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Bolsonaro, uma Dilma 2.0?

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Muito se falou no antiliberalismo de Bolsonaro durante a campanha presidencial. Sua perspectiva corporativista a favor dos militares e seu histórico de posicionamentos enquanto deputado causavam apreensão daqueles que defendem uma economia menos estatizada e com maior participação do setor privado. Durante as mais de duas décadas em que esteve no Congresso, o atual presidente votou diversas vezes de forma semelhante aos legisladores esquerdistas, como, por exemplo, em sua oposição ao Plano Real, à reforma da previdência e à reforma administrativa de FHC, além de ter sido contra a quebra do monopólio estatal nos setores do petróleo e das telecomunicações.

No decorrer das disputas eleitorais, Bolsonaro buscou acalmar os investidores, alegando que não sabia nada de economia, que havia revisado seu pensamento econômico e que daria carta branca ao “Posto Ipiranga” liberal, Paulo Guedes. Quatro meses de governo e, no entanto, o presidente já começa a demonstrar seu distanciamento da direita clássica em se tratado de aspectos econômicos: mostrou-se favorável à proteção de setores nacionais contra a concorrência estrangeira, como no caso dos produtores de leite e de bananas; prorrogou subsídios fiscais na Amazônia e no Nordeste; apoiou o perdão de dívidas de produtores rurais e agroindústrias com o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural); tem se mostrado receoso em relação o corte radical de subsídios proposto pelo Ministro da Fazenda; e chegou a considerar uma intervenção na Vale, uma empresa que tem controle acionário privado, após o desastre de Brumadinho. É na gestão das empresas estatais, contudo, que Bolsonaro vem demonstrando uma de suas piores facetas intervencionistas.

Este tipo de instituição é problemática por natureza e gera distorções na economia. Há, porém, alguns modelos de arranjos institucionais em diversos países que contribuem para que elas não tenham um impacto tão negativo para a sociedade. Dentre as principais “boas práticas” apontadas pelos estudos de governança corporativa de estatais, dentre os quais se destaca o trabalho da OCDE, ressalta-se a criação de mecanismos que impeçam a influência do governo no dia a dia da empresa; regras que impossibilitem algum tratamento diferencial em relação a empresas privadas que sejam concorrentes; fortalecimento de partes interessadas (stakeholders), sobretudo de acionistas minoritários; e maior transparência.

Como bem sabido por muitos, durante a era PT as estatais brasileiras foram utilizadas como ferramenta governamental, contrariando a ideia de independência dessas instituições, como acontece nas nações mais desenvolvidas. Não apenas cabide de empregos para comprar aliados ou ferramenta para desviar recursos públicos em direção aos cofres dos partidos, as empresas foram utilizadas de forma populista, corrompendo a democracia no Brasil. Lula e Dilma mantiveram a inflação artificialmente controlada com os subsídios do combustível (os quais geraram um rombo maior do que os desvios apurados pela Lava Jato) e aqueceram de forma insustentável a economia nacional através da queda forçada de juros via bancos públicos e da política agressiva de investimentos da Petrobras. Atos prejudiciais ao país, que geraram desarranjos nas contas públicas e no mercado, mas que ganharam simpatia de curto prazo da população, preocupada com seu salário e com seu poder de compra ao final do mês.

O Brasil parecia ter aprendido a lição: a Lei das Estatais (Lei nº 13.303/16) veio como um importante marco regulatório na governança corporativa dessas empresas, o que poderia significar uma importante valorização nos ativos a serem futuramente privatizados. Mas o presidente, por ignorância ou má-fé, toma medidas que lembram o governo petista e também o governo dos seus aclamados militares: em um espaço de menos de um mês, tentou vetar o reajuste de preços dos combustíveis, diminuiu o poder dos acionistas minoritários na Petrobras, interveio em propaganda do Banco do Brasil e agora anuncia o desejo da queda de juros forçada por bancos públicos.

A nossa gestão pública parece não conseguir se desatar dos nós criados durante a formação do sistema financeiro brasileiro e da incorporação da primeira empresa com características estatais. Como demonstra William Summerhill em Inglorious Revolution, a participação de políticos nos cargos mais altos do Banco do Brasil durante o Império era prática comum e essa instituição, através do oferecimento de uma extensa linha de crédito subsidiado aos cafeicultores do Vale do Paraíba, canalizava recursos públicos, extraídos da população, para o setor mais rico do país. O cronismo já era denunciado àquela época, conforme demonstra o deboche de uma charge publicada na Revista Ilustrada, em 4 de agosto de 1888, onde o Ministro da Fazenda “alimenta” os cafeicultores:

Enquanto isso, a patrulha bolsonarista nas redes sociais defende toda e qualquer medida do governo atual, lembrando os tempos em que a gestão Lula era considerada impecável e seus opositores eram todos representantes do mal. No debate entre o governo dos loucos e o dos cachaceiros, medidas concretas parecem não ter valor algum. Independentemente da decisão, o que importa é quem a toma. No discurso, Bolsonaro é a representação do antipetismo. Na prática, pelo menos em diversos aspectos da política econômica, é a Dilma 2.0.

Sobre o autor: Lucas Cabral Zanoni é graduando em História pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP).

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