O retrocesso do Estatuto da Juventude
BERNARDO SANTORO *
Foi aprovada na Câmara ontem, e seguirá para sanção presidencial, o projeto de lei conhecido como “Estatuto da Juventude”, que “regula direitos dos jovens”. Essa é mais uma tentativa do governo de criar estamentos sociais com privilégios específicos, o que, no longo prazo, cria na sociedade pequenos conflitos artificiais de classe, jogando assim uma parte da sociedade brasileira contra a outra, em uma eterna corrida para ver quem consegue se organizar melhor politicamente para se regozijar de benesses estatais.
Fazendo uma crítica mais profunda ao Estatuto, logo no primeiro artigo observa-se que a lei entende ser o jovem, no Brasil, pessoa entre 15 e 29 anos, o que é um parâmetro absolutamente aleatório, além ocorrer uma sobreposição com o Estatuto da Criança e do Adolescente entre as idades de 15 e 18 anos. O direito brasileiro, portanto, não sabe se uma pessoa nessa idade é um adolescente ou um jovem adulto, e essa confusão não é uma novidade. A verdade é que o direito brasileiro não consegue uniformizar o conceito de adolescentes e jovens adultos nem para a promoção de direitos, como é o caso, e nem para a aplicação de deveres, visto que jovens de 16 anos possuem pleno direito de sufrágio ativo, mas são relativamente incapazes do ponto de vista civil e inimputáveis do ponto de vista penal. Em suma, uma grande bagunça.
Os artigos seguintes são um apanhado de direitos pouco concretos com muita linguagem socialista, e alguns devem ser destacados:
(i) o art. 15 diferencia jovens a partir da raça, garantindo políticas racistas estatais de ação afirmativa;
(ii) valoriza parcerias com associações religiosas para fins de ensino sobre sexo e consumo de drogas, o que atenta contra o estado laico;
(iii) ao mesmo tempo, cria um “direito à sexualidade”, criando para o Estado o dever de ensino sexual “respeitando a diversidade”, o que não é uma função estatal;
(iv) cria “direito à educação superior”, algo que nem a Constituição garante, pois o legislador originário entendia melhor o conceito de limites orçamentários;
(v) concede o bizarro passe livre a estudantes de todos os níveis, onde jovens de boa condição financeira passarão a ter seu transporte custeado pelo imposto pago pelos pobres brasileiros;
(vi) concede meia passagem para todos os jovens que não sejam estudantes, apenas pelo fato de serem jovens, fardo este que também será pago por pobres economicamente ativos entre 30 e 60 anos;
(vii) cria um monte de novos órgãos em defesa da juventude, como se o Estado brasileiro já não estivesse inchado o suficiente;
(viii) assegura aos jovens meia-entrada em eventos culturais e esportivos, independentemente da sua condição ou não de estudante, fazendo caridade e populismo com o dinheiro do setor privado, o que é algo de praxe dos governos;
(ix) cria uma série de procedimentos de garantia de direitos difusos do jovem a cargo do Ministério Público, o que infantiliza o jovem e aumenta o poder do Estado sobre o setor privado; além de
(x) reforçar o poder da UNE, UBES e outras entidades estudantis cooptadas por movimentos esquerdistas de expedir carteiras estudantis, o que, na prática, incentiva a sociedade a financiar essas entidades de caráter duvidoso.
A verdade é que o Estatuto da Juventude é mais um grande retrocesso, pois não inova na proteção de direitos individuais e cria uma série de novas intervenções estatais na sociedade, sem se preocupar com os custos ou a moralidade dos “direitos sociais” que cria.
Não podemos desconsiderar que a juventude, dado o seu romantismo e inexperiência, é um grande mercado consumidor de políticos de esquerda, e como os maiores pagadores de impostos do Brasil são os pobres e a classe média baixa, no final quem vai bancar a farra de “direitos” dos jovens eleitores petistas é justamente quem não pode arcar com ela.
* DIRETOR DO INSTITUTO LIBERAL