O governo é o seu vizinho

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ROBERTO RACHEWSKY *

Em qual momento o governo deixa de ser apenas um punhado de pessoas como nós e passa a ser um organismo impessoal, autômato e mutante?

Leis estúpidas são feitas pelo governo? Não. São inventadas por algum estúpido qualquer, com nome, sobrenome, estado civil, nacionalidade, naturalidade, endereço, CEP, RG e CPF.

Carimbos, licenças e alvarás são exigidos pelo governo? Não. São exigidos por gente que frequenta o clube, a igreja, o estádio, o teatro, o supermercado, o restaurante como a gente. Às vezes com a gente. E que obedece e aplica, quando não inventa por si, as leis estúpidas que outros estúpidos inventaram. Hanna Arendt expôs a banalização do mal, colocando os malvados na porta ao lado das nossas, quando não, atrás das nossas próprias portas.

Falar em governo sem falar em fulano, ciclano e beltrano, nossos vizinhos, amigos ou parentes, é segurar a cortina que despersonaliza a ação daquele conhecido, estúpido, que atenta contra os nossos direitos individuais com a mesma naturalidade que escova os dentes, toma café, vai ao toalete, lê os mesmos jornais que lemos, toma os mesmos elevadores que tomamos e sai por aí, de cabeça erguida porque afinal, ele faz parte, segue ordens, alegada e supostamente, tratando de um, também indistinguível, bem comum.

Amigo estúpido, se você é um desses, trate de olhar para o chão quando cruzar comigo no elevador da próxima vez. Saiba que você não é um herói, mas um cúmplice que banaliza o mal e atenta contra a vida, a liberdade e a propriedade das pessoas, como se estivesse chupando um picolé e jogando o pauzinho no chão.

Mas há, nesse organismo chamado governo, gente boa também, que muitas vezes se cala, se intimida e finge que não vê que o mal está alí, em carne e osso, como nós mesmos fazemos.

Preservar os direitos individuais só é possível apontando as responsabilidades individuais.

Quando deixamos de tratar as ações pessoais, resultado de uma iniciativa individual clara e definida, estamos colaborando na formação dessa entidade coletiva com deveres e responsabilidades difusas.

É nesse ponto que o mal prevalece e passamos, todos nós, a sancionar nossos algozes, dando-lhes a oportunidade de olhar nos nossos olhos sem culpas.

É nessa hora que passamos, nós, a olhar para o chão, cheios de culpa perante a nossa própria consciência.

Não existe o governo, existe um punhado de pessoas comuns que precisam ser desmascaradas, uma a uma, para que caiam em si e sintam, em suas próprias bocas, o gosto amargo da maldade quando praticam, em nome de um intangível interesse público, em prol de um falso e inatingível bem-estar comum, um atentado contra a liberdade, contra a propriedade, contra a felicidade, enfim, contra a vida de alguém.

* EMPRESÁRIO

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