manutenção ao longo do tempo, depende de um trabalho contínuo de disputas. Isso porque as reformas que a Alemanha conduziu no período foram muito arduamente implementadas, dia após dia, na medida em que problemas novos e antigos eram trazidos à tona para serem rapidamente resolvidos.

Talvez o maior percalço para o tipo de ação política levada a efeito, segundo Röpke, tenha sido advogar a defesa dos mercados em problemas cuja origem era típica e residualmente originada de abordagens coletivistas – como a defesa do controle de alugueis pelo governo, subsídios para agricultura, etc. –, sobretudo quando por meio dos processos democráticos regulares a opinião pública se dividia facilmente sob o fogo cruzado entre tal defesa (dos mercados) e a demagogia política habitual, incapaz de perceber as consequências de seus atos no longo prazo.

Quanto a esse último caso descrito por Röpke, não é difícil trazê-lo à tona para compará-lo a situações análogas no cotidiano do brasileiro. Não apenas pela vocação que a América Latina, em geral, possui para eleger pautas de natureza estanque no debate público, como pela casta política que sequer tem consciência da real natureza dos problemas que se propõe, de forma atabalhoada, a resolver. A sociedade livre que Röpke defendia é, por ora, uma meta turva, para o nosso país míope.

Na segunda parte dessa série, abordarei pontos em que algumas das conclusões de Röpke se aproximam das de Hayek, ao fundamentar sua ideia de “economia humana”.

*Arthur Dalmarco, Advogado tributarista. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), possui publicações na área de Direito Internacional, Direito Internacional Tributário e de Investimentos Estrangeiros em Portfólio.



[1] RÖPKE, Wilhelm. A Humane Economy – The Social Framework of the Free Market. Chicago: Henry Regnery Company, 1960.

[2] Idem, p. 21.

[3] RÖPKE, Wilhelm. Ist Die Deutsche Wirtschaftspolitik richtig?. Stuttgart: 1950.

[4] Idem 1, p. 29.

 

Faça uma doação para o Instituto Liberal. Realize um PIX com o valor que desejar. Você poderá copiar a chave PIX ou escanear o QR Code abaixo:

Copie a chave PIX do IL:

28.014.876/0001-06

Escaneie o QR Code abaixo:

Instituto Liberal

Instituto Liberal

O Instituto Liberal é uma instituição sem fins lucrativos voltada para a pesquisa, produção e divulgação de idéias, teorias e conceitos que revelam as vantagens de uma sociedade organizada com base em uma ordem liberal.

Pular para o conteúdo