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Para entender o que é o liberalismo

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Exímio fundador do Instituto Liberal, além de tradutor de grandes obras liberais renomadas, como Human Action de Mises, Donald Stewart Jr. foi um engenheiro e ativista liberal. Apesar de seu pequeno tamanho, não devemos subestimar o peso intelectual deste livro. Ao se debruçar nas pouco mais de 160 páginas, vem a constatação: a obra é riquíssima em fontes e conteúdo. Trata-se de um mergulho na doutrina liberal, com definição dos conceitos mais intrínsecos do movimento, sempre atrelando-os à realidade brasileira. Stewart vai fundo nos contextos históricos, explicando a raiz dos problemas vivenciados na sociedade atual.

Donald faz questão de ser incisivo ao introduzir o livro, expondo o “divórcio entre as causas e os “efeitos”, que tem impedido o avanço do desenvolvimento e da prosperidade na humanidade. Não é possível abraçar os fins e, ao mesmo tempo, condenar os meios para se chegar a eles. O liberalismo é, portanto, um dos meios pelos quais a humanidade pôde atingir um nível tão elevado de conforto. Isso tem uma explicação lógica: a doutrina liberal tem uma enorme preocupação com a natureza ética, o que se evidencia na soberania do consumidor. O consumidor possui desejos a serem satisfeitos, encontrando na figura do empresário uma alternativa para atingir o seu fim.

É no primeiro capítulo que Donald faz o seu mergulho histórico, retornando à gênese do liberalismo: as monarquias absolutistas e o mercantilismo. O pensamento liberal surge como oposição às ideias autoritárias que reinavam nas sociedades até o século XVIII. A sociedade desejava autonomia para tocar suas atividades e essa insatisfação popular é muito bem ilustrada na expressão fundamental do liberalismo: “laissez faire, laissez passer!”. O mercantilismo se apoiava na ideia de que a economia era um jogo de soma zero, cuja premissa era de que “quando alguém ganha, alguém perde”, o que foi posteriormente refutado pelo avanço da economia de mercado. É justamente no cenário de falência múltipla do antigo regime, com o fim das monarquias absolutas e a secularização do Estado, que o liberalismo vive o seu auge, influenciando diversas revoluções em todo o mundo e contribuindo para a geração de riqueza.

Entretanto, a geração de riqueza resultante das práticas liberais não foi acompanhada pela disseminação dos seus ideais: logo foram esquecidas as causas que propiciaram tais efeitos. Isso, somando-se ao sucesso da teoria marxista, foi suficiente para que se iniciasse o processo de declínio da doutrina liberal. Não obstante, já no século XX, o liberalismo entrou em desuso. As nações preferiram adotar as falsas pretensões dos regimes autoritários, tornando a primeira metade do século XX um verdadeiro desastre à ideia de liberdade. O amplo êxito do intervencionismo e do socialismo foi essencial no abandono dos valores de liberdade.

É no período entreguerras que surge uma nova esperança: Ludwig von Mises. Ele foi figura ímpar na disseminação das ideias liberais no século XX, com sua teoria da impossibilidade do cálculo econômico socialista, prevendo a falência da URSS. Além disso, em 1927, publicou uma das obras mais importantes para a doutrina liberal, o seu livro Liberalismo, onde postula os fundamentos liberais; em 1949, lançou sua obra mais complexa, Ação humana, criando a corrente filosófica denominada de “praxiologia”. Outra figura extremamente importante foi F. A Von Hayek, com seu livro O caminho da servidão, em que condenou a social-democracia, alertando para suas graves consequências. A influência desses grandes pensadores mudou plenamente o cenário da segunda metade do século XX e, junto com o auxílio da divulgação dessas ideias através de institutos, permitiu que o movimento liberal “renascesse”.

O segundo capítulo do livro aborda a Ação humana de Mises e sua relação com a economia. Em suma, o insight da obra é que “o homem só age para aumentar a sua satisfação ou para diminuir o seu desconforto”. A economia, por sua vez, volta-se a investigar os “meios que devem ser utilizados para que os fins escolhidos sejam obtidos”, diz Stewart. Essa investigação precisa existir porque os meios são escassos e os fins ilimitados.

Para Stewart, as instituições sociais – como a cooperação, a competição, o mercado e a sociedade humana – não são objetivos estabelecidos a priori, isto é, surgem do que Hayek chama de “ordem espontânea”. O objetivo da ação humana é aumentar o conforto, sendo as instituições apenas meios.

Daí distinguem-se dois conceitos muito importantes: a sociedade humana e a cooperação social. A sociedade humana seria uma necessidade que surge na divisão do trabalho, pois é mais eficiente na redução do desconforto e, assim, cria-se a cooperação social. A cooperação só pode existir caso haja uma vantagem comparativa, onde os indivíduos envolvidos possam atingir uma situação melhor que a inicial. De acordo com Stewart, “o resultado da troca voluntária é sempre positivo”. Deste modo, a cooperação permite maior produtividade e satisfação geral.

O mercado se apresenta como o único meio que permite a cooperação entre estranhos, pois ele é capaz de transmitir informações, em outras palavras, o preço. No entanto, é somente no livre mercado que os preços transmitem informações verossímeis.

Quando ocorrem as intervenções (tais como o tabelamento, subsídios e etc.), os preços são deformados artificialmente e, por consequência, a produção se desorganiza por não mais saber quais os próximos passos a serem dados, visto que as informações passadas pelo preço não são frutos de movimentações genuínas de mercado. Além disso, o lucro, numa sociedade livre, é o que diferencia o empresário competente do incompetente.

A competição é uma consequência da liberdade de entrada no mercado, permitindo que novos empresários possam produzir, evitando os monopólios. A existência da competição justa permite que o consumidor exerça sua soberania, bem como os preços tendem a cair e a produtividade a aumentar. O Estado entra nessa história como o garantidor da liberdade de entrada no mercado, evitando o protecionismo e a distribuição de privilégios. As instituições possuem papel fundamental na garantia da liberdade de mercado e na ausência de privilégios.

O terceiro capítulo define o que é a doutrina liberal. De acordo com Donald, o liberalismo é uma doutrina política que busca melhorar as condições materiais do ser humano, ou seja, não tem qualquer intenção de atingir as riquezas interiores e espirituais.

A doutrina liberal tem como principais pilares a liberdade, a propriedade, a paz e a tolerância. A liberdade faz com que a propriedade privada não sofra restrições; a propriedade conduz à maior geração de riqueza; e para que haja liberdade, o liberalismo se posiciona contra a guerra, visto que ela impossibilita a cooperação social e a divisão do trabalho. O liberalismo é tanto liberdade econômica quanto liberdade política, visto que ambas estão intrinsecamente associadas entre si.

De modo geral, os princípios gerais do liberalismo são: igualdade perante a lei, ausência de privilégios, respeito aos direitos individuais, responsabilidade individual e respeito às minorias.

O papel do Estado na ótica liberal não é de caráter anárquico. A doutrina reconhece a necessidade de uma “ordem geral, estruturada em normas abstratas de conduta, legitimamente geradas pelos cidadãos e eficazmente aplicadas pelas instituições administradoras da Justiça”, afirma Stewart. O Estado deve deter o monopólio da coerção para impedir os indivíduos de atacarem os direitos naturais dos demais. Ele também acrescenta que o Estado objetiva promover a ordem e a justiça, mantendo um clima de paz e respeitando a autodeterminação dos povos. Em um trecho muito pertinente, Stewart condena o papel de “polícia do mundo”, o qual os Estados Unidos costumam fazer.

Em seu último capítulo, Donald volta sua atenção para os acontecimentos de seu país, o Brasil. Para ele, o grande problema brasileiro é ideológico, ou seja, das escolhas dos meios. É necessário deixar de ser um país intervencionista e se tornar um Estado liberal, mas isso leva bastante tempo. Para essa mudança, é extremamente importante que as elites intelectuais e políticas admitam a necessidade de superar as práticas intervencionistas do Estado.

Donald Stewart Jr. conduz, com muita maestria, o leitor de pouca ou nenhuma base do pensamento liberal a um nível de conhecimento esclarecedor. O autor utiliza argumentos e fatos que comprovam os desastres das práticas intervencionistas, propondo soluções. Um dos seus grandes acertos é deixar explícito o que o liberalismo é, reduzindo qualquer expectativa que busque ultrapassar os limites de uma doutrina política, tal qual o marxismo o faz. Por fim, encerra seu livro com um otimismo pragmático e racional: “é melhor um social-democrata que ganhe eleições e que faça democraticamente as reformas das quais nosso país necessita do que um autêntico liberal que não tenha a menor chance de ganhar eleições”.

*Lucas Emanuel Wanderley da Silva é Associado do IFL – Recife, Coordenador Local do Students For Liberty e Social Media do Clube Frei Caneca.

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