Sobre a espionagem americana
MARIO GUERREIRO*
Basta mencionar a palavra “espionagem”, para a maioria das pessoas pensar logo em espionagem de um governo em relação a outro e em espiões como o famoso Agente 007, James Bond. De fato, esta personagem dos romances de Ian Fleming, levado para o cinema, era um espião do British Secret Service em serviço de Sua Majestade.
Neste caso, temos o equivalente americano que é a CIA (Central Intelligence Agency) em que “intelligence”, neste contexto, não significa “inteligência”, mas sim “informação”. A versão brasileira era o SNI (Serviço Nacional de Informação), órgão governamental extinto e substituído pela ABIN (Agência Brasileira de Informação).
Todos esses órgãos estão ligados à questão da segurança nacional, um tópico tipicamente militar. Desde que existem nações, há esse tipo de espionagem, principalmente em tempos de guerra.
Mas há outros tipos de espionagem, como a industrial e a comercial. Estas tanto podem ser de natureza estatal como de natureza privada. Neste caso, não está em jogo a segurança nacional, mas sim o desejo de obter informações relevantes sobre as atividades de competidores no mercado.
Tanto a espionagem comercial como a industrial cresceram muito nesta Era da Globalização em que o conhecimento e a agilidade nas decisões empresariais passaram a ser ativos muito mais importantes no comércio e na indústria.
Antigamente, o maior comia o menor. Hoje o mais rápido e mais bem informado come o mais lento e menos informado.
No começo de julho de 2013, provocou um alvoroço no mundo a denúncia de um ex-agente de uma agência de informação americana de que os EEUU estavam espionando muitos países, entre eles o Brasil. Qual a novidade?
Logo após a derrubada das Torres Gêmeas, George W. Bush meteu a cara na TV e fez uma solene declaração: We are at war!. Ao que perguntei imediatamente para mim mesmo: Against whom?. Só podia ser contra um terrível inimigo invisível: o terrorismo muçulmano. Mas como combater um inimigo que não se deixa ver? Ora, somente com medidas preventivas.
Logo em seguida Bush baixou um decreto chamado Patriotic Act, segundo o qual a CIA e outras agências governamentais tinham o direito de espionar qualquer cidadão americano ou estrangeiro nos EEUU suspeito de estar tramando atividades terroristas. A mera suspeição era motivo de uma invasão da privacidade mediante grampeamento de telefone, fiscalização de e-mails na Internet, etc.
Imediatamente, tanto nos EEUU como entre nós, foram travados debates entre “conservadores” e “liberais” [não na acepção rigorosa desses termos, mas num sentido lato próximo ao do popular]. Alguns “liberais” alegavam que se tratava de uma injustificável invasão da esfera privada e temiam que o Estado se tornasse o famigerado Big Brother, personagem imortal de George Orwell, com seu abominável refrão: Take care, Big Brother is watching!
Mas alguns “conservadores” observaram que diante de uma ameaça real à segurança nacional – coisa que se fortaleceu com o recente atentado na Maratona de Boston – o Estado tinha o dever de tomar medidas, ainda que duras e amargas, no sentido de proteger a vida e o patrimônio dos cidadãos. Esta é uma das funções próprias do Estado, não a de ser banqueiro nem empresário.
Confesso que me encontro ainda diante de uma questão indecidível, pois parece haver um conflito de dois importantes valores: a segurança nacional e a preservação da privacidade individual. Como manter a vigência de um deles sem sacrificar a de outro?
*DOUTOR EM FILOSOFIA PELA UFRJ
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