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Não é tolerância, é respeito

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Primeiramente, peço que leiam a tirinha, que serve de pretexto para o assunto que pretendo discorrer nesse texto:

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Agora, uma retrospectiva teórica: quando o liberalismo começou a dar seus primeiros passos como filosofia, um dos aspectos mais fundamentais presentes na análise dos intelectuais que fazem parte dessa tradição, era a clara noção de que o indivíduo é especial e único. Com isso, o que se estava reconhecendo é que, independente da cultura, sociedade ou ordem econômica existente, nenhuma pessoa é igual à outra.

Todos os seres humanos são diferentes, seja fisicamente como psicologicamente. Temos vocações, inclinações e projetos de vida bastantes distintos um dos outros. Para que possamos conviver civilizadamente em comunidade se faz indispensável à existência de um sistema organizacional que abrace esse pluralismo, ou seja, que fomente a aceitação de diferentes valorações, gostos e preferências, sempre e quando não se prejudiquem direitos de terceiros. É justamente por isso que o respeito ao próximo, entendido como um ser dotado de características e valores diferentes dos demais, reconhecidamente é a “coluna vertebral” do liberalismo.

Nas palavras de Alberto Benegas Lynch:

Não se requer que compartilhemos nem mesmo que compreendemos os projetos de vida do próximo, necessitando, isso sim, que se os respeite. Não cabe aqui o uso da expressão “tolerância” dado que se trata de uma extrapolação ilegítima do campo da religião para o direito. Os direitos não se toleram, se respeitam. Recorrer à expressão “tolerância” implica em certo ar de arrogância e presunção de conhecimento. Transmite a ideia de que alguns possuem a certeza e a verdade absoluta e devem tolerar os “erros” dos outros.[1]

O que se pode denominar de espírito liberal é a adoção de uma “abertura mental”, que corresponde a uma constante critica a ideias sedimentadas, a um processo contínuo de reflexão e de profundos questionamentos. Isso não se confunde com um relativismo, onde não se acredita que nada seja absoluto, onde “bom” e “mau”, “verdade” e “mentira” sejam conceitos vazios de sentido objetivo.

O liberal simplesmente reconhece que, por mais que certas práticas possam ser reconhecidamente (no sentido de fatos comprovados) maléficas (no aspecto tanto físico como mental) para o indivíduo e, consequentemente, a sociedade, ninguém tem o direito de impor a outros seus valores e normas de conduta. Portanto, o liberal acredita que a “verdade” e valores não podem ser impostos, mas apenas compartilhados com os demais; E compartilhar implica em subjetivamente reconhecer que o que se está oferecendo pode não apenas ser rejeitado pelo outro, como severamente criticado.

Compreendido isso, se entende que uma sociedade liberal deve ser vislumbrada, como bem assinalou Popper e Hayek, como uma “sociedade aberta”, onde se reconhece que ideias, valores e costumes são mutáveis e evoluem culturalmente por meio de um processo de tentativa e erro que ocorre a nível individual; e esse processo só pode ocorrer continuamente quando se tem em altiva o “espírito” liberal, de abertura para que novas ideias, valores e costumes possam emergir, confrontar os já estabelecidos e prosperar na sociedade.

O exemplo mais notório desse processo moral evolucionário sem dúvida foi a mudança de mentalidade a nível mundial quanto à questão da escravidão, que perdurou desde os primórdios da humanidade e só começou a ser abolida legalmente e abominada publicamente em todos os lugares há menos de dois séculos.

Portanto, e aqui finalmente retomo ao conteúdo da tirinha que dá título a esse texto, o que se deve ter em mente constantemente, sendo nós os seres sociais por excelência, é que os valores, crenças, ideias e práticas de um indivíduo interessam especialmente a ele. Evidente que reconhecer isso não implica em concordar ou incentivar os costumes e ideário do próximo. De fato, ao vivermos em sociedade, estamos sempre expostos a sermos julgados e criticados pelos demais.

O que não compete a alguém dotado do espírito liberal, filosoficamente falando, é fechar sua mente para críticas, alternativas e confrontos quanto ao conjunto de crenças que possui e valoriza. Um liberal está aberto ao novo e diferente como puro e simples reconhecimento da individualidade característica dos seres humanos. Em suma, todos nós temos o direito de sermos deixados em paz, seja lá por quem for, por sermos indivíduos, por sermos essencialmente diferentes.

Dessa forma, um liberal é aquele de admite que ele é apenas um indivíduo e que nada nem ninguém melhor do que ele próprio pode escolher o que é melhor pra si mesmo. Somente ao admitir sua ignorância quanto a tudo que o cerca, no melhor aspecto socrático, o que por sinal é um forte ato de humildade, o indivíduo pode interagir e decidir se concorda ou não com o próximo, que assim como nós, estará livre para cuidar da sua própria vida, do jeito que melhor entender, sem sofrer coação ou ameaça de violência, seja esta institucionalizada ou não.

Viva e deixe viver”. Eis um bom lema para definir o pensamento liberal.

 

Referências:

[1] LYNCH, Alberto B. El liberalismo como respeto al prójimo. Publicado em El Instituto Independiente. Disponível aqui.

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Adriel Santana

Adriel Santana

Formado em Direito pela Universidade Estadual de Santa Cruz, na Bahia. Escreve artigos também para o Portal Libertarianismo e o Liberzone.

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