Corrupção: um dado do problema

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O noticiário sobre corrupção passou a fazer parte do nosso dia a dia. Já nem deveria causar surpresa ou disputar os custosos espaços dos jornais ou das televisões. Mas ainda desperta interesse, talvez mais pelos nomes das pessoas envolvidas do que necessariamente pela própria corrupção.

O surpreendente não deveria ser a corrupção, e sim a surpresa popular diante dela. Corrupção e hipertrofia do setor público são a cara e a coroa de uma mesma moeda; a concentração de poder tende a gerar coerção e concessão de privilégios. A correlação é universal; não há qualquer coisa de errado com o caráter do brasileiro (se é que tal coisa existe) que possa responsabilizá-lo pela onda de bandalheiras que estamos presenciando, e talvez nem essa onda esteja aumentando, mas simplesmente sendo mais divulgada. Não que nós brasileiros sejamos santos, mas tampouco somos demônios. Na realidade, somos uma interessante combinação das duas coisas, como o são também todos os povos do mundo. Que se saiba, nenhum povo já fez o suficiente para merecer o céu, e todos têm créditos no purgatório.

Aparentemente, um dos atributos da condição humana é essa sua simultânea vocação para o bem e para o mal. Se isso é verdade, deve ser tomado como “dado do problema”, isto é, algo que inelutavelmente existe, algo com que temos que viver aqui, no Japão, na Inglaterra, na Holanda, em qualquer país. Não se pode – e nem se deve, pois seria imoral – mudar o caráter das pessoas. Mas pode-se levá-las a mudar de comportamento: as pessoas se comportam de forma diferente de acordo com o sistema ou a ordem social em que estejam inseridas. Um brasileiro em Zurich se comporta – ou procura comportar-se – de acordo com aquilo que ele julga ser a “expectativa de comportamento” local, e que é bem diferente da existente no Brasil.

O surpreendente não deveria ser a corrupção, e sim a surpresa popular diante dela. Corrupção e hipertrofia do setor público são a cara e a coroa de uma mesma moeda

Não podemos e nem devemos mudar o caráter dos brasileiros, mas podemos alterar o seu comportamento. Como? Com a redução do tamanho do setor público; com a atribuição a cada cidadão brasileiro da responsabilidade pelos seus atos, simultaneamente com a liberdade para realizá-los; com a eficácia da justiça. Redução do tamanho do setor público significa, na prática, atribuir ao governo apenas a solução de problemas que os indivíduos, no exercício de seus direitos fundamentais, não possam adequadamente solucionar. E eficácia da justiça significa que as pessoas suspeitas de alguma ilicitude devem ser processadas e, se julgadas culpadas, devem ser punidas.

Isso significa, na prática, a institucionalização do Estado de Direito e da economia de mercado. Significa, na prática, colocar o governo no seu devido lugar, deixando com ele apenas os problemas que os agentes particulares, em suas interações livres e responsáveis, não sejam capazes de solucionar satisfatoriamente. É o que a extinta União Soviética e o Leste Europeu estão tentando agora fazer. É o que fizeram com êxito vários países da franja asiática, o que o Chile fez a partir de 1973 e o que o México está fazendo sob a liderança do Presidente Salinas. Reduzir poderes e tarefas do governo, privatizar, desregulamentar, abrir o setor externo, liberar preços, acabar com privilégios, cartórios e subsídios, reequilibrar as contas públicas, via redução de gastos e não aumento de impostos, disciplinar a oferta monetária, devolver aos cidadãos a sua autonomia individual.

*Embora pareça atual, trata-se o texto do editorial do IL Notícias Nº 11, de outubro de 1992.

Artigo retirado do livro Editoriais Og Leme, editado pelo Instituto Liberal em 2012.

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Og Leme

Og Leme

Og Leme foi um dos fundadores do Instituto Liberal, permanecendo por décadas como lastro intelectual da instituição. Com formação acadêmica em Ciências Sociais, Direito e Economia, chegou a fazer doutorado pela Universidade de Chicago, quando foi aluno de notáveis como Milton Friedman e Frank Knight. Em sua carreira, foi professor da FGV, trabalhou como economista da ONU e participou da Assessoria Econômica do Ministro Roberto Campos. O didatismo e a simplicidade de Og na exposição de ideias atraíam e fascinavam estudantes, intelectuais, empresários, militares, juristas, professores e jornalistas. Faleceu em 2004, aos 81 anos, deixando um imenso legado ao movimento liberal brasileiro.

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