RODRIGO CONSTANTINO *
O governo americano espiona, e isso vazou. O governo francês espiona, e isso também vazou. No entanto, o grau de revolta que um gera é infinitamente maior do que o outro. Por que? Talvez Raymond Aron, sociólogo francês, tenha a resposta. Em seu clássico “The Opium of the Intellectuals”, ele tenta explicar o motivo de tanta revolta com os Estados Unidos, especialmente por parte dos intelectuais europeus, e mais ainda dos franceses. Em tradução livre:
Como poderíamos esperar que os europeus perdoassem aqueles que se beneficiaram com as consequências de suas loucuras – se se pode considerar uma posição de hegemonia como invejável? Mesmo que os americanos estivessem acima de qualquer suspeita, os europeus achariam difícil não se ressentir com um sucesso que foi a contrapartida do seu próprio declínio. Felizmente, os americanos não são irrepreensíveis.
[…]
O homem da rua é muito propenso ao ressentimento contra o todo-poderoso aliado, muito propenso a amargura decorrente da fraqueza nacional, a nostalgia da glória do passado e a esperança de um futuro diferente e melhor. Mas os intelectuais deveriam conter essas emoções populares, deveriam mostrar as razões inescapáveis para a solidariedade permanente e a interdependência. Em vez de cumprir o papel de guias, eles preferem, especialmente na França, trair a sua missão, para incentivar os sentimentos das massas ignorantes aduzindo justificativas hipócritas para eles. Na verdade, sua briga com os Estados Unidos é uma forma de racionalizar a sua própria culpa.
[…]
Os Estados Unidos são representados como a encarnação de tudo que é mais detestado, e, em seguida, todo o ressentimento e ódio e fel que se acumula nos corações das pessoas em um momento de dificuldades é descarregado sobre esta figura simbólica.
Que ninguém venha, por favor, dizer que estou afirmando que não se pode criticar os erros dos americanos. Eles existem, em grande quantidade, e devem ser apontados. Mas o ponto aqui é outro. É apenas mostrar como há uma revolta bastante seletiva, que inexoravelmente julga com muito mais rigor tudo que vem de lá. O ressentimento parece uma boa explicação para essa postura…
PS: Tenho outros artigos sobre esse antiamericanismo e suas potenciais causas, como
esse.
* PRESIDENTE DO INSTITUTO LIBERAL