Star Wars e a República brasileira

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Star Wars, criado por George Lucas, é um clássico da cinematografia mundial. Relata bem a jornada do herói: apresenta um desafio, um drama, uma aventura a ser vivida; o personagem aceita esse desafio; passa por diversas provações (forja suas virtudes); aprende com seus erros e, ao voltar para casa, percebe que não é mais o mesmo. Além disso, um ponto secundário, mas que merece nossa atenção: Star Wars mostra diversas estruturas de poder pela galáxia – tiranias, monarquias, aristocracia e democracia. Os Jedi seriam aqueles responsáveis por restaurar a ordem do poder coercitivo em alguns governos locais, quando estes passavam por instabilidades. Com o desenrolar da trilogia, fica claro que que as instituições criadas para defender a República – Senado, chanceler e conselheiros – foram dominadas por pessoas que buscavam interesses absolutistas e que, no momento certo, tomariam o poder para si, em nome de um bem maior (proteção das minorias, defesa da República, maior agilidade para o combate aos traidores).

A jovem república brasileira não possui inimigos intergalácticos, muito menos está envolvida em guerras, mas possui semelhanças com a saga que nos chamam atenção. A primeira semelhança: as instituições não são infalíveis e sempre serão passíveis de crítica. Vale lembrar, por mais óbvio que pareça, que toda instituição é composta por seres humanos e que estes possuem vieses cognitivos, visão distorcida da realidade e, às vezes, um apreço por um pouco de tirania. Não é de hoje que falamos de sistema de freios e contrapesos no Brasil, mas parece que ainda não atualizamos esse sistema, preferindo manter as coisas como estão, afinal “em time que está ganhando não se mexe”. A segunda é: precisamos refletir seriamente sobre a frase: “os fins justificam os meios”. Permitam-me esclarecer o ponto: supondo que eu acredite que estamos lutando contra o fascismo, a favor das instituições e pela “salvação da democracia”, estaria justificada a existência de censura prévia, judiciário parcial, falta de investigação, ausência do devido processo legal? Não estamos invertendo o raciocínio? Direitos são direitos justamente para que, em momentos de crise, possa existir alguma previsibilidade e garantia das regras do jogo (todos são iguais perante a lei, a justiça é cega, todos devem ter o devido processo legal…). Se eu permito que as regras possam mudar, que a justiça deve se posicionar de “forma excepcionalíssima” pois a ocasião é única, logo estou destruindo aquilo que a priori tentei proteger. Na ânsia de defender instituições ou a “democracia” no curto prazo, acabo criando precedentes, instabilidade e insegurança institucional que, no médio/ longo prazo, poderão dilapidar aquilo que busquei proteger.

Sem dúvida, as funções constitucionais de algumas instituições brasileiras merecem uma reflexão mais aprofundada, entretanto, não será “esticando a corda” que a sociedade civil irá conseguir um melhoramento contínuo delas. Quebrar, depredar, invadir é um remédio mais amargo do que a própria doença, pois este terá um efeito rebote forte que, provavelmente, dificultará ainda mais uma solução institucional. O evento que aconteceu em Brasília em janeiro de 2023 não possui nenhuma justificativa e não ajudará, em qualquer ângulo, a construção do país. A disputa presidencial do ano passado, a mais apertada e mais polarizada de nossa história, apresenta duas visões de mundo totalmente diferentes. Até então, uma política mais conciliadora, evitando assuntos polêmicos, era a mais desejada por quem gostaria de ocupar esse cargo. Bolsonaro, todavia, com seu jeito peculiar de abordar os assuntos, responder perguntas e se conectar com o povo, foi uma novidade no cenário da política brasileira. Arrisco dizer que a sua campanha possui algumas vitórias (que serão ofuscados pela baderna da última semana), menos do que esperado por ele, obviamente, mas ainda assim vencedora. Aqui seguem os meus argumentos: ele formou a maior base no Congresso Nacional; formou lideranças com personalidades próprias e que não precisam dele para sobreviver na política, possibilitando uma renovação na política com valores parecidos com o seu; mostrou que possui uma forte capacidade de se comunicar com os seus eleitores, sem intermediários ou canais tradicionais (isso poupa muito dinheiro e favores políticos); resgatou a bandeira brasileira, símbolo nacional, para o debate político (essa outrora usada quase exclusivamente em ano de Copa do Mundo); pautou o debate público por diversas vezes e expôs parte do Deep State brasileiro, mostrando que, mesmo estando dentro dele, o presidente da república pode ser boicotado por órgãos de Estado, quando os mesmos se julgam ameaçados, ou ter parte dos seus poderes tolhidos.

Então, Rothbard estava certo no seu livro Anatomia do Estado, o Estado tende sempre a crescer? É provável, mas aqui ficarei com a metáfora do Império que contra-ataca de Star Wars. Não será fácil retirar o poder das mãos de uma pequena elite política que se acostumou com o poder. O Estado continuará tendo o monopólio da força e querer bater de frente e disputar essa queda de braço é, no mínimo, pura inocência e burrice por parte dos indivíduos que ali estavam.  É necessário possuir uma certa “paciência de Jedi” para enfrentar um inimigo que é mais forte, mais organizado e com mais recursos que você. A paciência faltante nesta última semana por parte de uma minoria, provavelmente, terá um preço caro para uma maioria.

A mensagem da história abordada no filme Star Wars e em nossa república é que, se colocarmos pessoas “certas”, em lugares chaves, em um momento favorável, podemos mudar as regras do jogo ou simplesmente fingir que elas não existem – mas, é claro que existirá uma justificativa encantadora com que qualquer pessoa de bom senso, com um mínimo de espírito republicano, irá concordar, afinal a causa é “nobre”. No final da série clássica de Star Wars, o Império cai e o poder volta a se tornar mais decentralizado entre os seus membros. Enquanto isso, no Brasil, olhamos para os nossos líderes supremos, ministros e presidente (mais fortes do que nunca) sem muita certeza de qual será a nova lei, regra ou norma a ser inventada pelas muitas situações excepcionalíssimas que irão surgir.

*Marcos Chaves Gurgel é engenheiro agrônomo formado pela Universidade Federal do Ceará, economista formado pelo Insper, seguiu a trilha de políticas públicas e é refundador do Insper Liber- entidade focada na defesa da liberdade e no amadurecimento intelectual dos alunos. Atualmente no último ano do curso de Administração – Insper, trainee IFL-SP.

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