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Católicos versus Porta dos Fundos: uma resposta a Maurício Ribeiro

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Soube que Maurício Ribeiro atacou, em vídeo, meu texto intitulado Associação católica processa Porta dos Fundos: não seria exagero?. Nele discuto o processo que o Centro Dom Bosco abriu contra o grupo Porta dos Fundos. Repito: acho o processo exagerado, mas não só isso. Assisti ao vídeo e creio que Maurício Ribeiro tenha também se excedido em algumas considerações respeitantes a mim, a Rodrigo Constantino e aos liberais. Desta forma, penso que podemos discutir – civilizadamente, por favor – alguns desses apontamentos. Dada a introdução, vamos aos pontos mais relevantes da reação.

O exagero no ataque a Rodrigo Constantino

No início do vídeo Maurício Ribeiro diz que “ficaria impressionado se ele [Constantino] não replicasse” o texto no qual discuto o exagero em processar o Porta dos Fundos. Pergunto: por quê? Se Ribeiro acompanhar os textos de Constantino irá notar que existem publicações nas quais, em vez de fazer críticas à Igreja Católica e ao Cristianismo, Constantino, embora não professe a fé cristã, entende sua contribuição para a civilização ocidental. Do modo como fala Ribeiro, a impressão é que Constantino é um liberal ateu contrário à fé cristã. Mas isso não procede se lermos alguns dos seus artigos sobre o tema. Não tenho guru e não respondo pelos outros, mas há de se fazer justiça. Por isso segue abaixo alguns dos textos nos quais o posicionamento de Constantino é bem diferente daquele que Maurício Ribeiro quis apresentar de forma irônica.

A Igreja Católica medieval criou uma instituição que mudaria o mundo: a universidade
Um novo despertar do cristianismo e o alerta de Chesterton
Como os cristãos devem ver o socialismo?

Quando Ribeiro diz que Constantino replicou meu texto, é interessante acrescentar o fato de que ele é presidente do Conselho Deliberativo do Instituto Liberal, portanto colabora para a propagação das ideias que lá são discutidas. Além disso, não é porque Constantino replica os textos do Instituto Liberal que concorde necessariamente com tudo o que é debatido por lá, haja vista o caso da resposta de Antonio Pinho no artigo Por uma escola livre da intervenção estatal: uma resposta a Miguel Nabig. No fim do texto Constantino tece comentários sobre não concordar inteiramente com o que foi ali apresentado, entretanto, o artigo também foi replicado em seu blog. Por isso a observação: é indispensável que os seguidores de Constantino saibam que nem todos os textos por ele publicados são de sua autoria. Em razão disso, antes de atacarem-no injustamente – o que tem ocorrido com certa freqüência – é preciso saber quem é o autor do texto. A propósito, vejamos abaixo um comentário de um seguidor de Ribeiro que se autointitula “Inquisição OnLine” acompanhado pela resposta do autor do vídeo:

 

Não é direito investir contra Constantino pelo fato de ele colocar a discussão das ideias verdadeiramente em prática. Já citei acima um dos textos com o qual Constantino discordava e mesmo assim o publicou. Maurício Ribeiro diz que Constantino “comprou a causa” do meu texto somente por publicá-lo. Errado. Replicar os textos, meu caro Ribeiro, mais do que defendê-los a priori, é uma atitude respeitável de quem favorece um debate honesto, o que poucos fazem.

O autor do vídeo também critica a ideia de que Constantino teria mudado em algumas opiniões e que teria se tornado mais conservador. Em virtude disso Constantino estaria citando conservadores britânicos, o que, para Maurício Ribeiro, parece não servir. Pergunto: mas o conservadorismo britânico não seria uma tradição respeitável? Talvez Ribeiro prefira o conservadorismo ibérico de ranço autoritário.

Para tentar provar que Constantino é muito mais liberal do que conservador, Ribeiro diz que Constantino vive citando Ayn Rand, que seria sua “guru”. Ele diz: “E o senhor Rodrigo Constantino fica parafraseando inclusive em seus livros e seus artigos a sua guru Ayn Rand.” Eis um problema da mente totalizante que não suporta o fardo dos números quebrados e precisa sempre de respostas exatas. Não concordo plenamente com o libertarianismo – creio que é uma utopia -, mas será que nenhum pensamento libertário serve? Não concordo inteiramente com a Igreja Católica, mas será que nenhuma de suas ideias tenha importância mesmo para o mais materialista dos sujeitos? Será que um ateu não possa tirar proveito dos escritos de Bento XVI? Será mesmo que liberal com traços conservadores implica contradição? Creio que uma coisa não anula a outra. E você, Maurício, não parafraseia ninguém? Fala de Olavo de Carvalho, Bene Barbosa etc. por considerá-los “gurus” ou por que admira seus trabalhos?

O exagero no ataque ao meu texto

Maurício Ribeiro alegou que eu estaria me contradizendo em dizer que compreendo a insatisfação dos católicos por terem sua religião achincalhada ao mesmo tempo em que penso que o processo seja exagerado. Discordo. Penso que a resposta dos católicos poderia vir em forma de postagens, artigos, vídeos – como o próprio Ribeiro faz – e com o boicote ao Porta dos Fundos, se assim o desejarem. Acho que o exagero é apelar para o Estado. O que fazer com todas as postagens que debocham das religiões e que circulam livremente pelas redes sociais? Apontá-las como criminosas?

Maurício Ribeiro também faz a pergunta: “o que seria esta atitude autoritária?” A resposta é simples: é autoritária porque busca censurar o humor. O Art.208 apresenta como crime atos como “Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso:” Um vídeo com piadas, porém, é diferente de quebrar imagens, invadir e perturbar Missas e agredir fiéis. Ademais, será que o vídeo realmente configura vilipêndio? Aguardemos a interpretação do juiz.

Em outro momento Ribeiro peca por uma omissão voluntária, pois cita minha pergunta, mas não minha resposta, que vem em seguida. No artigo faço a seguinte indagação: “Por que o Porta dos Fundos não ousa fazer piada ridicularizando Mohammad?” Meu crítico diz que “não é uma necessidade de muita inteligência para saber que se eles fizessem isso eles estariam fritos”. É óbvio. Mas se tivesse sido justo e lido uma linha a mais para seus seguidores, Ribeiro encontraria a resposta indicando que o Porta dos Fundos não satiriza Mohammad “Porque as consequências, como estamos acostumados a ver, não terão a cara de um processo no Tribunal de Justiça do Rio.” Em outras palavras, se o Porta dos Fundos zombar de Mohammad, não é impossível que os humoristas tenham que encarar bombas e Kalachnikovs.

O exagero em dizer que o alvo é a Igreja Católica

No vídeo ele também diz: “Mas dá para ver que o alvo é, sim, a Igreja Católica”. Aqui ele comete outro disparate. Eu, autor do texto, aprecio a Igreja Católica e o Cristianismo em muitos aspectos. Assim como os pareceres de Rodrigo Constantino no tocante à Igreja Católica e que citei acima, penso que esta é uma instituição basilar para a civilização ocidental. Mesmo não tendo nascido com o “órgão da fé”, como dizia Émil Cioran, acho de uma pobreza de espírito sem tamanho não conseguir contemplar todas as belezas proporcionadas pela Igreja ao longo dos séculos.

Ele diz que “o único tipo de preconceito válido é contra a Igreja Católica”. Nisso estamos de acordo. Na era politicamente correta e dos posers, se você quiser parecer “descolado” e “inteligente” basta dizer que a Igreja e a Bíblia são “opressoras”. Mas Maurício Ribeiro erra drasticamente quando afirma que meu alvo seria a Igreja Católica, afinal de contas, eu mesmo, embora não esteja de acordo com tudo no que diz respeito à Igreja, sou um apreciador de sua teologia e de seu legado.

O exagero em generalizar os liberais

Fazendo uma associação equivocada entre liberalismo e ateísmo, Ribeiro generaliza apontando que os liberais seriam também preconceituosos em relação à Igreja. Não existe um catecismo liberal, por isso existem liberais ateus e liberais cristãos – isso pode ser percebido na variedade de colaboradores do Instituto. Um liberal pode ser um crítico da Igreja Católica, mas, pelo menos no Instituto Liberal, também atacado por Ribeiro, dificilmente ele irá se deparar com algum posicionamento que maldiz a Igreja. Você pode ser liberal, ateu e compreender e valorizar a herança da Igreja mesmo sem acreditar na divindade de Jesus Cristo. Joaquim Nabuco foi um exemplo daqueles que, reconhecendo o valor da Igreja Católica não deixou de apontar alguns problemas que encontrava durante o século XIX.

Quando acusa os liberais de serem contra “os valores católicos”, Ribeiro generaliza novamente. Existem liberais católicos. Nem todos são conservadores ou caricatos moralistas. A diferença é que um católico que se identifica com o liberalismo não irá exigir que seu semelhante partilhe de suas convicções religiosas, ao passo que um católico contrário ao liberalismo não vê problema em julgar o outro pela ótica de suas convicções religiosas. Há um abismo gigantesco entre alguém que segue o Catecismo da Igreja Católica e alguém que exige que o outro o siga também.

Ribeiro afirmou que os liberais – todos, pelo jeito – acham um exagero que os católicos reajam. Errado. Não acho que seja um exagero reagir. Só penso que a reação via processo é, sim, desnecessária. Há inúmeras outras formas de responder ao vídeo O Céu Católico sem apelar para o Estado. Outra coisa: assim como não pretendo falar em nome de todos os liberais – alguns talvez apoiem o processo – creio que Maurício Ribeiro não deveria falar em nome de todos os católicos.

O exagero em dizer que quero me passar por “isentão”

Mais um equívoco. Não quero passar por “isentão”. Não escrevi que acho um exagero? Se o fiz, então não fiquei isento. Onde está a isenção se redigi um texto manifestando uma opinião sobre o caso? Talvez a crítica de Maurício Ribeiro esteja direcionada ao meu entendimento acerca da fé, pois acho possível que um religioso conviva com o humor – mesmo com o humor que tem a religião como objeto – e com sua fé. Mais relevante do que a punição terrena, não seria a punição divina? Creio que o Estado seja menos eficiente do que Deus nesse caso. Sem qualquer ironia, existiria preço mais caro a ser pago do que com a condenação eterna? A verdade é que, processando o Porta dos Fundos ou qualquer um que satirize a religião, as piadas, sem graça ou não, de mau-gosto ou não, irão continuar. E assim também continuará as piadas de Facebook, os “memes” e as zombarias por parte dos ateus militantes seguros de própria “superioridade” intelectual. Em suma: o que fazer? Enquadrar todos eles no Art.208 do Código Penal? Acho que essa não é a solução. Se é que ela existe.

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Thiago Kistenmacher

Thiago Kistenmacher

Thiago Kistenmacher é estudante de História na Universidade Regional de Blumenau (FURB). Tem interesse por História das Ideias, Filosofia, Literatura e tradição dos livros clássicos.

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