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O Senado tem a obrigação moral de barrar Dino no STF

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Na semana passada, após uma resposta, ainda que tardia e modesta, do Senado aos excessos do STF, vimos o rebaixamento moral e institucional ao qual chegaram alguns membros daquela corte. Aqueles que se dizem defensores da democracia e que pensam, do alto de sua megalomania, que são seus salvadores “eternos”, simplesmente não aceitaram que o Senado, formado por quem de fato tem voto e dentro de sua legitimidade constitucional, “ousasse” questionar o STF, que dirá votar uma PEC, extremamente necessária, que limita as possibilidades de decisões monocráticas. Noticia-se que interlocutores da suprema corte fizeram chegar ao Planalto que queriam que Jaques Wagner, líder do governo no Senado, deixasse a liderança, uma vez que votou em favor da PEC. Se isso não é politicagem descarada, não sei o que é. Um dos indignados, Gilmar Mendes, chegou a ameaçar com uma eventual derrubada na PEC na corte.

Já nesta semana, assistimos ao presidente Lula indicar Flávio Dino para a vaga aberta por Rosa Weber no STF. A indicação, como há muito se noticia, é bem vista pelo STF, ao passo que politicamente é no mínimo controversa, haja vista a reportagem muito bem repercutida do Estadão que comprovou que, por duas vezes, a esposa de um líder do Comando Vermelho participou de reuniões no ministério comandado por Dino. Esperava-se que a polêmica em torno do caso demoveria Lula de seu intento de indicar Dino, ou que ao menos ele esperaria momento mais oportuno. O fato de que decidiu nomeá-lo agora, quando a poeira em torno disso segue alta e logo após o Senado aprovar a PEC, demonstra a) um movimento de sinalização e servilismo de Lula à suprema corte e b) que a opinião pública tem importância zero para o governo e que Lula não tem pudor em debochar do povo brasileiro.

Flávio Dino, como tenho feito questão de repetir neste espaço, em que pesem os argumentos daqueles que veem nele um perfil “moderado” ou “pragmático”, é hoje o membro mais truculento do governo Lula. Digo isso por razões múltiplas, dentre as quais citarei algumas.

Dino, cujo desempenho na segurança pública tem sido pífio, usou os atentados em escolas para proselitismo político e efetivamente fez politicagem em cima de cadáveres de crianças, chegando ao ponto de buscar uma associação “filosófica” lunática entre os perpetradores dos atentados e os vândalos do dia 8 de janeiro.

No governo, ele tem sido o principal porta-voz da “regulamentação” das redes sociais, nos moldes também defendidos e já praticados, ao arrepio da lei, pelo STF. Dino não só apoiou o PL da censura como, no alto do seu espírito “democrático”, disse em alto e bom som que, se o Congresso não aprovasse a geringonça, o governo faria (a censura) por conta própria.

A tentativa de intimidar e constranger o Congresso a aprovar o PL da censura não foi ocorrência única e sim parte de uma longa lista que atesta o desrespeito de Dino pelo Legislativo (novamente, aqui há uma concordância com o STF). Convocado a comparecer na Comissão de Segurança Pública da Câmara de Deputados, Dino faltou três vezes consecutivas. Vale lembrar que, diferente de quando os ministros são convidados, ele tinha a obrigação de ir, já que se tratava de uma convocação. A ausência, contudo, não chega a ser mais desrespeitosa que a justificativa. Dino argumentou que não se sentia “seguro” e que o ambiente era “perigoso”. Na segunda ausência, em ofício encaminhado ao presidente da Câmara (e não ao presidente da referida comissão), Arthur Lira, chegou a afirmar que “é verossímil pensar que eles andam armados”. Na terceira e mais recente ausência, Dino reforçou as justificativas anteriores e chegou a compilar declarações críticas a ele de membros da Comissão, bem como de seu presidente. Argumenta que se disponibilizou a ir em uma comissão geral, mas não à Comissão que o convocou. Ora, basicamente o ministro não quer o ônus da política enquanto faz política. Ir ao Congresso, quando convocado, e responder questionamentos dos parlamentares, em especial em uma Comissão voltada para uma área de responsabilidade do ministro é parte natural da função de um ministro de Estado. Ser criticado e mesmo xingado é parte do pacote. Temia sinceramente o ministro que algum dos membros da comissão quisesse imitar o pai do Collor e tentar matá-lo ali mesmo (episódio ocorrido no Senado, em 1963)? Duvido, trata-se de puro cinismo e acinte ao parlamento.

Outro episódio notável foi a insistente recusa de Dino em entregar à CPMI dos atos de 08 de janeiro imagens do circuito interno do Ministério da Justiça. Quando os vídeos finalmente chegaram à CPMI, descobriu-se que os vídeos haviam sido apagados. Dino argumentou que o armazenamento por parte da prestadora do serviço era somente de 15 dias, fato que seria desconhecido por ele até aquele momento.

O desrespeito com o Legislativo é muito próprio de quem transige com o ativismo judicial e tem ideias que incorporam isso. Dino pariu um conjunto de propostas legislativas apresentadas sob o nome de “Pacote da Democracia”. Uma das propostas permitiria que juízes bloqueassem contas e apreendessem bens de ofício (sem serem provocados) “quando houver indícios suficientes de autoria ou de financiamento de crimes contra o Estado Democrático de Direito”. Já temos visto os abusos cometidos sob argumento de proteger a democracia, então é fácil imaginar como o poder de bloquear e apreender bens poderia ser usado de forma abusiva e como a configuração do que seriam “indícios suficientes” seria deveras elástica. Assim como fez com o PL da Censura, Dino se une aos que não só aquiescem, mas tentam formalizar e “legalizar” o modus operandi abusivo do STF.

Seria compreensível presumir que apresento todos estes fatos para concluir dizendo que Dino não está à altura do STF, que não reúne as qualidades necessárias para integrar esta corte, mas minha conclusão é a oposta. Flávio Dino está totalmente à altura do STF atual, o que, claro, não é um elogio à sua pessoa, mas um demérito do Supremo. A corte — e as falas, posturas e “chiliques” de ministros na semana passada não me deixam mentir — foi aviltada por seus próprios membros. Trata-se hoje de uma casa política (fato confessado por seu próprio presidente), com um poder hipertrófico e autoconcedido, que faz toda sorte de interferência nos demais poderes, mas não aceita que o Legislativo vote alterações no Judiciário, que se converteu na inimiga número um da liberdade de expressão, que julga dezenas de centenas de dezenas de cidadãos sem individualizar suas condutas e que busca na dosimetria das penas, não a punição razoável, mas sim uma demonstração corporativista de força; que conduz inquéritos abertos de ofício e que nunca têm fim, promovendo abusos múltiplos, incluindo o banimento de contas em redes sociais, até mesmo de parlamentares, etc. Flávio Dino está à altura e em linha com tudo isso. Não por acaso sua indicação foi recebida com caloroso entusiasmo pela corte e apoiada abertamente por pelo menos alguns de seus membros.

Um dos apoiadores mais entusiastas da indicação de Dino tem sido, como não poderia deixar de ser, Alexandre de Moraes. O leitor deve lembrar quando, durante o início do julgamento dos réus do dia 08 de janeiro, Moraes simplesmente interrompeu o voto de André Mendonça no momento em que ele arguia que não conseguia entender como a invasão do Planalto foi possível. Para além da grosseria de interromper o voto de um colega, Moraes falou com sua habitual truculência e saiu em defesa de Dino, tomando as dores do ministro de Lula, como se estivesse a defender a sua própria mãe.

É nesse contexto que Lula indica Dino ao STF. Se ele está à altura de um STF aviltado, porque então digo que o Senado tem a obrigação moral de barrar sua indicação? Antes de tudo, combater o aviltamento do STF deve ser prioridade número um da Câmara Alta e a indicação de Dino vai na contramão disso; mas o motivo principal ainda não é esse. O Legislativo como um todo, mas principalmente o Senado, seguiu passivo diante dos achaques do STF e, pela primeira vez, graças a uma inflexão de Pacheco, estamos vendo algum tipo de resposta (ainda que modesta). A reação antirrepublicana de ministros a esse movimento legislativo, em tese, deveria recrudescer e reafirmar uma postura que, se não é combativa, é no mínimo uma manifestação de autonomia e legitimidade, afinal, gostem dos senadores ou não, eles têm o que os togados não têm nem poderiam ter (pois a toga não é compatível com política): voto. Aceitar a indicação de um personagem tão controverso, de um político (que, aliás, abandou a magistratura federal pela política) que não dá nenhum indicativo de que planeja deixar de sê-lo caso vista a toga novamente e que tem o respaldo da suprema corte, justamente por se alinhar com seus erros e abusos e ter todo o interesse em servir ao corporativismo que hoje ela personifica, seria como tentar invalidar essa reação. Claro que, se quisermos ser realistas, a possibilidade de negativa do Senado é baixa; lembremos também que Lula logrou transformar seu próprio advogado em ministro da corte, mas, por princípio, não posso deixar de registrar aqui este clamor. Se confirmada a indicação de Dino, o Senado voltará a se aviltar, justamente no momento em que deu um raro sopro de vitalidade.

Fontes:

https://www.estadao.com.br/politica/esposa-tio-patinhas-comando-vermelho-flavio-dino-ministro-justica-seguranca-publica-amazonas-governo-lula-luciane-barbosa-clemilson-santos-farias-nprp/#:~:text=A%20mulher%20%C3%A9%20Luciane%20Barbosa,Luciane%20com%20a%20organiza%C3%A7%C3%A3o%20criminosa.

https://www.cnnbrasil.com.br/politica/imagens-internas-do-ministerio-da-justica-de-8-de-janeiro-nao-existem-mais-concluem-investigadores/

https://www.poder360.com.br/congresso/dino-alega-ameacas-de-deputados-e-falta-a-2a-convocacao-na-camara/

https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/11/21/dino-cita-ambiente-perigoso-e-falta-pela-3-vez-em-comissao-na-camara.htm

https://www.bbc.com/portuguese/articles/cx018k98jdjo

https://canalcienciascriminais.com.br/ministros-batem-boca-em-julgamento/

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Gabriel Wilhelms

Gabriel Wilhelms

Graduado em Música e Economia, atua como articulista político nas horas vagas. Atuou como colunista do Jornal em Foco de 2017 a meados de 2019. Colunista do Instituto Liberal desde agosto de 2019.

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