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Crises, guerras e Leviatã

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“De todos os inimigos da liberdade pública, a guerra é, talvez, o que deva ser mais temido, porque engloba e desenvolve os germes de todos os outros. A guerra é a mãe dos exércitos; desses, provêm as dívidas e os impostos; exércitos, dívidas e impostos são instrumentos conhecidos por trazer muitos à dominação de poucos… Nenhuma nação pode preservar a sua liberdade em meio a um permanente estado de guerra”. James Madison

Como esperado, a tragédia em Paris, sexta-feira passada, tem sido utilizada como um catalisador para o cerceamento das liberdades individuais, tanto na França quanto na Europa em geral. Aqueles que vêem com bons olhos a troca de liberdade por promessas de segurança argumentam a favor de medidas de exceção, e querem os governos com mais autoridade para se intrometer na vida das pessoas. Seus alvos prioritários são as liberdades de expressão, o direito de ir e vir (fechamento de fronteiras) e, principalmente, o direito à privacidade.  Será que compensa?

Desde o massacre do Charlie Hebdo, em janeiro, a polícia francesa está legalmente autorizada a monitorar as comunicações e os movimentos, sem mandado judicial ou sequer uma suspeita fundada. Hoje, eles podem arrombar portas e prender temporariamente quem eles quiserem.  Além disso, desde o último fim de semana, podem confiscar todas as armas de fogo encontradas em Paris – uma forma, convenhamos, de aumentar ainda mais o poder dos inimigos, pois estes agirão na certeza de que não haverá reação.

Nada disso, entretanto, impediu o massacre de sexta-feira.  A própria ação policial que prendeu e matou vários terroristas, na quarta feira, no subúrbio de Saint-Denis, só foi possível porque contou com uma denúncia anônima e o rastreamento de ligações telefônicas entre números encontrados num dos celulares de um terrorista morto na sexta feira.

Não, não sou daqueles que pensam que os franceses não têm o direito de revidar as agressões.  Até porque trata-se de legítima defesa, um princípio inegociável para os liberais.  Além disso, não dá para tolerar os intolerantes.  Agora, abrir mão de direitos civilizacionais fundamentais, não faz muito sentido para mim, principalmente porque as promessas de segurança não são, historicamente, cumpridas. Como frisou Madison, nada pode ser mais perigoso para a liberdade do que “um permanente estado de guerra”.

Em dois de seus livros, “Neither Liberty nor Safity” e “Crisis and Leviathan”, o economista e historiador Robert Higgs reúne inúmeras evidências históricas que demonstram como a insegurança econômica, a vulnerabilidade a inimigos externos ou internos e as catástrofes ambientais foram usadas através dos tempos para expandir o tamanho do Estado e a intervenção dos governos na esfera privada.

Os livros são bastante didáticos ao explicar, por exemplo, como os governos — malgrado sua indelével vocação para a ineficiência e o desperdício de dinheiro alheio — crescem exponencialmente em momentos de crises (reais ou fabricadas), e por que raramente retornam ao seu tamanho original depois que elas cessam.

Segundo Higgs, nossa constituição física e psicológica nos predispõe ao medo, seja ele oriundo de ameaças reais ou potenciais. Infelizmente, os políticos entendem perfeitamente esta peculiaridade da natureza humana, e a exploram de forma eficiente.

Eles sabem que dependem do pânico para assegurar a submissão da sociedade, o consentimento popular e a cooperação afirmativa com suas aventuras. O primeiro secretário do presidente Obama, Rhan Emmanuel, traduziu isso, objetivamente, durante a crise econômica de 2008, quando disse, sem meias palavras: “Esta crise nos dá oportunidade de fazer coisas que não podíamos fazer antes”.

Em “Crisis and Leviathan”, escrito em 1987, portanto muito antes da eclosão dos atentados terroristas pelos jihadistas islâmicos, Higgs é enfático e, ao mesmo tempo, pessimista quanto ao futuro da liberdade no mundo.  Segundo ele, “se nós sabemos algo – pelo menos abstratamente – sobre o futuro, é que outras grandes crises virão. Se elas vão ser ocasionadas por guerra, colapso econômico ou terrorismo desenfreado, ninguém pode prever com garantia.  De uma forma ou de outra, grandes crises certamente virão outras vezes… E, quando vierem, governos quase certamente vão ganhar novos poderes sobre assuntos econômicos e sociais… Para aqueles que prezam a liberdade individual e uma sociedade livre, a perspectiva é profundamente desanimadora.” Bingo!

Higgs sabe das coisas.  Esperemos que os franceses e os europeus saibam balancear com sabedoria a troca que seus governos estão lhes propondo agora.  Até porque, como ensinou Henry Steele, “a liberdade não é um luxo que podemos saborear quando finalmente tivermos segurança, prosperidade e iluminismo; é, pelo contrário, antecedente a tudo isso, pois sem ela não podemos ter nem a segurança nem a prosperidade nem o iluminismo.

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João Luiz Mauad

João Luiz Mauad

João Luiz Mauad é administrador de empresas formado pela FGV-RJ, profissional liberal (consultor de empresas) e diretor do Instituto Liberal. Escreve para vários periódicos como os jornais O Globo, Zero Hora e Gazeta do Povo.

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