Destruição criativa: a força por trás do progresso
Quando li o badalado livro de Daron Acemoglu e James Robinson, Por Que as Nações Fracassam, talvez por viver no Brasil, achei extremamente pertinente a análise sobre o papel das instituições, que criam incentivos para a prosperidade ou para a pobreza das nações. No livro seguinte dos autores, The Narrow Corridor (ainda sem tradução), gostei muito da análise sobre o delicado equilíbrio entre o Estado e a sociedade para o alcance – difícil – da liberdade.
Porém, lendo recentes e frequentes artigos de Acemoglu, confesso que, além de decepção, fiquei com aguda curiosidade para saber o porquê da “guinada” do economista.
Acemoglu, reiteradamente, tem deixado claro seu temor com relação aos riscos associados às novas tecnologias, à tecnologia da informação, em especial a inteligência artificial, e a possibilidade de que os algoritmos possam avançar sobre o poder humano, prejudicando ao invés de encaminhar ao progresso da sociedade. Objetivamente, ele não está só nesta avaliação.
Acemoglu e outros citam a tecnologia nuclear, por exemplo, que possibilitou a criação de bombas com potencial destruidor, apesar de suas aplicações benéficas para a sociedade. Vem-me à mente o singelo exemplo do veículo, uma solução de mobilidade, mas que, se utilizada de forma inadequada, pode matar. Aqui, parece-me lógico e sensato que exista o estabelecimento de critérios e de regramentos que exigem a participação e a definição estatal.
Outra preocupação dele, refere-se à questão do aumento da capacidade de manipulação possibilitada pelas novas tecnologias e o acesso ao poder de líderes autoritários e demagógicos, no que concordo com ele. Como afirma Moisés Naím, em O Fim Do Poder, as novas tecnologias e outras forças trouxeram grandes transformações institucionais, tornando o poder mais frágil e transitório.
Contudo, Acemoglu não vê o progresso dessas tecnologias, per si, como algo positivo. Em vários artigos, ele enfatiza que as tecnologias trazem no seu bojo o potencial de desemprego, visto que elas substituem processos, atividades e tarefas realizadas “manualmente” por trabalhadores.
Para ele, algumas tecnologias acentuam as desigualdades sociais enquanto aumentam o poder e a riqueza de poucas empresas e de grandes grupos empresariais. Nesse sentido, o economista propõe que nem todas as ciências e tecnologias poderiam ser classificadas como “positivas” para o desenvolvimento social, e sendo assim, deveria existir uma espécie de mediação entre as empresas desenvolvedoras e o Estado, de modo a definir quais tecnologias deveriam ser desenvolvidas adequadamente.
Em primeiro lugar, não creio que o Estado tenha papel relevante na fixação de tais escolhas. O desenvolvimento tecnológico faz parte do processo central de criação de riqueza e de inovações, o conhecido processo de destruição criativa shumpeteriano, em que nascem novas indústrias que suplantam setores obsoletos. A criação e a destruição são gêmeas siamesas.
Parece-me que os verdadeiros juízes com relação às tecnologias e às inovações úteis são os consumidores, que justamente escolhem empresas, produtos, serviços e experiências que melhor resolvem as suas necessidades funcionais, emocionais e sociais. Se determinada tecnologia não agrega factualmente valor para os consumidores, seguramente ela não terá vida longa.
Portanto, discordo de Acemoglu, pois me parece que o problema não reside nas tecnologias, que são fundamentais para o aumento de produtividade e o desenvolvimento, mas de fato encontra-se na falta de qualificação e de treinamento dos indivíduos para o uso e operação de tais inovações.
No Brasil, por exemplo, é preciso transformar a educação, exatamente para readequá-la às necessidades reais do mercado de trabalho, conjuntamente com um plano envolvendo os meios público e privado – que de alguma forma já o faz – para “retreinar” trabalhadores para as novas funções e exigências requeridas.
Da mesma forma, enquanto se barra o desenvolvimento tecnológico – a pretexto de “desigualdades sociais” -, interrompe-se o vital fluxo competitivo, e, em não havendo competição, perpetuam-se as poucas empresas líderes nos mercados e segmentos, que controlam os negócios e concentram ainda mais poder. Cabe destacar que assim são prejudicados os consumidores, os empregados – redução de oportunidades de trabalho – e toda a sociedade.
Honestamente, a posição de Acemoglu me surpreende, enquanto se alinha ao “capitalismo das partes interessadas”, que, segundo minha leitura, é exatamente o que se aprofunda com suas recomendações, ou seja, o engajamento entre autoridades estatais e as grandes – e cada vez maiores – corporações.
Assombra-me mais ainda sua visão nitidamente coletivista, propondo mais intervenção estatal, quando, na verdade, foi a intensa ação governamental nos mercados uma das causadoras das aludidas desigualdades. Penso que precisamos de menos Estado, um Estado atuando eficientemente nas suas funções precípuas, de responsabilidade com educação, saúde e segurança – não necessariamente operando -, menos intervencionista, gerando incentivos para que os mercados operem livres, com competição e eficiência. Os indivíduos-consumidores sabem o que fazem!