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“Por que os piores chegam ao poder?” – a importância da teoria de Hayek

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A melhor explicação sobre como pessoas de índole duvidosa chegam a posições de poder ainda é encontrada em “Por que os piores chegam ao poder”, décimo capítulo da obra-prima imortal de F. A. Hayek, O Caminho da Servidão, publicada em 1944.

Antes de navegar pela teoria do autor austríaco, é preciso entender o contexto em que a obra foi escrita. Na época, a Alemanha de Hitler começava a sucumbir pelo oeste, com avanços das tropas britânicas e americanas, e pelo leste, sob o comando da União Soviética. O otimismo pela expectativa do fim da guerra trazia o perigo oculto de ideologias socialistas, sustentadas pela crença dos intelectuais acerca do papel forte que o governo deveria ter na economia por meio de um planejamento central. Enquanto o mundo ansiava pelo fim dos conflitos bélicos, Hayek se preocupava com ideias socialistas se infiltrando nos governos e sentiu que precisava alertar a todos sobre os perigos do gigantismo estatal e sua trilha em direção a regimes autoritários.

Na obra, fica evidenciado que todas as formas de coletivismo levam à tirania e à derrogação das liberdades. Isso porque, quando a economia fica submetida a um sistema artificial de planejamento central, a alocação dos recursos fica à mercê da vontade de poucos que, para terem suas medidas toleradas, lançam mão do discurso populista centrado no protagonismo do líder “salvador da pátria”. O inevitável fracasso de políticas instituídas nesse sistema ocasiona, paradoxalmente, o fortalecimento da narrativa de que é culpa exatamente da falta de poder de atuação do governo, inflando o discurso de que o Estado precisa ser ainda maior e mais forte para conseguir executar o planejamento central.

Para Hayek, aqueles que pensam que não é o sistema que deve ser temido, mas o perigo de ele ser administrado por homens maus, são utópicos ingênuos, cujo destino é o eterno desapontamento com o resultado socialista. O autor argumenta que as características mais nocivas dos estatistas não são subprodutos acidentais, mas elementos integrantes desse próprio sistema. Aduz, com grande perspicácia, que os inescrupulosos e desinibidos provavelmente serão os mais bem-sucedidos em qualquer sociedade na qual o governo seja visto como a resposta para a maioria dos problemas. O governo, detentor do monopólio legal do uso da força, atrai tais elementos com tanta presteza quanto o esterco atrai moscas. Em outras palavras, é o aparato do governo que lhes permite causar estragos no resto da sociedade, de modo que não basta eleger pessoas boas, mas é imperioso garantir que qualquer forma de totalitarismo seja rejeitada.

O autor ganhador do prêmio Nobel observou que, enquanto pessoas mal-ntencionadas regozijam-se ao serem obedecidas, pessoas de boa índole não sentem prazer em controlar os outros e, portanto, não encontram apelo no poder totalitário. O deslinde da teoria de Hayek para explicar esse fenômeno desdobra-se em três razões principais. A primeira é a de que, quanto mais educadas e inteligentes as pessoas, tanto mais elas questionam e debatem ideias e, via de consequência, mais se diferenciam seus gostos, opiniões e hierarquia de valores. Para que um sistema autoritário sobreviva, grandes grupos devem se unir em torno de valores semelhantes. Considerando que os que possuem gostos altamente diferenciados não sustentam, pela força do número de indivíduos, seus ideais, o maior grupo de pessoas cujos valores são muito semelhantes é aquele que representa a massa menos educada e menos independente da população.

Não é difícil encontrarmos exemplos atuais do comportamento descrito na obra. Quando um governante, em nome da saúde, por exemplo, brada que vacinas devem ser obrigatórias à população, pois o interesse da coletividade supera o direito “egoísta” de uma pessoa que recusa se imunizar, há, automaticamente, um fator comum que une pessoas em um grande grupo, afinal, quem não defenderia a saúde de todos em detrimento de um “capricho individual”?

A pandemia de COVID-19 trouxe uma outra situação que, igualmente, espelha essa imagem: as medidas de fechamento compulsório de estabelecimentos comerciais ditos “não-essenciais”. Por meio do subterfúgio de evitar a circulação do vírus, milhões de pessoas aplaudiram as restrições de funcionamento, desconsiderando os efeitos devastadores que tais determinações provocariam na economia e nas finanças dos cidadãos. Em última análise, a propaganda do medo operada por líderes políticos serviu para angariar apoiadores em torno de uma causa comum que afetou negativamente seus próprios adeptos.

Voltando à obra de Hayek, a segunda razão recai sobre o fato de que pessoas mais simples e dóceis tendem a ter menos convicções próprias e estão mais suscetíveis a aceitar “um sistema de valores previamente elaborado, contando que este lhes seja apregoado com bastante estrépito e insistência”. São aquelas pessoas que, pelas ideias vagas e imperfeitas, têm as paixões cegamente despertadas e influenciadas. No Brasil, por exemplo, a própria complexidade do sistema político e os baixos níveis educacionais de grande parte da população são um prato cheio para doutrinação ideológica que inibe e limita a liberdade individual por meio de agendas sociais. A ideia da distribuição igualitária de riquezas, os subsídios infinitos a grupos de pressão, a criação de privilégios disfarçados de direitos – tal qual auxílios para servidores do alto escalão e a meia entrada – ilustram precisamente o caminho para a servidão de Hayek, no qual o governo e os partidos políticos crescem vertiginosamente sobre os ombros do pagador de impostos.

A terceira e última razão apontada pelo autor está relacionada aos motivos que fazem determinado grupo se unir por uma causa. Parece mais fácil aos indivíduos concordarem sobre algo negativo – ódio a um inimigo ou inveja dos que estão em posições de vida melhores – do que sobre pautas positivas. Temperada com uma boa dose da antítese “nós contra eles”, ideologias são capazes de solidificar um grupo que visa à ação comum.

Nesse sentido, a realidade política brasileira não poderia exemplificar melhor a teoria heyekiana. De um lado, Bolsonaro é repudiado por aqueles que compraram a narrativa de que seria um presidente desalmado, genocida, tosco e vulgar. De outro, Lula desperta ódio quando confrontado com os escândalos de corrupção, lavagem de dinheiro, mensalão, apoio a ditaduras, ocultação de patrimônio e a defesa de agendas socialistas perigosas. O “nós contra eles” é exatamente isso: a união sólida de um grupo para atuar contrariamente ao que outrem representa como ideologia.

Hayek observou uma tendência crescente entre as pessoas de, justamente, se imaginarem éticas porque delegaram seus vícios a grupos cada vez maiores. Agir em nome de um grupo parece libertar as pessoas de muitas das restrições morais que controlam seu comportamento como indivíduos. A mesma lógica é aplicável quando as pessoas agem em nome de um sistema, isto é, há uma espécie de conforto em apoiar sistemas que pregam o aumento do Estado sob o argumento paternalista do “bem comum”.

Pelos fundamentos acima, a natureza dos regimes autoritários descritos na obra atrai pessoas com as piores qualidades humanas, que, sem qualquer constrangimento, manipulam as massas dotadas de instintos mais simplórios. O problema é que mesmo um sistema democrático como o nosso pode rapidamente se tornar autoritário e violar direitos individuais se concentrar muito poder nas mãos de um limitado número de burocratas que, por não sentirem os custos morais de corromperem a democracia, honram o desprezível e vilipendiam a liberdade.

Quando os engodos passam a ser bases de poder endossadas pelos grupos que transferem seus vícios pessoais às ideologias, precisamos urgentemente remeter-nos às sábias palavras de Thomas Sowell: “O fato de que muitos políticos de sucesso são mentirosos não é exclusivamente reflexo da classe política, é também um reflexo do eleitorado. Quando as pessoas querem o impossível, somente os mentirosos podem satisfazê-las.”.

O momento atual da corrida à presidência é um convite à autoanálise para, diferentemente do narrado por Hayek, não cairmos no poço sombrio da massa responsável por, cegamente, colocar no poder demagogos cuja retórica sempre terá como pilar a defesa do “interesse social” por intermédio da violação de direitos inalienáveis e de princípios éticos.

Juliana Bravo – Associada I no Instituto Líderes do Amanhã.

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