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SUS reprovado: a diferença entre as boas intenções e a prática

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SUS

Certa vez minha ex-empregada passou muito mal no meio da madrugada, e a levei até um hospital público próximo de casa. Eram duas ou três da madrugada, e obviamente estava deserto o hospital. Ainda assim, ela teve de esperar uma hora para ser atendida, sendo que o atendimento foi extremamente superficial.

Ela saiu de lá apenas com um remédio básico, tipo uma aspirina da vida, e nada mais. Só que sua doença era grave, ela tinha um mioma uterino que precisou ser operado meses depois. A espera teria sido ainda maior se minha mulher não tivesse pressionado o hospital e, pela primeira vez na vida, dado “carteirada”, alegando que o marido escrevia na grande imprensa e tornaria o caso público. Se houvesse menos intervenção estatal no setor, menos impostos, eu certamente poderia ter pago por um plano privado para ela…

Conto isso para relatar mais uma entre milhares de histórias que cada um conhece quando se trata de nosso sistema público de saúde. É até impressionante como os mais pobres não se revoltam com mais frequência, submetidos a esse calvário absurdo. Pesquisa recente comprova o que todos já sabem: a população rejeita em larga escala o atendimento do SUS:

Uma pesquisa do Datafolha mostra que 93% dos entrevistados estão insatisfeitos com a saúde no Brasil. E que 54% classificam como péssimo ou ruim o serviço prestado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Para 18%, o SUS merece nota zero. Encomendado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), o levantamento indica que a Saúde deve ser a prioridade número 1 do governo, segundo 43% das pessoas ouvidas. Em segundo lugar aparece a Educação, apontada por 27% dos entrevistados, seguida do combate à corrupção, na opinião de 10% dos participantes.

[…]

Entre os usuários do SUS, 54% deram nota de 0 a 6 e 46%, de 7 a 10. No primeiro grupo, 36% apontaram o tempo de espera como o maior problema, seguido da pouca quantidade de médicos disponíveis (19%) e da falta de estrutura dos locais de atendimento (15%).

Não adianta falar em jogar ainda mais recursos públicos no sistema, pois não é disso que se trata. O descaso é total, a corrupção campeia, não há accountability, e jogar toda a culpa nos médicos é apenas buscar um bode expiatório fácil, como vem fazendo o governo petista, para justificar um esquema nefasto de importação de escravos cubanos e exportação de bilhões para a ditadura camarada.

O problema principal do SUS é, portanto, de gestão, não de verba. Já resenhei no blog antigo o livro do médico carioca Marcio Maranhão, Sob pressão, que relata sua experiência traumática dentro do sistema. Abaixo, um trecho da minha resenha:

Marcio descreve a verdadeira tragédia que o país vive na área de Saúde. “O Brasil faz política na saúde em oposição à política de saúde. Faz-se política de governo em vez de uma política de Estado”, diz. Sua experiência atesta o completo descaso do estado, das diferentes esferas de governo. Falta uma política integrada, planejamento, cobrança, responsabilidade, falta tudo!

Os médicos, em meio a esse caos, ficam enxugando gelo, correndo entre os corredores fétidos, lotados, tendo que improvisar o tempo todo, apelar às gambiarras, ao jeitinho, correr riscos de imprudência para tentar salvar a vida daquelas pessoas desesperadas, entre a vida e a morte. Tudo, absolutamente tudo na saúde pública era repulsivo para o jovem cirurgião.

O livro conta casos pitorescos, que seriam até engraçados com o devido afastamento, visto como em um filme de comédia pastelão. Mas estamos falando da vida dos brasileiros, morrendo por falta de atendimento, por falta do básico, de um dreno, de um fio para sutura, de sangue para transfusão. É muito sofrimento causado pela negligência estatal.

E como esses bravos médicos são recompensados por seu esforço homérico para tentar mitigar o caos do sistema? Em um dos hospitais públicos em que Marcio trabalhou por oito anos, realizando complexas cirurgias, seu salário líquido era de apenas R$ 1.372,67. No período todo, teve aumento de menos de R$ 100. Como cobrar desses médicos comprometimento e determinação?

Sim, os médicos ganham mal, mas novamente não é por falta de verba, e sim por sua má alocação, pelos desvios, pelas prioridades equivocadas. E claro, o socialismo no setor de saúde em nada ajuda. Em vez de cuidar do básico, o estado resolveu fazer tudo para todos, e isso simplesmente não funciona.

O exemplo trágico do SUS deveria servir de lição para os românticos que sempre ficam na primeira parte do raciocínio, a parte mais emotiva. Repletos de boas intenções, eles delegam ao estado o dever de cuidar de tudo e todos, do berço ao túmulo, ignorando as complexidades práticas dessa incrível demanda. O resultado nunca satisfaz, mas isso não importa para quem quer apenas dormir em paz com sua consciência de que desejou o melhor para o próximo.

Como disse Roberto Campos, o mundo não será salvo pelos caridosos, mas pelos eficientes. Não é à toa que o ditado popular diz que as boas intenções pavimentam muitas vezes o caminho para o inferno. É hora de avaliar as alternativas reais, concretas, com base nos fatos, e não nas emoções. O SUS foi reprovado no teste da realidade. Os românticos querem dobrar a aposta ou finalmente aceitar uma rota alternativa?

Rodrigo Constantino

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Rodrigo Constantino

Rodrigo Constantino

Presidente do Conselho do Instituto Liberal e membro-fundador do Instituto Millenium (IMIL). Rodrigo Constantino atua no setor financeiro desde 1997. Formado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ), com MBA de Finanças pelo IBMEC. Constantino foi colunista da Veja e é colunista de importantes meios de comunicação brasileiros como os jornais “Valor Econômico” e “O Globo”. Conquistou o Prêmio Libertas no XXII Fórum da Liberdade, realizado em 2009. Tem vários livros publicados, entre eles: "Privatize Já!" e "Esquerda Caviar".

3 comentários em “SUS reprovado: a diferença entre as boas intenções e a prática

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    14/10/2015 em 5:21 pm
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    Prezados, gostaria de expor minha opinião sobre os dois casos, mesmo sabendo que ser profeta do passado é a mais fácil profissão…
    Não desmerecendo ou desvalorizando a doença ou condição de seus familiares, amigos e da empregada do Rodrigo C., Emergência, ou Pronto Socorro é um local destinado justamente para isso: emergências!
    Com isto quero dizer que os recursos escassos da saúde, empregados nesses locais, são destinados aos casos realmente graves, com risco iminente de morte ou sequelas. Uma vez excluídos os diagnósticos que podem levar a óbito ou agravos severos, o paciente não deve permanecer, mesmo! São exemplos os casos de traumas – acidentes, lesões vasculares, cardiológicas, neurológicas ou quaisquer outras que precisem de atenção imediata, incluindo o caso de alergia mencionado (que pode ser grave). Como parte da falta de gestão mencionada, um dos grandes problemas é o sobrecarregamento dos pronto-socorros com casos sem gravidade, que poderiam e deveriam ser acompanhados e investigados ambulatorialmente. Infelizmente, tanto a falta de gestão quanto a falta de informação por parte de toda a sociedade faz com que esperas de “1h”, como nos casos mencionados, pareçam absurdos, quando não. Vá procurar um pronto socorro nos EUA. Se não estiver crítico, seu tempo de espera também será longo…
    Quanto à saúde ser pública ou privada, exclusivamente, depende mais dos resultados e da boa administração: o país que mais gasta em saúde pública no mundo são justamente os EUA, através dos sistemas Medcare e Medicaid.
    Já trabalhei (e ainda o faço) em instituições de saúde dos mais diversos tipos, tanto como médico quanto como gestor (públicas, privadas, assistenciais ou administrativas). Por isso me sinto na prerrogativa de afirmar que não existem respostas fáceis, mas não ajuda nem um pouco o radicalismo e hipocrisia dos esquerdopatas de plantão…

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    13/10/2015 em 1:36 pm
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    Pois é, por isto sou favorável aos EUA. Não tem saúde pública, quem quiser que pague por um privado. SE não tiver como, o Estado auxilia em um plano.

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    13/10/2015 em 1:20 pm
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    Rodrigo, a palavra ‘gestão’ é indigesta para qualquer socialista-sindicalista servidor encarregado pela GESTÃO de bens públicos… imagine para o SUS!
    Há uns bons anos, ainda na época do FHC, levei um amigo que passava mal para um hospital público que era perto de sua casa – sabia que não se tratava de nada grave, pois era apenas uma reação alérgica! Lá chegando, fui abordado pelo maqueiro que exigia um agrado para poder coloca-lo na maca; depois de ter brigado (literalmente) com o sujeito, eu mesmo o coloquei na maca e o empurrei até o atendimento, e lá esperei por mais de uma hora (talvez até mais!). Então me comunicaram que não haviam médicos no local – engraçado, levaram uma hora e pouco para usar suas bocas! Foi uma enfermeira que entendia razoavelmente do assunto (alergias) que o medicou apropriadamente (ele parou de ficar vermelho!), e então o despachei na sua casa (ele na época estava namorando a futura esposa, então morava com os pais).
    Resumo da ópera: se em 1996 o cenário era caótico, hoje está 100 vezes pior.
    Se os hospitais particulares que atendem basicamente planos de saúde de cooperativas falidas já estão indo de mal a pior, imagine só a situação dos públicos….
    Tenho o exemplo (um tanto extremo) de minha mãe – ela cancelou o plano de saúde que tinha, pois gastava mais de R$ 800 por mês; agora ela economiza R$ 800,00 por mês ao invés de bancar uma cooperativa falida e corrupta, e depois de 05 anos (60 meses), ela já poupou quase R$ 50.000,00 para qualquer emergência que venha a acontecer… e se ela poupar mais 60 meses, terá R$ 100.000,00 para as despesas médicas.

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