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As crônicas de Carlos Lacerda sobre a Assembleia Constituinte de 1946

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Recentemente o embaixador Paulo Roberto de Almeida compilou em um livro as crônicas do gigante Roberto Campos sobre a Constituição de 1988. Sendo um grande sucesso no meio liberal, Roberto Campos naquele seu livro mais uma vez saía como profeta por notar os péssimos rumos que a Constituição mal executada faria ao país.

Mal sabem as pessoas que, na Constituição democrática anterior, a de 1946, Carlos Lacerda também faria crônicas sobre a Assembleia Constituinte. Diferente de Roberto Campos, que realizou crônicas como membro da Constituinte, Lacerda na época era apenas um colunista do jornal Correio da Manhã. Segundo o mesmo, o objetivo de suas crônicas era fazer uma narrativa ao estilo da crônica de Eça de Queiroz, O Conde de Abranhos, um romance póstumo sobre um personagem político fictício que narrava todos os defeitos políticos, sem distinção de partidos, alas ou quaisquer que fossem os seus movimentos.

As colunas de Lacerda tinham lado, porém nem por isso eram “chapas brancas”; embora mostrasse a sua imensa afeição com a UDN e seus aliados, não media palavras para criticar membros do partido que efetuassem condutas que Lacerda considerava incompatíveis com a UDN, como o adesismo ao governo Dutra que tomou conta da legenda, quando o então presidente notou que os então aliados de sua campanha o estavam abandonando em torno do ex-ditador Getúlio Vargas para retornar o poder.

Lacerda, por muito tempo, focou os comentários em como a Assembleia era, em geral, habitada por colaboradores do Estado Novo e seus asseclas, chamados na época de Queremistas, em referência ao movimento de 1945 organizado por aqueles que desejavam a permanência de Getúlio Vargas no poder. Lacerda, ainda no espírito do escritor português, recheia as crônicas com apelidos para os desafetos, como “metralhadora giratória”. Alguns dos mais notáveis são: Palhaço Queremista, direcionado ao então deputado Barreto Pinto; Curuquerê, nome do inseto que gera a praga do algodão, para o deputado Hugo Borghi, que gastava seu tempo na Constituinte falando das plantações de algodão de São Paulo; e Rebeco Vargas, para Getúlio, inspirado em uma ópera da época chamada Rebeca, sobre um rapaz que, viúvo de sua amada Rebeca, casou-se com outra esposa, que vivia um inferno em sua vida pela governanta do viúvo sempre comparar a moça com a falecida Rebeca (Lacerda traça o paralelo entre a ópera e a relação de Dutra com Getúlio).

Lacerda, à época, ainda não era o célebre tribuno da dita direita nacional, porém já era de traços claramente anticomunistas, mesmo que ainda ficasse pairando entre uma centro-direita liberal americana e uma centro-esquerda democrática britânica. Porém, ainda assim, Lacerda foi contra a cassação do partido comunista, sob o argumento de que, se colocasse os comunistas na ilegalidade, seria ainda mais difícil de combatê-los, pois estaríamos discutindo derrotar um inimigo invisível que atuava no escuro, tal qual aconteceu com a penetração de diversos comunistas no PTB, posteriormente.

Lacerda ainda tece imensos elogios ao líder da UDN e vice-presidente da Constituinte, Otávio Mangabeira, político baiano que passou o período quase todo da Era Vargas exilado no exterior e perseguido pelo governo, que mapeava os passos de Mangabeira e chegava a pressionar firmas estrangeiras a não o empregarem no exterior, mostrando a postura coerente do líder Mangabeira de se postar contra as tentativas queremistas de, pasmem, colocar a Constituinte de 1937 como a oficial para a democracia então nascente no país.

Lacerda critica ainda que o anteprojeto foi discutido por semanas a portas fechadas, sem apreciação pública, e menciona o projeto de salva de palmas para as forças armadas pela deposição de Vargas na presença do mesmo, na única vez em que Vargas compareceu ao congresso durante seu mandato de senador, pois a salva o desmoralizou a ponto de sequer ter desejo de aparecer novamente no plenário.

Lacerda, infelizmente por força do trabalho, deixou de acompanhar os debates finais da Constituinte, visto que foi convocado a ser repórter de uma assembleia entre nações a ser efetuada em Paris no mesmo ano, porém não deixou de relatar que, após a presença de Getúlio durante a Constituinte, passou a ser alvo de atentados por capangas, por suas críticas “queirozianas”.

* Artigo publicado originalmente na página Liberalismo Brazuca no Facebook.

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