Cauê Bocchi*

Diz o PT que o escândalo da Petrobras evidencia o seu próprio mérito em investigar e punir. Nunca antes na história desse país se investigou com o rigor implacável do Partido dos Trabalhadores. O fato de mais esse escândalo ter sido deflagrado pela revista Veja é um mero detalhe, aquele do tipo maldoso que atrai a nossa elite burguesa e coxinha. O mesmo vale para o Mensalão, cuja consequência fez cair por alguns meses nossos heróis revolucionários Dirceu e Genoíno.

A situação, na verdade, é preocupante. E não, caro reacionário fascista, a preocupação não tem nada a ver com os escândalos em si. O problema é que com todo esse poder investigativo formidável do PT, existe o sério risco de os escândalos acabarem e todos acharem que voltou a reinar a corrupção e a impunidade anteriores aos nossos atuais anos vermelhos dourados. Aliás, falando do passado, que não se diga que nos anos anteriores havia menos corrupção do que hoje: o fato de terem surgido menos escândalos é prova incontestável de que havia mais escândalos, e todos sabemos que essa ladainha constitucional de que todo mundo é inocente até que se prove o contrário é coisa de gente da direita.

Talvez seja até o caso de o PT estimular o surgimento de ainda mais esquemas de corrupção, pelo bem do Brasil. Claro que isso tudo seria um dever revolucionário a serviço da causa bolivariana, e não faltariam voluntários dispostos a realizá-lo. Assim se garantiria, quem sabe, um grande escândalo por semana, e teríamos a certeza de que nunca antes na história desse país se agiu com tanta seriedade no combate à corrupção. Desse modo, quem sabe também, ficaria tudo tão óbvio e escancarado que a Veja acabaria por perder sua relevância, e finalmente os órgãos de imprensa começariam a entender que não há nada melhor do que apoiar o governo. Felizmente aproximamo-nos a passos largos desse objetivo.

Por falar em imprensa, não há dúvida de que todo cidadão de bem deveria contar os dias para que o seu conteúdo seja sancionado pelo governo. Note-se, por exemplo, o caso da indicação do novo Ministro da Fazenda. O tal do Levy parece ser bom, e isso é a própria oposição quem diz. Mesmo assim, a imprensa acusa o PT de ser incoerente e uma porção de outros absurdos. Incoerente, na verdade, é a própria imprensa, que pressupõe a coerência em quem acusa ser incoerente. Isso tudo, no fim, só serve para deixar claro que nenhuma imprensa sem a supervisão do Estado pode produzir coisa boa. Apenas instituições com honestidade jornalística comparável a uma Carta Capital, ou grandes intelectuais de bom coração como o estimado Sakamoto são capazes de subentender e explicar a continua e ininterrupta marcha bolivariana já há doze anos trilhada pelo PT, mesmo quando parece ao cidadão comum que o PT só está agindo por mera conveniência política.  Censura, se alguém pensou nisso, é só quando a esquerda não pode exercer o seu livre direito constitucional de quebrar tudo, que fique claro.

Para finalizar essa questão sobre a imprensa, veja o absurdo dessa cobertura sobre a PLN 36, também chamada pelos fascistas de “fraude fiscal”. Parece que a imprensa se recusa a entender que o desconto das desonerações tributárias e gastos com o PAC devem ser deduzidos da meta de superávit primário porque o mundo está em crise, e o crescimento do PIB foi menor do que o esperado. O fato de o Brasil ter crescido menos do que todos os seus vizinhos latinos que não abraçaram o projeto bolivariano ou de não ter havido nenhuma crise econômica mundial nova entre o final de 2013 e o ano de 2014 que pudesse alterar as previsões de crescimento são apenas lembretes maldosos, que em nada contribuem para o debate construtivo em prol de um país melhor. Graças a Marx que a PLN 36 passou, e não tardará a chegar o dia em que a imprensa dos cães raivosos conhecerá a antirrábica petista, possivelmente sob a forma de uma lei bem bonita que fale um pouco de tudo para que ninguém possa falar mais nada.

Os mais de 50 milhões de coxinhas desse Brasil esquecem que tiramos milhões de pessoas da pobreza e que os colocamos na classe média. O fato de isso ter ocorrido com um acréscimo de renda mensal equivalente a uma coxinha per capita só impressiona os coxinhas que não sabem o privilégio que é poder comer uma coxinha a mais no mês. Se o PT não deixa as pessoas enriquecerem muito é porque o PT é o partido dos pobres, e governa em favor dos injustiçados. Veja o caso dos palestinos e israelenses, por exemplo: nossa presidenta apoiou os palestinos porque eles são pobres, enquanto os judeus são ricos. O fato de organizações palestinas cortarem a cabeça alheia a torto e a direito é um detalhe menor.

Dizem que o PT é o partido da contradição: a corrupção evidente é prova da guerra à corrupção; a indicação de um Ministro da Fazenda discípulo de Armínio Fraga é prova da execração petista a Armínio Fraga na época da campanha eleitoral; a mudança da lei orçamentária no meio do jogo demonstra o mais profundo respeito à lei, e não deve ser nenhum óbice ao crescimento econômico que por algum motivo não quis vir em 2014. Talvez tudo isso pareça um pouco contraditório para a mente menos treinada. É verdade também que talvez ninguém consiga explicar muito bem essas aparentes contradições, porque as palavras falham quando o projeto de transformações social é complexo e grandioso. A verdade é que tudo o que o PT diz é verdade. Quando mente, mente em nome da verdade. O PT, verdade seja dita, escreve certo por linhas tortas. Anime-se, caro leitor: o ano de 2015 se aproxima, mas é 1984 que vem a toda velocidade.

*Advogado