Economia de água e a “Tragédia dos Comuns”
“aquilo que é comum ao maior número despertará sobre si os menores cuidados.” (Aristóteles)
O leitor Lucas, provavelmente morador de São Paulo, comentando meu artigo de ontem sobre a falta de água e energia, derivada da ausência prolongada de chuvas, escreveu o seguinte, acerca da minha sugestão de que as tarifas de água e energia deveriam sofrer aumentos expressivos, a fim de que o consumo desses produtos fosse reduzido:
“Em meu edifício o consumo é comum. Logo, como esperado, não houve redução no consumo. O síndico diz que nós não estamos colaborando. Nenhuma surpresa até aqui. Mesmo que haja aumento prévio [no preço] da água, cada litro economizado (…) em minha unidade equivale a economia de apenas 5ml na minha conta. Não vai dar certo. Coletivizar as responsabilidades não resolve problema algum.”
O leitor tem razão. Principalmente em grandes conglomerados habitacionais, onde os medidores de água ainda não são individualizados, o aumento puro e simples da tarifa pode não surtir o efeito desejado e o consumo total de água permanecer estável – ou até aumentar -, mesmo diante de um aumento expressivo da tarifa.
Este é, sem dúvida, é um exemplo clássico daquilo que se convencionou chamar de “Tragédia dos Comuns”, uma teoria do comportamento humano segundo a qual a maioria dos indivíduos, sempre que puder apropriar-se de partes de um bolo comum, sem importar-se com quanto contribuiu para a sua produção, será incentivada a fazer o mínimo possível em prol do bolo e dele retirar o máximo proveito. Em outras palavras, quando a propriedade é comum, os indivíduos, agindo de forma independente e racionalmente de acordo com o interesse próprio, se comportarão contrariamente ao interesse de longo prazo de todo o grupo.
Por conta disso, diversos condomínios têm utilizado uma fórmula simples para economizar água: a instalação de medidores individuais nas respectivas unidades familiares, de forma que cada uma pague exatamente por aquilo que consumiu. O mais interessante quando se olham as estatísticas, porém, é observar que o gasto global tenha caído de modo consistente onde quer que a individualização tenha sido implementada, e não apenas a conta de um ou outro condômino.
Uma das grandes virtudes da propriedade privada é justamente estabelecer a conexão inescapável entre esforços e ganhos, custos e benefícios, criando incentivos para que as pessoas produzam (ou economizem, como no caso do consumo de água) conforme os seus interesses, necessidades e ambições. Mas o direito de propriedade é também, e acima de tudo, a melhor arma contra a barbárie, a garantia de que “o pão obtido com o suor do próprio rosto” não será apropriado por ninguém arbitrariamente.