Nostalgia, aqui me tens de regresso
Não desejo ser saudosista. O saudosismo nos enclausura no passado, inflexivelmente, fazendo-nos prisioneiros do que foi vivido e, assim, cega-nos para o horizonte de possibilidades no presente e no futuro.
Evidente que, em certos momentos – e acho que a felicidade é feita de momentos -, calço os sapatos da nostalgia para me lembrar de pessoas, de deleites, de contextos e de circunstâncias. Ai, como era bom…
A vida não é definitiva, por assim dizer. Avançamos em direção ao progresso material, moral e social e, ao mesmo tempo, retrocedemos alguns passos. O desejo é que o “saldo civilizacional” seja positivo na direção do efetivo progresso – para todos.
Em tempos “progressistas”, porém, muitas das aclamadas verdades não passam de mentiras românticas construídas socialmente e que são reverenciadas pelos interesseiros do poder, suportados pela propaganda midiática e mercantil.
É mister ressaltar que progressistas proeminentes de hoje são saudosos e nostálgicos por regimes autoritários que ferem – e matam – os pressupostos democráticos e do Estado de Direito. Similarmente, não me seduz a nostalgia de “tempos melhores”, numa transa promíscua com censura e violência de períodos militares.
Sem cair na tentação nostálgica, mas pela lógica da realidade, aquela que transpira no ar, tenho a nítida sensação de que o elevado grau de otimismo com relação à chegada do novo milênio tem se dissipado, e literalmente de maneira grosseira. Alguns que me seguem dirão que sou um pessimista convicto, talvez cético.
Uns alegam que o “amor venceu”; por outro lado, diria eu que, baseado em fatos e dados, a perversão e o que muitos entendem por “liberdade” – eu por libertinagem exposta – têm se imposto vigorosamente. Dessa forma, perdemos todos.
A escassez de coesão social e o segregacionismo atuais são provas cabais do meu, digamos, pessimismo.
O oceano – nada azul – de platitudes vazias ecoadas por burocratas estatais e por ativistas de todas as ordens, gritando sobre diversidade, inclusão, e justiça social, para ser econômico -, da forma como é imposto, seguramente cria mais desunião do que seguidores de pautas que são, no cerne, importantes para o avanço social.
Tais questões/pautas foram claramente politizadas, e essa ideologia se institucionalizou nos centros de poder, não só no Brasil como também no mundo. Aliás, por aqui, copia-se tudo, em especial, aquilo que é contraproducente para o bem comum.
Sim, sou mais do que cético, na medida em que tenho convicção de que questões tais como diversidade, inclusão e justiça social somente serão forças realizáveis quando, factualmente, forem umbilicalmente conectadas a valores democráticos liberais – de verdade – e que sejam compreendidos e compartilhados pela vasta maioria das pessoas que integram o tecido social.
Isso não acontece por caprichos, e muito menos por decretos, simplesmente é preciso “estar, ser e ser sentido”… Fora disso é retórica vazia! E perniciosa. Pelos ares tupiniquins, inequivocamente, inexistem democracia, Estado de Direito, liberdade – há censura, inclusive prévia -, sobram ativismos baratos e burlescos e uma imensidão de rotundos retrocessos.
Ai, como era bom… Quando, de forma transparente, enxergavam-se homens e mulheres combativos e originais lutando pela defesa desses importantes temas, em vez de muitos que, agora, tomam café, almoçam e jantam com uma única e exclusiva vontade de se opor e guerrear por questões meramente ideológicas.
Um tanto de nostalgia se abateu sobre mim. Aquela que me fazia ver, com nitidez, muito mais laços de compreensão humana mútua, e a peleia comum por instituições verdadeiramente justas e democráticas.
Pois é, eu não tenho a nostalgia reveladora da inequívoca atração por poder, pelo autoritarismo, e pela pura ideologia dos autodenominados “progressistas” de hoje. Penso que adentramos, tristemente, no momento dos passos para trás… Acho que preciso de uma vacina de otimismo para visualizar a saída desse tenebroso momento.