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“A Suécia depois do modelo sueco”: parlamentar desmonta mito do socialismo escandinavo

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bandeira-sueciaQuando o debate entre a retração e o agigantamento do Estado é travado, os socialistas costumam levantar uma referência do suposto sucesso de seu modelo: a Suécia. O intervencionismo esquerdista teria encontrado no país nórdico o berço esplêndido do sucesso. Recentemente, reportagem do programa Globo Repórter ajudou a alimentar esse mito, sendo usada como munição pelos afobados para comprovar a materialização do paraíso socialista e atacar os “imbecis” liberais.

Lançado pelo Instituto Liberal em 2007 no Brasil, com tradução de Roberto Fendt, A Suécia depois do modelo sueco – Do Estado beneficente ao Estado possibilitador é um trabalho muito útil para a compreensão do que realmente aconteceu por aquelas bandas. O autor é Mauricio Rojas, nascido no Chile, mas que se naturalizou sueco e se tornou membro do Parlamento da Suécia como candidato independente na lista do Partido Liberal, englobando no currículo ainda as funções de professor de História Econômica, Assessor Sênior de Timbro e Diretor do Centro para a Reforma do Estado do Bem-Estar. Com todo seu estofo acadêmico, Rojas traça, com considerável recorrência a gráficos e dados quantitativos minuciosos, a trajetória daquela nação sob o ponto de vista do tamanho de seu Estado; em outras palavras, Rojas conta a história de uma aposta – uma aposta utópica e romântica pelo “socialismo democrático”, que se esgotou por conta de suas próprias incongruências.

Ao ver privilegiado de Rojas, um latino-americano nativo – e, portanto, conhecedor, de alguma sorte, dos dilemas que nós mesmos vivemos em nossa região continental – mergulhado na sociedade sueca, essa aposta só foi possível porque “um pujante capitalismo aberto ao mundo” permitiu que fossem criadas “as condições de um progresso social sem precedentes que, com o tempo, desembocou em um experimento estatista que finalmente – quando chegou a pôr em perigo as próprias bases da prosperidade – foi relegado à história”, mediante um processo de transformação “em que o velho Estado beneficente – que queria decidir e controlar tudo – dá lugar a um Estado possibilitador – que possibilita a livre escolha dos cidadãos em matérias básicas do bem-estar”. Em vez de abraçar cegamente o mito do modelo socialista sueco bem-sucedido, Rojas nos convida a, devassando sua história, aprender com a peculiaridade que ele permitiu: a de facultar a um povo construir, na própria pele, o emblema do fracasso dessas teorias ultrapassadas.

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Mauricio Rojas

Rojas define por Estado beneficente maximalista “uma forma extrema do Estado beneficente que busca atingir um monopólio total sobre os serviços e instituições que regulam a vida dos cidadãos”; como Hayek já bem apontou em seu imortal O Caminho da Servidão, por melhores que sejam as intenções, esse projeto nunca acaba bem. De acordo com Rojas, no entanto, a Suécia já tem, desde as origens de sua monarquia constitucional, uma “tradição de intervenção e paternalismo estatal” que só não atinge os extremos do desastre em virtude da “sociedade etnicamente muito homogênea”.

Desenvolveu-se no país, desde 1932, uma forte hegemonia da social-democracia (aquela mesma que a esquerda radical brasileira considera “de direita”), com pouquíssimas interrupções, perante conservadores e liberais; um reformismo social, propondo “um sistema de seguridade e serviços sociais básicos de acesso universal”, bem como propostas trabalhistas, era a tônica original dessa mesma social-democracia, que somente atingiu o poder – vale muito ressaltar – depois do período entre 1864 e 1932, em que se desenvolveu fortemente a indústria com base na plena liberdade de comércio.

Elementar; para que a social-democracia se custeie, ela precisa que o liberalismo econômico ponha antes a mão na massa. Com o tempo, porém, os sociais-democratas suecos quiseram mais e avançaram para propostas socialistas, realmente utópicas, começando a implantar seu projeto de estatização da sociedade depois da Segunda Guerra, chegando ao auge nos anos 70 e 80. Todas as instituições que oferecem benefícios e serviços de bem-estar à sociedade, destaca Rojas, estavam na mira do Estado, que queria controlá-las. O resultado disso, fartamente delineado por Rojas, foi o colapso, no começo da década de 90, com a “expansão da economia planificada à custa da economia de mercado”. Ele lembra que a Suécia era, em 1970, o “quarto país mais rico do mundo em termos de renda real per capita”, sendo ultrapassada por todos os vizinhos e ficando, em 2003 – pouco antes de Rojas escrever seu pequeno livro -, em décimo quarto lugar no ranking da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, formada por 34 países, em uma queda considerável que coincide com a adoção do modelo socialista. Em 1989, a carga tributária total equivalia a 56,2 % da renda nacional!

Desemprego, disparo no gasto público, déficit, foram problemas que, associados ao fato de uma população mais instruída desejar a diversificação de seu consumo, permitiram que mesmo a social-democracia hegemônica percebesse que carregou nas tintas em sua dose de socialismo e voltasse atrás. A partir daí, Rojas faz uma análise pormenorizada das mudanças por que a Suécia passou, incluindo a adoção, em 1992, do sistema de vouchers na educação, preconizado por Milton Friedman, e o desmantelamento do monopólio estatal em uma série de serviços. A social-democracia se viu obrigada a fazer, talvez em escala até maior, algo do gênero do que fez no Brasil, durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso.

sueciadepoisdomodeloNem tudo são flores, contudo, e a Suécia segue longe de ser um paraíso para liberais, libertários e conservadores. Para muitos (particularmente, eu mesmo), possivelmente incomodariam a penetração da ideologia de gênero e a facilidade do aborto. No entanto, para além disso, segundo Rojas, a Suécia vive hoje (2005) “uma crise moral generalizada”, envolvendo desde alguns eventos de corrupção até uma enfermidade social gravíssima: “a disposição crescente da população de optar por um absenteísmo laboral ou por simplesmente abandonar a população ativa”. Com o acúmulo dos benefícios sociais-democratas, muita gente, ao que parece, apenas se recusa a produzir. Só tem um problema, diria Friedman: “não existe almoço grátis”. Mesmo com as melhorias consideráveis no cenário de amplo socialismo do passado não tão remoto, o modelo social-democrata da Suécia se encontra, diria Rojas, diante de dilemas e obstáculos que podem dificultar muito seu futuro.

As tensões relacionadas à imigração, alvo das reflexões do autor no final do livro e que geram um grande debate nos países europeus e nos Estados Unidos, despontando em um país outrora tão homogêneo, apenas apimentam esse contexto. “Nesse sentido, se está despertando de um longo sonho multiculturalista que, em sua ingenuidade, acreditava que todas as expressões culturais eram compatíveis tanto entre si quanto com os valores básicos de uma sociedade aberta”, pontua Rojas, enfatizando o dilema de se pensar a respeito de “expressões religiosas que não respeitam secularização da vida social e cuja aceitação plena levaria praticamente à criação de um verdadeiro Estado dentro do Estado” – o que nos traz à memória casos de ativistas islâmicos como o britânico Anjem Choudary, clamando pela Sharia (a lei islâmica) em terreno ocidental.

O livro termina com uma relação de gráficos estatísticos que ajudam a ilustrar a já aprofundada apreciação de Rojas, que recomendamos vivamente a quem esteja interessado em, para si ou como indicação a eventuais interlocutores, colocar o ideário ilusório do socialismo sueco em seu lugar de direito, que é, como conclui o autor, “o mundo das recordações e dos mitos”.

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Lucas Berlanza

Lucas Berlanza

Jornalista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), colunista e presidente do Instituto Liberal, membro refundador da Sociedade Tocqueville, sócio honorário do Instituto Libercracia, fundador e ex-editor do site Boletim da Liberdade e autor, co-autor e/ou organizador de 10 livros.

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