Quais são os direitos mais importantes? – A resposta da Suprema Corte americana

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Atualmente, observamos uma crescente tendência de elevar desejos e aspirações individuais aos patamares de direitos fundamentais. Essa evolução da sociedade e das mentalidades levanta a intrigante questão sobre se existem direitos mais essenciais do que outros.

Os direitos fundamentais, também conhecidos como direitos humanos, são os alicerces preciosos que conferem liberdades inalienáveis e garantias essenciais a todas as pessoas, independentemente de sua origem, raça, gênero ou crença. Abrangem desde as liberdades individuais mais sutis, como a expressão, até os direitos mais enraizados, como a vida e a saúde.

A relação entre direitos e obrigações é um pilar fundamental do sistema jurídico moderno. Como sustentado na teoria jurídica de Kant, a garantia dos direitos individuais é essencial para a promoção da dignidade humana e da justiça social. No entanto, essa concessão de direitos não é unilateral, trazendo intrinsecamente consigo a contrapartida de obrigações a serem cumpridas por outros sujeitos. Nesse contexto, se entende a completa inseparabilidade entre direitos e obrigações.

O jusfilósofo americano Ronald Dworkin argumenta que os direitos são expressões das liberdades individuais que merecem proteção e respeito. No entanto, essa proteção não pode ocorrer à custa dos direitos alheios. Segundo ele, cada indivíduo é destinatário de direitos e deve ser considerado como titular de obrigações correspondentes, a fim de manter o equilíbrio entre as diversas partes envolvidas. Dworkin enfatiza a noção de que os direitos não são ilimitados, mas sim limitados pelas obrigações que surgem das interações sociais e da convivência.

No Brasil, é absolutamente majoritário dentro do direito, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, o entendimento de que não há hierarquia entre os direitos fundamentais e, portanto, havendo conflito ou colisão entre eles, a solução é a aplicação do princípio da concordância prática ou da harmonização.

Em resumo: no caso de conflito entre direitos fundamentais, cabe ao Estado, representado na figura do magistrado, decidir qual direito fundamental se sobrepõe de modo a harmonizar o problema enfrentado.

Existem diversos casos clássicos na doutrina de colisão de direitos fundamentais, como, por exemplo, o direito à informação que muitas vezes está em conflito com o direito à intimidade, como em casos em que se descobrem escândalos de políticos e líderes públicos.

Como, em nosso ordenamento, todos os direitos fundamentais são de igual importância, qualquer conflito de direitos acaba sendo questão de discussão nos tribunais, muitas vezes subindo até o Supremo Tribunal Federal.

A posição acerca da não existência de hierarquia nos direitos, apesar de majoritária no Brasil, não é unânime em todo mundo, havendo sistemas jurídicos complexos e democráticos que fazem algum tipo de hierarquização entre as normas e os direitos fundamentais. Um dos mais interessantes a serem estudados é o sistema americano.

O princípio do devido processo legal, contido nas Emendas Quinta e Décima Quarta da Constituição dos Estados Unidos, possui duas formas: procedimental e substantiva. A versão substantiva, em foco, permite que o Poder Judiciário examine a razoabilidade dos atos que afetem os Direitos Fundamentais, indo além dos procedimentos empregados. Isso implica a avaliação da correlação entre os objetivos do Estado e os meios adotados para restringir tais direitos.

O teste da razoabilidade é utilizado para avaliar a constitucionalidade dessas restrições. Ele se desdobra em duas etapas principais:

  1. Avaliação do Direito Fundamental:
  • Determina se um Direito Fundamental está sendo restringido e se ele é tutelado pelo devido processo legal.
  • Verifica se a restrição é realizada por um agente estatal e determina o grau de privação do Direito Fundamental.
  1. Exame do Fim e Meio:
  • Analisa a legitimidade e realidade do objetivo perseguido pelo Estado.
  • Verifica a relação causal entre o objetivo e o meio adotado.
  • Avalia se existem alternativas menos intrusivas para atingir o objetivo.
  • Pondera se o peso do objetivo justifica a restrição do Direito Fundamental.

Em resumo, a Suprema Corte americana está criando uma hierarquia de direitos. O princípio do devido processo legal substantivo nos Estados Unidos permite que o Judiciário avalie a razoabilidade das restrições a direitos fundamentais por meio de um teste de razoabilidade, que analisa tanto os objetivos do Estado quanto os meios utilizados para alcançá-los, com diferentes padrões baseados na natureza do direito envolvido.

A compreensão da Suprema Corte sobre o devido processo legal substantivo está alinhada com a perspectiva do Estado liberal. A Corte adota uma visão restritiva em relação a regulamentações econômicas e sociais que interfiram na liberdade contratual e na propriedade. Ao longo da história americana, por exemplo, no período do New Deal, muitas leis e atos administrativos que limitavam essas liberdades foram consideradas inconstitucionais por serem considerados irrazoáveis, de acordo com o devido processo legal substantivo.

O “teste do perigo claro e iminente” foi articulado pelos juízes Oliver Holmes e Louis Brandeis nos votos dissidentes. Esse teste se somava ao teste da mera razoabilidade e se aplicava às liberdades da Primeira Emenda. Exigia-se então um grau maior de dificuldade para cercear essas liberdades. Isso representou um privilégio para esses direitos, pois o cerceamento exigia a presença de um perigo claro e iminente, enquanto, para outros direitos fundamentais não econômicos, bastava uma razão qualquer para o cerceamento.

A seleção dos direitos para incorporação seletiva era baseada na resposta a perguntas como:

O Estado violou um princípio fundamental de liberdade e justiça?

A recusa desse direito seria uma recusa ao devido processo legal?

Dessa maneira, a Suprema Corte americana dá maior importância aos direitos liberais de primeira geração: vida, liberdade, saúde e propriedade.

Sem vida, não haveria o que o direito tutelar; sem liberdade, não se poderia discutir ou defender a existência de outros direitos, e, sem propriedade, não haveria o que o Direito defender ou regular.

*Pedro Henrique Engler Urso, graduando em Direito na Universidade Presbiteriana Mackenzie, Comércio Exterior no Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e pós-graduando em Direito Econômico da União Europeia pela Universidade de Coimbra (Portugal).

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