Privacidade: um direito fora de moda
BERNARDO SANTORO*
Hoje o Brasil foi surpreendido com a notícia de que o Tribunal Superior Eleitoral decidiu entregar dados pessoais de 141 milhões de brasileiros, de maneira gratuita, para o Serasa, sem justificativa minimamente razoável. Isso se dá em um momento que o mundo inteiro está discutindo o vazamento de dados feito pelo ex-espião americano Edward Snowden, que comprovou a espionagem do governo americano sobre vários outros países.
Já não há mais como os governos argumentarem que se tratam apenas de meta-dados, ou seja, dados que falam sobre dados sem adentrar na privacidade das pessoas. O jornalista que revelou os dados de Snowden alega ter uma carta onde o embaixador americano no Brasil comemora os frutos da espionagem americana em um acordo comercial com o governo brasileiro. Além disso, há muito tempo o site Wikileaks vem denunciando e apresentando documentos que comprovam espionagem americana com fins comerciais.
Em outro artigo, mencionei que era muita hipocrisia da parte do governo brasileiro querer criticar o governo americano por fazer algo que ele próprio, governo brasileiro, faz. E agora se comprova que faz pior, ou seja, não só usa os dados para si mesmo, mas também o repassa para empresas, coisa que até o momento desconheço que o governo americano tenha feito.
Deve se destacar que essas informações possuem forte valor econômico, portanto, independentemente se é ou não é ético o governo entregar dados dos cidadãos para qualquer um, o conjunto dessas informações pode ser caracterizado como bem público móvel, e como tal, para ser doado (que foi o que ocorreu no caso em tela), deve respeitar a Lei no 8.666/93, que dispõe, no seu art. 17, II, “a”, que doações de bens públicos móveis só podem ocorrer para fins de interesse social, após avaliação de sua oportunidade e conveniência socioeconômica.
Estou curioso para ler a justificativa do parecerista do TSE que permitiu essa doação. Onde será que ele viu interesse público nessa operação?
Com isso, se chega à conclusão de que os governos no mundo inteiro, especialmente o brasileiro, se encontram com extrema inveja do governo americano, por esse ter maior tecnologia de xeretagem que os outros. A famosa frase de Benjamin Franklin, onde ele diz que “aqueles que abrem mão da liberdade essencial por um pouco de segurança temporária não merecem nem liberdade nem segurança”, nunca esteve tão em voga.
Imaginem só a quantidade de informação que o governo brasileiro venderia se tivesse a tecnologia americana de espionagem? Arrisco dizer que o Eike Batista saberia até o que eu jantei ontem.
E, infelizmente, com o aumento da tecnologia, esse processo tende a piorar cada vez mais.
*DIRETOR DO INSTITUTO LIBERAL