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Populismo, ameaças à democracia e desinteresse da União Europeia na América Latina foram temas de encontro em Porto Alegre

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Estive em Porto Alegre na última sexta-feira (27) presenciando a Conferência Pública Europa y América Latina: cooperación y futuro, realizada na sede do Instituto Ling. O evento foi uma parceria entre diferentes organizações, a exemplo da Red Liberal de América Latina, da Fundação Friedrich Naumann e do Instituto de Estudos Empresariais.

A iniciativa reuniu diversas lideranças da América Latina e da Europa para discutir os horizontes e perspectivas das duas regiões e de seu relacionamento. Encontros dessa natureza são úteis para apreender os temas de maior preocupação no momento e como uma mesma situação está sendo percebida a partir de diferentes países e continentes.

A abertura foi feita pelo prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo; o vice-prefeito da cidade, Ricardo Gomes; o embaixador da Alemanha no Brasil, Heiko Thoms; a presidente do Instituto de Estudos Empresariais, Victoria Jardim; e um integrante do Free Democratic Party alemão, Michael Link. Seguiu-se um painel voltado à situação europeia, com o mesmo Michael Link, o parlamentar espanhol Jordi Cañas e o secretário-geral do Instituto para la Promoción de América Latina y el Caribe, o português Filipe Domingues, com moderação de Bettina Horst, diretora-executiva do instituto chileno Libertad y Desarrollo.

Os discursos de abertura e o primeiro painel tiveram três notas dominantes. A primeira não poderia deixar de ser a guerra da Rússia contra a Ucrânia, com os impactos terríveis de um conflito territorial no seio da Europa em 2022 para as nações da região e para as cadeias econômicas globais. Apesar dos seus efeitos devastadores, a guerra que se desenrola, segundo os conferencistas, despertou certa atenção para outros mercados, entre eles o latino-americano.

Daí se deduz a segunda nota dominante: a falta de interesse dos europeus pela América Latina. Os políticos portugueses e espanhóis, devido às relações históricas e culturais de seus países com a região, foram apontados como os maiores promotores da importância de um estreitamento de laços entre os membros da União Europeia e os latino-americanos.

Michael Link e Jordi Cañas concordaram em que existem muitas forças políticas na Europa que se opõem obstinadamente a essa perspectiva, o que consideram um grave erro e um enorme potencial desperdiçado. Na Alemanha, Link afirma que seu partido liberal tem essa preocupação, mas a coalizão a que está vinculado não enxerga o assunto da mesma forma. Já Cañas, que é deputado no Parlamento Europeu, questiona os interesses de partidos e grupos políticos do velho continente que empregam argumentos contra países como o Brasil, a exemplo dos problemas ambientais na Amazônia, como motivos para vedar a aceleração de importantes acordos comerciais. Conforme Cañas, seria muito melhor poder confrontar problemas como esses, por mais que os admitamos, mantendo relações mais próximas, inclusive econômicas, com o Brasil, em vez de promover boicotes que claramente só têm base em preocupações corporativistas.

A terceira nota dominante foi a democracia. Michael Link considera que vivemos um enfrentamento civilizacional entre o modelo das democracias liberais e as tentativas autoritárias, especialmente de Rússia e China, de construir áreas de influência para seus modelos antiliberais. Nesse sentido, a América Latina, apesar de suas adversidades institucionais e de abrigar ditaduras, apresenta uma maior identificação com as pretensões liberais-democráticas que muitas outras áreas do globo e deveria ser objeto de atenção prioritária dos líderes europeus.

O evento seguiu com um painel avaliando o Mercosul e suas deficiências, reunindo, sob a moderação de Lars-André Richter, representante da Fundação Friedrich Naumann na região La Plata; o secretário geral da comissão binacional de Salto Grande e vice-secretário de Relações Internacionais do Partido Colorado uruguaio, Nicolás Albertoni; Agustín Etchebarne, diretor-geral do instituto argentino Libertad y Progreso; e Dietmar Sukop, diretor-executivo da Câmara Brasileira-Alemã de Indústria e Comércio do Rio Grande do Sul. Os palestrantes constataram as regulações exacerbadas e a falta de comunicação entre os países que integram o órgão.

Um dos painéis mais interessantes foi o último, que abordou os desafios gerais da América Latina. Representantes de diferentes nações da região se reuniram para sintetizar o cenário institucional, político e econômico de seus países e tentar reconhecer os principais problemas, em que medida eles são sistêmicos e como se poderia concertar uma reação a eles. O Brasil esteve representado pela presidente do Instituto Millenium, a economista Marina Helena Santos, ao lado de lideranças do Chile, do Equador, da Guatemala, do México, da Venezuela e da Costa Rica.

O absurdo das estruturas tributárias, os privilégios estatais, as instituições extrativistas, os entraves de governabilidade e o poder de influência dos populismos de diferentes colorações ideológicas foram apontados por todos os líderes, ilustrando o que nem seria preciso dizer: de maneiras e em intensidades diferentes, são dramas comuns aos latino-americanos. Muitos conferencistas manifestaram preocupação com o que consideram, neste começo de século XXI, uma retração do prestígio das democracias liberais. A julgar pelo que europeus e latino-americanos disseram no mesmo evento, essa sensação indigesta é preocupante dos dois lados do Oceano Atlântico.

Todos julgaram que um dos principais desafios que temos é aprender a comunicar às pessoas que nossas ideias são as mais conducentes à prosperidade. A chilena Bettina Horst afirmou que um dos principais fatores para que a esquerda de seu país conseguisse trazer o debate de uma reforma constitucional esquerdizante até o ponto em que chegou foi a falta de ênfase necessária à defesa das linhas gerais do modelo introduzido pelos Chicago Boys.

O deputado estadual Fábio Ostermann (NOVO/RS), formulando um questionamento a respeito, provocou entre os conferencistas uma clara divergência acerca dos méritos da tese de legalização das drogas. O tema apareceu porque os palestrantes concordaram em que o crime organizado é um dos problemas mais graves que são comuns a toda a região.

Espero que esteja plantada uma semente para que os laços entre os liberais dos dois lados do oceano, bem como entre os liberais dos diversos países deste lado de cá mesmo, se estreitem, e que bons frutos sejam colhidos dessa iniciativa tão estimulante e aprazível.

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Lucas Berlanza

Lucas Berlanza

Jornalista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), colunista e presidente do Instituto Liberal, membro refundador da Sociedade Tocqueville, sócio honorário do Instituto Libercracia, fundador e ex-editor do site Boletim da Liberdade e autor, co-autor e/ou organizador de 10 livros.

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