Mesmo sem rede, Morena da Selva continua pescando
MARIO GUERREIRO*
Após o TSE ter rejeitado a Rede Sustentabilidade, Morena da Selva fez uma reunião com seus correligionários, para decidir o que fazer.
Morena tinha, ao que tudo indica, duas opções: tentar registrar seu partido na próxima oportunidade e aí então lançar sua candidatura em 2018. Ou filiar-se a outro partido que a aceitasse como candidata.
Se ela optasse pela primeira alternativa, correria o sério risco de perder grande parte de seu eleitorado de cerca de 20 milhões de votos conquistados na eleição passada.
Mas se ela procurasse a filiação a outro partido, perderia o nome da Rede como símbolo de uma “nova maneira de fazer política”, algo intensamente desejado por seus seguidores e por grande parte de um eleitorado desencantado com as velhas lideranças e desejoso de algo novo.
Após muita discussão em seu grupo e após pesar as duas opções, Morena decidiu filiar-se ao PSB fundado, em seu retorno do exílio, por um “usineiro comunista” cassado em 1964: Miguel Arraes.
Como sabemos, o PSB já possuía um candidato: o atual Governador de Pernambuco, Eduardo Campos.
Na reunião que selou a aliança entre ele e ela, ambos tiveram o cuidado de dizer que, embora tivesse sido feita a chapa, só diriam quem era o candidato a Presidente e quem era o vice em 2014.
De acordo com as pesquisas, Eduardo Campos – nenhum parentesco com Roberto Campos e um suspeito parentesco com Chico Buarque – tem um cacife eleitoral de 8 milhões de votos, mas Morena tem um cacife quase três vezes maior!
É razoável pensar que, caso a racionalidade prevaleça sobre as ambições pessoais, a candidata do PSB será Morena da Selva. Eduardo deve se contentar com o vice da chapa.
Afinal de contas, ele queria ser vice de Dilmandona e só tomou a decisão de se candidatar a Presidente quando seu desejo foi recusado. Obviamente, Dilmandona não queria perder o valioso apoio do fisiológico PMDB.
Na reunião em que comunicou sua decisão de se filiar ao PSB, Morena da Selva – ex-petista e ex-ministra de Lula, o Magnífico – fez duras críticas ao PT.
Disse que o País estava gravemente ameaçado de uma bolivarização no estilo de Hugorila Chávez. E nisto acertou na mosca!
Caracterizou essa mesma por uma tentativa de cerceamento da liberdade de expressão e por uma perseguição a membros da oposição. E nisto acertou novamente o alvo!
Referiu-se particularmente à hegemonia do PT no Congresso Nacional e ao projeto de sufocar as novas legendas mediante rejeição dos cartórios de assinaturas de apoio aos partidos.
Morena mencionou particularmente o alto índice de assinaturas rejeitadas nos cartórios do ABC, notório reduto do PT em São Paulo. Em outras palavras: reclamou de seu partido ter sido garfado, de modo a embananar sua candidatura.
O vereador paulistano Ricardo Young (PPS), um dos aliados de Morena da Selva, fez uma crítica ainda mais contundente:
“O aparelhamento do Estado e das instituições pelo PT é insuportável. O caso da Venezuela é um populismo autoritário com inspiração militarista, aqui esse fenômeno é mais sofisticado” (Folha de S. Paulo, 6/10/2013). Sem dúvida, muito mais sofisticado…
Mas não devemos nos esquecer de que Hugorila Chávez, antes de se envolver diretamente com a política, era um oficial do Exército Venezuelano.
E quando ingressou na vida política, sempre contou com o apoio das Forças Armadas da Venezuela, principalmente quando deu um golpe.
No Brasil, apesar das semelhanças com o bolivarianismo de Chávez, as coisas são bastante diferentes.
Em primeiro lugar, as esquerdas lideradas por Lula adotaram a estratégia de hegemonia gramsciana, que consistiu em aceitar o jogo democrático para roer por dentro as instituições democráticas.
Serviram-se da mídia e do ensino para inocular em doses homeopáticas a peçonha do socialismo na população. Isto para não falar nas esmolas concedidas pelas bolsas, como a Bolsa-Família.
Se na Venezuela as Forças Armadas foram colocadas a serviço do projeto totalitário de Chávez, no Brasil elas têm sofrido uma dura campanha revanchista.
Esta mesma atingiu seu ápice com a Comissão da (In)Verdade, tendo como finalidade precípua desprestigiar uma das instituições em que o povo mais confia, segundo as pesquisas de opinião pública.
Numa entrevista coletiva, Morena da Selva disse que houve uma conspiração para inviabilizar seu partido:
“Há no país uma tentativa, de forma casuística, de eliminar uma força política que legitimamente tem o direito de se constituir como um partido político. Vejo um risco de aviltamento da nossa democracia.” (Folha de S.Paulo, 6/10/2013).
De fato, assim como fizeram com o partido dela, poderiam fazer com qualquer outro partido, um inaceitável desrespeito à Constituição, que garante a todos os cidadãos o direito de associação com finalidade político-partidária.
Embora eu não simpatize nem um pouco com as ideias de Morena da Selva – principalmente com suas ideias ecológicas inspiradas na natureza bela e pura e no “bom selvagem” de Rousseau – penso que ela tem toda a razão nesse particular.
Temos o assombroso número de 32 partidos que, na canhestra opinião do ministro do STF Marco Aurélio de Mello, que rejeitou a cláusula de barreira, é um sinal de “pluralismo democrático”.
Ora, se um só partido é pouco, trinta é demais! Será que uns cinco ou seis não estariam de bom tamanho numa autêntica democracia pluralista?!
Mesmo porque a maioria deles são partidecos de aluguel carecendo de autêntica representatividade.
Mas ninguém pode afirmar, em sã consciência, que uma candidata possuidora de um cacife político de 20 milhões de votos não é uma legítima representante de uma significativa parcela do eleitorado, ainda que não apreciemos suas ideias políticas. Nem as dela, nem as daqueles que a preferiram.
Há, contudo, um fator que considero altamente positivo na escolha de Morena da Selva.
Sem ela na disputa, Dilmandona seria facilmente eleita no primeiro turno, mas com ela é quase certo que teremos um segundo turno e, com ele, a esperança de que o PT volte a ser um partido de oposição.
É preferível uma dose de Morena a Dilmandona em dose dupla!
* DOUTOR EM FILOSOFIA PELA UFRJ