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Um Estado-Babá, sem valores e meio doidão

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Um recente projeto de lei, patrocinado pelo Partido Conservador do Reino Unido junto ao Parlamento Britânico, tem como objetivo buscar a proibição da venda de cigarros. O texto tem como base uma idade mínima de 18 anos para a compra dos produtos, e com esse piso subindo ano a ano, até se chegar a um momento em que a proibição ocorrerá para britânicos de todas as idades.

Algumas questões chamam atenção nessa pesquisa, de maneira bastante irônica, para não dizer contraditória, pois ocorre no mesmo país que: (i) em 2018, legalizou o uso medicinal da maconha, na prática, facultando legalmente o consumo da substância para todos, desde que se consiga uma receita médica; (ii) sua capital, Londres, planeja liberar o consumo irrestrito de anfetaminas ainda neste ano; e (iii) todas essas ações ocorreram e ocorrem sob governo conservador, no poder desde 2010.

Norberto Bobbio, quando escreveu sobre as distinções entre o pensamento político da Direita e da Esquerda, buscou definir a Direita Política como o grupo, ainda que heterogêneo, que tende a valorizar a liberdade individual e a propriedade privada, frequentemente se opondo a intervenções do governo que possam limitar esses princípios. Evidentemente que um projeto como é o caso da proibição definitiva do consumo de cigarros de tabaco é uma intolerável restrição à liberdade individual do cidadão britânico, e essa ação de “Estado-Babá” está muito mais afeito à esquerda política paternalista e controladora do que a uma direita que se supõe valorizar a autonomia do indivíduo.

O fenômeno conhecido como “Estado-Babá” levanta sérias preocupações éticas e econômicas relacionadas às intervenções governamentais, em questões de liberdades individuais e de distorções de mercado.

Do ponto de vista ético, é intolerável a irrazoável restrição dos direitos e da autonomia dos indivíduos para tomar decisões pessoais. Em nome de um suposto bem-estar público, o Estado muitas vezes exerce um controle excessivo sobre as escolhas individuais, como o consumo de certos produtos, estilo de vida e até mesmo a liberdade de expressão, em uma tentativa de legislação de moralidade imposta a toda à sociedade por um grupo de seres humanos notoriamente imorais: os políticos.

No aspecto econômico, o proibicionismo do Estado-babá gera gravíssimas distorções. A proibição legal do consumo de cigarros de tabaco cria um mercado negro no setor que opera à margem das regulamentações governamentais, gerando perda de receita fiscal que poderia ser usada para financiar serviços públicos essenciais, como educação, saúde, segurança e infraestrutura, além de aumentar a criminalidade e a insegurança, uma vez que redes criminosas passam a operar o setor e a gerar receita para outras atividades criminosas, em especial o tráfico de armas e a lavagem de dinheiro, resultando em custos adicionais para o sistema de Justiça Criminal e prejuízo à confiança de investidores e consumidores, impactando negativamente todo o clima de negócios numa determinada localidade. Isso sem contar a inevitável queda da qualidade dos produtos consumidos, dada a falta de parâmetros e fiscalizações das autoridades, e o aumento da exploração de mão-de-obra pela indústria ilegal junto à população mais carente e necessitada de empregos.

Por isso que proibições ao consumo, para além da odiosa restrição à liberdade individual, deve estar muito bem fundamentada não só numa ética pública e laica, mas também em estudos sólidos que comprovem o prejuízo individual e social no consumo e no mercado de determinado produto ou serviço. Aqui se nota a ironia de que, ao mesmo tempo em que os governos passam a impor um estilo de vida específico à toda a população com essa onda de proibicionismo, buscam liberar o consumo de substâncias comprovadamente prejudiciais à sociedade, como é o caso de entorpecentes com alto grau de adicção.

Adicção vem do termo latino “addictus“, que significava “escravo por dívidas”. Drogas psicotrópicas geram escravidão ao seu consumo, e não liberdade, de acordo com a própria etimologia da palavra. É exatamente o alto grau de deterioração mental e escravidão do consumidor à droga psicotrópica que pode, em algum nível, justificar todo o prejuízo que o proibicionismo gera, tanto do ponto de vista moral quanto econômico, aos indivíduos e à sociedade, e esse proibicionismo deve ser implementado somente em última instância. O pesado “trade-off” entre proibir e suportar o consumo social precisa fazer sentido, e somente nos casos das drogas psicotrópicas com alto grau de adicção e prejuízos mentais é que esse trade-off fecha a conta.

Estamos, enquanto sociedade ocidental, trocando a proibição de uma substância que não gera efeitos psicotrópicos relevantes, como o cigarro de tabaco, pela legalização de substâncias de alto grau de adicção e deterioração mental, tendo como base nada além de pressão política por partidos de esquerda que veem no consumo de psicotrópicos um meio de desestabilização da ordem pública, o que é uma agenda positiva para esse movimento, e com a permissividade dos partidos de direita que perderam seus rumos e propósitos, sempre às custas de prejuízos à liberdade individual dos cidadãos, às finanças públicas e à paz social.

Melhor eu tomar uma dose para relaxar, enquanto não me proíbem a cachacinha.

*Artigo publicado originalmente na Revista Oeste.

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Bernardo Santoro

Bernardo Santoro

Mestre em Teoria e Filosofia do Direito (UERJ), Mestrando em Economia (Universidad Francisco Marroquín) e Pós-Graduado em Economia (UERJ). Professor de Economia Política das Faculdades de Direito da UERJ e da UFRJ. Advogado e Diretor-Executivo do Instituto Liberal.

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