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Twitter Files escancara o autoritarismo: a ditadura da toga tem que acabar

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Que o STF e o TSE têm agido de forma abusiva em muitos pontos, já falei incansavelmente. Que a liberdade de expressão está sendo diuturnamente atacada no Brasil, já adverti em n ocasiões. Que a mão inspiradora e atuante na maior parte desses vilipêndios à liberdade é a de Alexandre de Moraes, já está mais do que claro. Que o fato de que é ele o grande protagonista não significa que seja o único censor, e que seus pares com frequência não unem a ele para, de forma corporativista, dar aparente legitimidade aos abusos, já admoestei em outras tantas ocasiões. Em todas essas vezes em que me debrucei sobre um artigo para denunciar o estado de coisas no Brasil de Moraes, creio que fiz mais do que dar minha mera opinião, tratando antes de fatos, sem, contudo, esperar concordância de todos e ciente da teimosia de muitos em seguir relativizando a liberdade de expressão e em ver as “inovações” jurídicas dos últimos tempos como um mal necessário para, segundo eles, “salvar a democracia” (salvar eternamente, é claro). Creio agora, porém, que nem mesmo estes céticos relativistas poderão negar a natureza abusiva, autoritária e mesmo criminosa dessa cruzada contra a “desinformação”.

O jornalista norte-americano, Michael Shellenberger, presidente da Cátedra de Política, Censura e Liberdade de Expressão da Universidade de Austin, no Texas, e um dos editores do chamado “Twitter Files”, acabou de trazer à luz informações muito sérias sobre a atuação do TSE. Antes, uma introdução. O Twitter Files teve início quando Elon Musk, após comprar o Twitter (agora X), repassou informações a jornalistas acerca de remoções de conteúdos por motivações políticas durante a antiga gestão da empresa. Já em se tratando da divulgação dessas informações concernentes à atuação da plataforma no Brasil, Shellenberger deu o nome de Twitter Files — Brazil.

O jornalista afirma categoricamente (e com razão para tal) que “o Brasil está envolvido em um caso de ampla repressão da liberdade de expressão liderada pelo ministro da Suprema Corte Alexandre de Moraes”. O material divulgado demonstra que Moraes e TSE “exigiram ilegalmente que o Twitter revelasse detalhes pessoais sobre usuários do Twitter que usavam hashtags de que ele não gostava; “exigiram acesso aos dados internos do Twitter, em violação à política do Twitter; “procuraram censurar, unilateralmente, postagens no Twitter de integrantes do Congresso brasileiro”; “tentou usar as políticas de moderação de conteúdo do Twitter como arma contra os apoiadores do então presidente @jairbolsonaro.”

As informações divulgadas por Shellenberger dão conta da atuação de Rafael Batista, consultor jurídico do Twitter no Brasil em face das demandas abusivas, não só da corte eleitoral, mas de outros órgãos da justiça brasileira. Ele mesmo chegou a ser alvo de uma investigação: “Em 27 de janeiro de 2021, Batista enviou um e-mail a seus colegas sobre uma investigação policial contra ele por se recusar a fornecer dados pessoais de usuários do Twitter ao MP-SP (Ministério Público do Estado de São Paulo). “O promotor alegou que a ‘atitude do Twitter é isolada, pois todas as outras grandes empresas de tecnologia, como Google, Facebook, Uber, WhatsApp e Instagram, fornecem dados cadastrais e números de telefone sem ordem judicial’. “Mas o Twitter ‘não tem [sic] obrigação afirmativa de coletar dados cadastrais’, explicou Batista ao promotor, e ‘não há número de telefone”. Aqui notamos algo muito importante. Estamos sabendo dessas informações relativas ao X (antigo Twitter) por causa dessa iniciativa jornalística e disposição inicial de Musk, mas, se o mesmo fosse feito com outras plataformas, teríamos uma noção ainda mais profunda da dimensão dos abusos. Google, Facebook, Uber, Whatsapp e Instagram teriam fornecido sem ressalvas os dados cadastrais de seus usuários, mesmo sem ordem judicial e, portanto, sem serem obrigados por lei a fazer isso.

Em agosto de 2021, Batista comentou por meio de e-mail com seus colegas uma decisão do TSE contra “grandes apoiadores do presidente Bolsonaro”, os quais estariam envolvidos em “ataques coordenados contra integrantes do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral”. Sobre a parte que lhes toca, ele completa: “Embora essa obrigação inicialmente não nos atinja, o tribunal também determinou ao Twitter, YouTube, Twitch TV, Instagram e Facebook que: i) se abstenham de sugerir algoritmicamente perfis e vídeos de conteúdo político que desacreditem o sistema eleitoral (legitimidade das eleições) em associação com esses usuários/contas e também ii) identifiquem a origem do conteúdo específico (não fomos notificados com nenhum URL de Tweet específico).” Eram aqui, mais uma vez, as plataformas constrangidas a restringir o alcance, com objetivo não outro que restringir a opinião de quem se manifesta com desconfiança em relação ao sistema eleitoral; como se matéria de crença pudesse ser objeto desse tipo de iniciativa por parte do poder judiciário; como se o cidadão não tivesse o direito de dizer que não confia nas urnas ou coisa que o valha; como se fosse criminoso não crer em algo e manifestar sua descrença.

Dois dias depois, ele tratou de novos disparates: “Batista relatou que ‘parece que o tribunal quer identificar os titulares de contas que teriam adicionado especificamente certos tipos de hashtags de tendência e também reduzir de alguma forma o engajamento de conteúdo específico na plataforma (ou seja, evitar que contas específicas sejam sugeridas a outras)’. “Isso representou uma escalada significativa nos esforços antidemocráticos do tribunal“.

Na mesma toada: “O TSE do Brasil, controlado por Moraes, também exigiu que o Twitter revelasse as identidades dos usuários. Em 25 de outubro de 2021, o consultor jurídico sênior do Twitter, Rafael Batista, enviou um e-mail a seus colegas para informá-los de que o TSE estava ‘nos obrigando a rastrear e desmascarar usuários que usaram hashtags específicas’ “A solicitação do TSE era ilegal, observou Batista, e por isso o Twitter resistiria à ordem do tribunal. Batista disse que o Twitter ‘vai resistir’ porque não havia ‘nenhuma evidência de ilegalidade no uso de hashtags’ e porque o TSE estava exigindo ‘a divulgação em massa e indiscriminada de dados privados de usuários, o que caracteriza uma violação da privacidade e de outros direitos constitucionais‘”

Temos aqui uma clara atuação política de Moraes e da Corte. A vigilância de hashtags é sintoma de monitoramento ideológico, sem tirar nem por. Se isso não fosse grave o suficiente, temos a notícia de que o TSE demandou que informações dos usuários lhes fossem enviadas, tudo pelo grande crime de usar uma hashtag. Felizmente, o Twitter resistiu em termos que vale repetir: “a divulgação em massa e indiscriminada de dados privados de usuários, o que caracteriza uma violação da privacidade e de outros direitos constitucionais”. Alguém talvez ousasse retorquir dizendo que “só o que faltava, uma rede social ensinando direito constitucional a juízes constitucionais”. Se lhe causa espanto esse estado de coisas, não deve ser por uma suposta pretensão da plataforma, mas antes pela ilegalidade dos atos de quem deveria prezar pela constituição, mas são os primeiros a vilipendiá-la. Não só o X, mas qualquer cidadão que preze pela liberdade pode muito bem ensinar a constituição a esses pretensos deuses togados que estão por aí a vigiar hashtags.

Já em 26 de novembro de 2021: “Um tribunal de recursos ordena que o Twitter ‘remova globalmente’, e não apenas no Brasil, ‘URLs específicas relacionadas ao autor’. “O tribunal alegou que os brasileiros poderiam encontrar outras maneiras de ver o conteúdo, como por meio de uma VPN, que mascara a localização do usuário. O tribunal também procurou saber as identidades dos usuários que não estavam no Brasil”. Ora, claro como água potável o objetivo de controle do discurso. Não só o suposto “desinformador” deve ser censurado, mas o cidadão, tal como uma criança cujos pais tentam ocultar conteúdos adultos, deve ser tolhido de todos os meios para acessar o conteúdo “imoral”. Sabemos que essa disposição em tornar todo e qualquer cidadão partícipe e potencial alvo da “cruzada” vai até às últimas consequências, quando Moraes ameaçou não só a suspensão do Telegram, mas todo e qualquer cidadão brasileiro com uma multa horária de R$100 mil caso acessassem o aplicativo por meio de VPN.

Sigamos: “Em março de 2022, o diretor jurídico do Twitter para a América Latina disse que se reuniu com ‘o juiz’, referindo-se a Moraes. Ele disse que ficou surpreso ao encontrar lá a Polícia Federal (FBI do Brasil) e a equipe técnica do tribunal trabalhando na investigação da hashtag.“O TSE pressionou para obter dados privados de usuários sob a justificativa de ‘circunstâncias excepcionais’ e queria usar o Twitter como uma máquina de farejar crimes para ‘antecipar possíveis atividades ilegais’. “Dois meses depois, Gualda disse que a Polícia Federal ‘está sob muita pressão do Tribunal Superior Eleitoral para fornecer resultados tangíveis para essa investigação (lembrando que, nesse procedimento, a Polícia Federal está apoiando uma investigação que é conduzida pelo próprio Tribunal Superior Eleitoral)‘”. Há vários elementos aqui que merecem atenção.

Primeiro, a identificação da pressão sobre a Polícia Federal, o que ajuda a explicar, e muito, a razão pela qual ela tem agido, nos últimos tempos, como uma verdadeira KGB do STF e governo. Depois, temos novamente a pressão pela obtenção de dados privados de usuários, de forma, é claro, ilegal. Logo em seguida, a reiteração da ilegalidade ao falar em “circunstâncias excepcionais”. Ora, se Moraes estivesse seguro da legalidade de seus atos, ele precisaria se reunir com um diretor da plataforma e falar em circunstâncias excepcionais? A excepcionalidade, a inovação ou o que diabos escolham chamar é uma confissão de ilegalidade. Admitem que estão agindo ao arrepio da lei, mas justificam isso contra o fantasma da “desinformação” – e então, como mais uma evidência de abuso e ilegalidade, o Twitter foi convidado a se tornar uma ferramenta (e podemos supor que outras plataformas possam ter aceitado o convite), “uma máquina de farejar crimes para ‘antecipar possíveis atividades ilegais’”. Já escrevi sobre como Moraes pretende ser senhor da história, mas aqui vemos que, em seu desejo de antecipar supostos crimes, ele deseja também ser senhor do futuro. Não é mesmo um Deus encarnado? E claro, para subsidiar esse desejo de fazer sua caneta valer no passado, presente e futuro, a PF é compelida a produzir “resultados tangíveis”, isto é, encontrar crimes para aqueles que já decidiu que são criminosos.

As ações seguiriam no ano seguinte, ainda antes das eleições: ““Antes da eleição presidencial de 2022 no Brasil, o TSE fez exigências de censura para impedir que os cidadãos comentassem sobre políticas e procedimentos eleitorais. “Em 30 de março de 2022, um dia depois da posse de Moraes como presidente do TSE, a corte eleitoral determinou que o Twitter, no prazo de uma semana e sob a ameaça de uma multa diária de R$ 50.000 (U$ 10.000), fornecesse dados sobre as estatísticas de tendências mensais das hashtags “VotoImpressoNão” e #VotoDemocraticoAuditavel “VotoAuditávelDemocrático”. “Além disso, o TSE exigiu informações de assinatura e endereços IP dos usuários que usaram a hashtag #VotoDemocraticoAuditavel em 2021. Os brasileiros queriam debater as impressões para aprimorar suas máquinas de votação exclusivas, mas o TSE não estava satisfeito com a causa e pressionou o Twitter a fornecer seus dados pessoais””.

Ou seja, Moraes iniciou sua cruzada no TSE logo após a posse como presidente da corte. Em uma canetada, sem qualquer razão judicial para tal, determinou, sob ameaça de multa, que o Twitter lhe fornecesse dados, estatísticas e até mesmo tendências mensais de determinadas hashtags. Efetivamente, usou seu cargo e a coação para fins de monitoramento ideológico. Mais que isso, demandou até os IPs de usuários, vulgo cidadãos, que haviam usado uma hashtag em defesa do que chamavam de voto auditável. É lícito que cidadãos debatam livremente alterações legislativas que lhes pareçam pertinentes e que levantem quantas hashtags quiserem para este fim, sem que sejam tratados como bandidos, ou “bandidos em potencial” e/ou que sejam monitorados, tendo sua privacidade violada por quem faz uso abusivo da toga e espúrio dos recursos públicos arrancados desses mesmos cidadãos. A todos assiste também o direito de criticar essa ou qualquer outra proposta, mas não é licito (literalmente, não é) que um juiz deixe suas convicções pessoais dominarem suas decisões e tente defenestrar do debate públicos cidadãos pacíficos.

Também naquela época já era rotineira a derrubada de perfis de personalidades públicas simpáticas ao antigo governo: “Em um e-mail enviado em novembro de 2022, um advogado do Twitter detalhou as ações tomadas por Moraes e pelo TSE durante a corrida presidencial. O juiz não explicou por que ordenou que o Twitter removesse a conta do pastor evangélico André Valadão (@andrevaladao) sob pena de multa pesada. “O Twitter ‘entrou com um recurso contra a ordem’, apontando que não sabia por que estava sendo ordenado a fazer isso, mas estava cumprindo. O TSE ameaçaria o Twitter a cumprir a ordem ‘em uma hora’ sob uma multa horária de R$ 100 mil [U$ 20.000] para censurar uma conta inativa por desinformação cometida em outro lugar.” Ainda que ilegais, a empresa era compelida a cumprir a decisão sob pena de multa.

Como sabemos, nem aqueles eleitos pelo povo, ainda que com mandato ativo, escapam da cruzada: “O TSE também teve como alvo os integrantes eleitos da Câmara Carla Zambelli (PL-SP) (@Zambelli2210) e Marcel van Hattem (Novo-RS) (@marcelvanhattem) por suposta desinformação, ameaçando com uma multa de R$ 150 mil (US$ 30.000) se o Twitter não cumprisse a decisão em uma hora. O Twitter reagiu. Entre outras objeções, argumentou que ‘não há razão para que este processo esteja sob sigilo judicial’”. Derrubar contas de parlamentares é coisa defensável só para quem ainda não se graduou nem na pré-escola da democracia. É uma contradição em termos que um TSE, tão zeloso na retórica em defesa da democracia e das eleições, espezinhe dessa forma os mandatários e, por consequência, seus eleitores. Inventem a artimanha que quiserem para justificar seus desmandos, mas não venham com essa conversa fiada de que respeitam o voto popular. Se, ao dar o voto para aqueles que agiram como procuradores de sua vontade, o cidadão não pode por meio deles ter voz, então tampouco seu voto tem importância; mas há os que pensam que é defender as urnas eletrônicas ou atacá-las o que diferencia democratas de não democratas. Democratas não silenciam cidadãos e seus representantes, ponto.

A obsessão pelas hashtags continua: “Em 17 de agosto de 2022, um integrante da equipe jurídica do Twitter enviou um e-mail aos grupos dizendo que o Twitter ‘recebeu uma nova ordem judicial’ relacionada a ‘uma investigação com o objetivo de identificar indivíduos/grupos por trás de uma possível coordenação de esforços para atacar as instituições e o sistema eleitoral em diferentes plataformas. O próprio presidente Bolsonaro é investigado nesse processo…’. “Ela acrescentou: ‘Recebemos várias solicitações incomuns provenientes dessa investigação, a mais recente e relevante nos obrigando a fornecer uma quantidade indeterminada de dados de usuários com base em menções de hashtags. As hashtags dizem respeito a uma mobilização em torno das eleições –traduzidas aproximadamente como #VotoImpressoNão; #VotoDemocráticoAuditável e #BarrosoNaCadeia –Barroso é o ex-presidente do TSE….. De acordo com o relatório que temos atualmente, houve 182 tweets no período de interesse… Precisamos do conteúdo, dos identificadores de usuário e dos respectivos dados do BSI o mais rápido possível…‘”.  Novamente, o simples ato de usar uma hashtag é tratado como criminoso. Como uma hashtag pode ser criminosa? Ora, o dia em que o cidadão não puder mais dizer que gostaria de ver fulano ou beltrano, especialmente fulano ou beltrano que fazem política e assumem o ônus (sejam políticos de fato ou ministros do STF e TSE) presos, é o dia em que o orçamento para presídios será superior ao da saúde.

Mesmo protestando contra as ilegalidades, o Twitter se viu obrigado a cumprir as demandas: “Apesar do fato de que a publicação de hashtags não viola nenhum estatuto legal específico, o Twitter cumpriu as exigências do tribunal para evitar multas substanciais. “A corte superior do Brasil e o Twitter removeram o discurso político e penalizaram os usuários por debaterem políticas. Dessa forma, o tribunal parece ter interferido em uma eleição presidencial importante.” Faz sentido pensar que teriam o poder de arrancar a aquiescência com qualquer outra plataforma, de modo que ninguém está seguro.

De forma muito sagaz, Shellenberger enxerga também nas ações do TSE uma tentativa de criminalização do discurso: “A censura do TSE é um ataque ao processo democrático. As eleições só podem permanecer livres e justas se o público puder debater e questionar as leis, os sistemas e os resultados eleitorais. Se algum dia houver fraude eleitoral no Brasil, ninguém poderá falar sobre isso, se Moraes conseguir o que quer. “Durante séculos, os candidatos reclamaram que a eleição foi roubada. Hillary Clinton alegou isso em 2016, Stacey Abrams alegou isso em 2018, o presidente Donald Trump alegou isso em 2020 e o presidente Jair Bolsonaro alegou isso em 2022. “Moraes quer tornar esse discurso ilegal e punir plataformas de mídia social que não o censuram.”

Aqui, muitos podem protestar arguindo que o questionamento do resultado foi ridículo em todos os casos. Concordo, mas do ridículo para o crime há uma distância enorme e, se os candidatos e cidadãos não podem questionar o próprio processo eleitoral, por mais equivocados que estejam, isso só concorrerá para minar ainda mais a confiança de setores da sociedade no sistema eleitoral. Quando Moraes decide banir o Monark das redes sociais por veicular questionamentos contra o TSE, ele realmente pensa que colabora para aumentar a credibilidade da corte eleitoral? Pensam estes “editores da sociedade” que aquele que já nutre desconfianças com, digamos, as urnas, confiará mais depois dessas perseguições a personalidades públicas e a monstros como as hashtags? Uma corte que promove tratamento tão desproporcional a candidatos, como fez nas últimas eleições, não tem condições de esperar respeito.

Embora isso não seja tratado diretamente nos tweets de Shellenberger, convém lembrar que o TSE inaugurou há pouco um monstrengo chamado Centro Integrado de Enfrentamento à Desinformação e Defesa da Democracia (CIEDDE), que, na prática, já está funcionando como um ministério da Verdade. Podemos estar certos de que todo o modus operandi autoritário, censor e ilegal revelado pelo Twitter Files – Brazil, muito longe de ser a exceção, será a regra, e que Moraes já tem em suas mãos a ferramenta que desejava para dizer o que pode ou não ser dito, que perfil deve ser derrubado, quem deve ser perseguido etc. Como o Congresso, apesar das pressões, não aprovou (por ora, ao menos) o PL da Censura, estes grandes “democratas” criaram ao arrepio da lei o que queriam e já podem derrubar conteúdos por decisões de ofício — outra “exceção” criada nas últimas eleições e já normalizada. E quem decide o que é verdade ou não? Os deuses encarnados, é claro.

Não desejo me limitar aqui a simplesmente reverberar essas informações e deixar o leitor em um estado apático, ainda que indignado. O Twitter Files – Brazil, em minha visão, não deixou pedra sobre pedra e escancarou um modus operandi próprio de ditaduras. Não por acaso, Michael Shellenberger afirmou que Moraes “está fazendo coisas como ditador”. Nesse cenário, não vejo exagero em falar, e não falo como provocação, que estamos sob uma verdadeira ditadura togada. Algo precisa ser feito.

Já me manifestei em várias ocasiões defendendo o impeachment de Moraes, e mesmo de outros ministros da corte, como Barroso. Sei, é claro, que isso é algo muito distante, mas não posso deixar de reforçar, por princípio, que isso é o que deveria ocorrer. Razões para isso abundam, sendo estas novas revelações um capítulo a mais. Se um abuso de autoridade tão claro e escancarado segue ignorado pelo Congresso, que lição está sendo dada ao espírito público de autoridades de todos os escalões que também dispõem de ferramentas para abusar de seu poder? Se um ministro da suprema corte do país pode comandar esse tipo de inquisição e sair impune, que segurança tem o cidadão de que amanhã não será ele a vítima de abusos tão ou ainda mais mesquinhos?

Contudo, uma medida muito mais profunda para resguardar a liberdade de expressão e proteger o cidadão de novas perseguições futuras foi sugerida pelos acadêmicos de direito Hugo Freitas e André Marsiglia e encorajada por Shellenberger: “O projeto de lei busca proclamar uma Declaração dos Direitos de Liberdade de Expressão no Brasil, que, se promulgada, alinharia a legislação brasileira à dos Estados Unidos nesse aspecto. “Ele propõe a revogação da criminalização do discurso em todos os casos, exceto os mais extremos, como ameaças verdadeiras ou incitação a ações ilegais iminentes. Em contrapartida, condutas como blasfêmia, desrespeito à autoridade ou certas formas de discurso de ódio e desinformação deixariam de ser criminalizadas. A proteção do discurso político é especialmente enfatizada. “Em casos de delito, o projeto de lei busca reduzir a discricionariedade judicial, estabelecendo padrões mais claros para avaliar se o discurso é protegido ou se está relacionado a uma conduta ilegal. Em particular, o projeto de lei revoga as disposições que têm sido usadas por promotores e associações privadas para retaliar o discurso, reivindicando indenizações compensatórias, sob alegações como a de que ele causou ofensa a um número desconhecido de ouvintes ou manchou a reputação de amplas categorias de pessoas. Por fim, o projeto de lei se preocupa com formas mais modernas de censura direcionadas à Internet. Uma proibição geral é imposta à prática, agora frequente no Brasil, de o governo bloquear o acesso a contas específicas de mídia social em resposta a discursos. Formas mais sutis de censura na Internet também são abordadas. O governo é impedido de censurar o discurso indiretamente sob o pretexto de moderação de conteúdo por plataformas privadas, seguindo os passos de decisões judiciais recentes nos EUA. O projeto de lei reafirma as disposições já existentes na legislação brasileira que isentam as plataformas de mídia social de responsabilidade pelo discurso de seus usuários em resposta às tentativas do governo de revogar essas disposições para forçar as empresas de mídia social a censurar preventivamente de acordo com os desejos do governo.”

Mais do que buscar apenas uma reparação para os abusos e consequências para os abusadores, precisamos de movimentos legislativos no sentido de fortalecer e aumentar o escopo da liberdade de expressão no Brasil, de modo que sou bastante simpático à proposta de Hugo Freitas e André Marsiglia.

Agora, inserir um artigo análogo à primeira emenda americana em nossa constituição não é panaceia contra os abusos. Se grande parte do problema é o fato de que eles já estão habituados a ignorar o que está na carta constitucional, ou a interpretá-la de forma esdrúxula, nada garante que não farão o mesmo diante de novos marcos constitucionais. Por isso, não podemos depender apenas da prevenção e precisamos punir os responsáveis por esse modus operandi criminoso. Não tenho dúvidas de que o que foi revelado é meritório de uma investigação criminal, mas, sendo os perpetradores membros de tribunais superiores, bem como os próprios tribunais, estando a PF amedrontada e tendo ainda uma PGR conivente, nada podemos esperar nesse sentido. Então, o único foco de consequências, se ocorrerem, é o Congresso. Os elementos para a abertura da CPI do Abuso de Autoridade já eram extensos, mas, agora, deixar de abrir essa necessária CPI é conivência e prevaricação. A ditadura da toga tem que acabar.

Fontes:

https://www.poder360.com.br/internacional/twitter-files-falam-sobre-limites-a-liberdade-de-expressao-no-brasil/

https://www.poder360.com.br/justica/moraes-proibe-uso-de-vpn-para-acessar-telegram-em-caso-de-suspensao/#:~:text=O%20ministro%20afirma%20que%20%E2%80%9Cpessoas,%C3%A9%20uma%20refer%C3%AAncia%20ao%20recurso.

https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2024/Marco/presidente-do-tse-inaugura-centro-integrado-de-combate-a-desinformacao

https://revistaoeste.com/politica/alexandre-de-moraes-age-como-ditador-diz-jornalista-norte-americano-que-lancou-luz-sobre-o-twitter-files-no-brasil/#:~:text=O%20jornalista%20Michael%20Shellenberger%20disse,entrevista%20ao%20Oeste%20Sem%20Filtro

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Gabriel Wilhelms

Gabriel Wilhelms

Graduado em Música e Economia, atua como articulista político nas horas vagas. Atuou como colunista do Jornal em Foco de 2017 a meados de 2019. Colunista do Instituto Liberal desde agosto de 2019.

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