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Portaria 307 e as cotas em Rivera

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*Fabrício Sanfelice

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Sempre que vejo uma decisão do Governo no que diz respeito a impostos, cotas de importação e exportação, regulamentações, etc; fico pensando se, em algum momento, os nossos governantes pensaram em seus cidadãos como consumidores. No dia de ontem foi publicada a efêmera portaria nº 307, que diminui a cota de compras em cidades fronteiriças de 300 dólares, para apenas 150. Diante disso me lembro do texto de Frederic Bastiat, Os dois machados, em que é redigido em forma de uma carta de um carpinteiro para um ministro francês. A carta fala sobre uma decisão do governo francês de impedir a importação de tecidos da Bélgica, a fim de favorecer e proteger o comércio e os lucros locais. O carpinteiro explica que, se o tecido belga era de melhor qualidade e mais barato que o francês, todos os cidadãos franceses prefeririam esse tecido, pois poderiam comprá-lo e ainda sobraria dinheiro para alocar em outras necessidades, diminuindo assim a sua necessidade de trabalhar mais para ter a mesma demanda suprida. Logo após, o carpinteiro explica que o seu trabalho de nada difere de uma fábrica de tecidos e que, por esse motivo, o seu labor necessita da mesma proteção. Desse modo, pede ao ministro que proíba a importação e a venda de machados afiados, pois com eles o seu trabalho é executado com maior eficiência e menos esforço, o que diminui o preço pago pela mão de obra e, diante disso, ele reflete:

Onde tínhamos de dar cem machadadas, daremos trezentas.  O que fazemos em uma hora, levaremos três.  Que poderoso estímulo para o trabalho!  Aprendizes, artífices e mestres, não seremos mais em número suficiente.  Seremos procurados e, por conseguinte, bem pagos.  Quem quiser usufruir de um telhado terá de se submeter às nossas exigências, do mesmo modo que quem quer ter um tecido é obrigado a se submeter às vossas.

Talvez alguns não tenham entendido o porquê dessa introdução, mas o motivo é simples: os lojistas gaúchos comemoram a decisão. Mas e os consumidores? Nem um pouco. Os lojistas são os tecelões, felizes com a dificuldade de ingresso de mercadorias estrangeiras no seu ambiente de vendas, felizes de não precisarem mais diminuir a sua margem de lucro e nem aumentar a qualidade dos produtos oferecidos para competir com os produtos de fora, pois agora eles têm a seu favor o Estado protegendo o seu negócio. O carpinteiro é o consumidor local, que agora se vê obrigado a comprar um produto mais caro e de menor qualidade, tendo que trabalhar mais para usufruir o mesmo que antes lhes era oferecido com melhor benefício.

O fato de, ao exemplo de Santa Maria, a cidade de Rivera, no Uruguai, ter se tornado um dos principais destinos no final de semana dos gaúchos é que o nosso país é incompetente em oferecer produtos de boa qualidade a preços acessíveis. Os motivos são vários, mas principalmente os impostos e a dificuldade de competição em um ambiente nada estimulante ao empreendedorismo. Somos todos consumidores e o instinto básico que rege as nossas decisões é poupança e qualidade, ou seja, custo e benefício. Se analisarmos o fato de que é mais vantajoso para uma pessoa se deslocar cerca de 250 quilômetros para comprar um ar-condicionado ou um telefone celular do que o adquirir na comodidade do seu lar pela internet ou uma loja local, fica muito clara a ineficácia do nosso comércio em conseguir oferecer um produto que consiga agradar os seus clientes.

A decisão não contribuiu em nada para os consumidores. Teremos cada vez mais um empresariado preguiçoso em oferecer qualidade e bom preço, visto que estão muito bem protegidos pelo aparato estatal tendo um forte concorrente vetado. O reflexo disso poderá ser sentido pelo bolso dos consumidores claramente. Se antes os lojistas tiveram que diminuir o preço dos seus produtos para poder competir com os trazidos da fronteira, agora tal medida já não se faz mais necessária.  A análise é simples: se há na sua cidade há apenas a empresa X vendendo o produto A, ela colocará nele o preço que julgar coerente para satisfazer a sua necessidade de venda. Entretanto, se se passa alguns meses e outras 9 empresas começam a vender o produto A, a empresa X terá que oferecer algum diferencial para continuar vendendo a mesma quantia do produto A que vendia antes. Ela faz isso através da diminuição do preço ou através do oferecimento de meios facilitadores para a compra. Tanto as facilidades quanto a diminuição do preço são diferenciais, e tais diferenciais só existiram devido ao risco que a empresa X passou a ter por haver mais concorrentes no mercado oferecendo o mesmo produto. Cada empresa que queira vender o produto A, precisará fazer melhor que as suas nove outras concorrentes, é assim que funciona o mercado, isso é a alma do capitalismo. Porém, se de outro lado o governo intervém e coloca barreiras para que as outras empresas mantenham-se em operação o que acontecerá será o inverso. Haverá uma redução da concorrência e consequente aumento de preço. Toda concorrência é benéfica, estimula o desenvolvimento do empresariado e impacta diretamente no consumidor, quanto maior a concorrência, menor tende a ser o preço pago por qualquer produto ou serviço.

Outro fato interessante de ser analisado é o quanto os nossos legisladores são incompetentes em suas decisões e em estabelecimento de padrões. A cota de 300 dólares foi estabelecida em 2006, de forma fixa, não sendo nunca vinculada a nenhuma taxa ou variação econômica, sendo apenas ditada por alguma mente iluminada sentada em uma cadeira e com uma caneta na mão. Considerando o tempo decorrido desde a primeira portaria e uma inflação anual superior a 5% houve um perda de poder de compra real próximo de 47%, segundo o IGP-M, os mesmos 300 dólares de oito anos atrás, hoje valem menos de US$200 e, com a supressão da cota, esse poder de compra decai mais ainda, se tornando quase insignificante o referido valor. Se fossemos considerar a inflação, ao invés da cota diminuir, ela deveria ser de quase 450 dólares, apenas para superar a defasagem causada pela inflação.

Talvez os motivos de o Governo tomar tal decisão nas sejam de muito difícil compreensão: com uma previsão de crescimento da economia inferior a 2,5%, o crescimento do PIB de apenas 0,97% e uma inflação anual beirando os 6,5%, é de se esperar que medidas desesperadas sejam tomadas.

*Conselheiro Executivo Nacional da Rede Estudantes Pela Liberdade

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Um comentário em “Portaria 307 e as cotas em Rivera

  • Avatar
    28/07/2014 em 1:40 pm
    Permalink

    O certo seria argumentar sobre o imposto de importação de mercadorias que torna os produtos de Rivera mais baratos. Anualmente, na véspera de Natal, vou a Rivera comprar vinhos, cujos preços são sempre a metade do mesmo produto nas prateleiras brasileiras. O mesmo vale para alguns eletroeletrônicos e outros itens. Ora, se não existe o imposto de importação e estes produtos caíssem pela metade, o governo se beneficiaria ainda mais, pois a venda dentro do Brasil produziria outros impostos e impulsionaria o comércio e, indiretamente, toda a comunidade local. Um cálculo econômico preciso poderia provar que uma mudança fiscal resultaria em benefícios ao consumidor e até mesmo ao governo.

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