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“A Nascente”, de Ayn Rand

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Algumas leituras são intrigantes porque nos ensinam sobre algum tema, até então, desconhecido. Outras são marcantes por contar histórias inspiradoras e há aquelas que se tornam um ponto de inflexão na vida de um indivíduo, por mudar sua visão, sua forma de pensar e, até mesmo, seus valores. A Nascente pode ser tudo isso ao mesmo tempo: uma história marcante e inspiradora, reflexiva e transformadora. A obra de Ayn Rand foi publicada pela primeira vez em 1943 e, desde então, já vendeu mais 6 milhões de cópias, com traduções em mais de 20 idiomas. Rand nasceu na Rússia em 1905 e se mudou para os Estados Unidos em 1926, onde se notabilizou como romancista e filósofa. Suas obras introduziram o sistema filosófico conhecido como Objetivismo que, de acordo com a própria autora, “é o conceito de Homem como um ser heroico, tendo a felicidade como o propósito moral da sua vida, a conquista produtiva como sua mais nobre atividade, e a razão como seu único referencial”.

A Nascente é um romance que, por meio de seus personagens, busca confrontar os valores e as virtudes bem quistos pela sociedade com os pilares do Objetivismo de Rand. Enquanto romance, o livro conta a história de amor dos personagens Howard Roark e Dominique Franco, mas ao longo dos capítulos várias outras personalidades são apresentadas como referências às diferentes crenças e princípios que norteiam o pensamento. Como seria estruturalmente inadequado abordar cada personagem integrante de A Nascente, essa síntese se concentrará em quatro deles que, por suas características, resumem as principais ideias da autora. Comecemos por Howard Roark.

Roark representa o homem ideal na visão de Rand. Arquiteto, abandonara a universidade antes de concluir por considerar não haver mais nada de fundamental para se aprender com seus professores. Detém a visão de que sua área de atuação profissional deveria continuar evoluindo e não se limitar ao conhecimento já desenvolvido. Ele se opõe ao status quo e, assim, não aceita a imposição de padrões universais como a única resposta, mas os desafia propondo novas formas de fazer as coisas. Por assim ser, é considerado pelos seus pares um arrogante. Seu trabalho, por simplesmente se opor ao padrão, é menosprezado antes mesmo de uma avaliação.

Howard Roark é, também, um homem independente. Sua força provém da paixão pela arquitetura e sua motivação é projetar grandes obras com a inspiração de seu talento. Não depende da aprovação dos demais para seguir e não se incomoda com as críticas e perseguições. Da mesma forma, permanece focado em seus próprios objetivos, sem se preocupar com o sucesso ou o fracasso alheio. Por isso, é considerado pelas pessoas egoísta e sem empatia. É, ainda, um indivíduo racional, que busca entender o mundo como ele é, sem se deixar influenciar por crendices ou suposições. Não especula, se concentrando apenas no que é concreto. Seu pensamento é movido pela razão e, por isso, é considerado, pelas massas, frio e inflexível.

O próximo personagem é Peter Keating. Arquiteto formado com destaque acadêmico, Keating inicia a carreira em um famoso escritório e, com um crescimento meteórico, chega até a posição de sócio. Seu trabalho é aclamado porque se assemelha a tudo que é bem conhecido. Sua imagem é admirada, porque representa o padrão bem aceito de vida de sucesso, do garoto com boa formação, que consegue um bom emprego e cresce fazendo aquilo que se espera. Peter é o homem que copia, que não desenvolve uma personalidade própria e que vive de acordo com os padrões definidos pelos outros. Aprendeu com a mãe que deveria encontrar um emprego com bom status social e que o deixasse rico, não dando voz à sua paixão pela pintura. Foi, também, definição da mãe que não deveria seguir seu coração e se envolver amorosamente com a pacata Catherine Halsey, mas procurar uma esposa mais adequada aos padrões demandados por sua posição social. Aprendera, mais tarde, que deveria projetar baseado na arquitetura renascentista porque ela já englobara todo o conhecimento necessário sobre construções. Aprendera, ainda, a importância de participar de grupos com outras pessoas de status, simplesmente porque isso seria bom para sua imagem na sociedade.

Keating é verdadeiro egoísta no sentido comumente empregado à palavra. Para chegar aos objetivos que lhe foram traçados pelos outros, ele é capaz de tudo, independente do que tenha que destruir ou de quem tenha que usar ou derrubar. Não se incomodara em acabar com Lucius Heyer para chegar à posição de sócio, assim como não hesitara em abandonar friamente seu verdadeiro amor, Catherine, quando teve a chance de se casar com uma mulher mais estratégica no sentido social. Igualmente, não se importara em usar as habilidades de Howard Roark para salvar seus projetos sem lhe dar qualquer reconhecimento ou retribuição. Esse é um homem sem princípios e valores, que vive única e exclusivamente pela vontade dos outros.

Passemos a Gail Wynand. Empresário de sucesso, proprietário do importante jornal The Banner, construiu seu patrimônio tendo começado do zero. Como Roark, é um homem independente e virtuoso, que persegue seus próprios objetivos e não se curva à vontade dos outros. Porém, acredita deter poder sobre as massas por sua posição, sem perceber que esse poder depende de oferecer às pessoas aquilo que elas querem, de contar aquilo que esperam ouvir. Quando decide, a contragosto do senso comum, se engajar na causa de Howard Roark por entender que ele tinha razão, Gail vê seu poder evaporar. Enquanto tenta oferecer à sociedade uma visão do que acreditava ser a verdade, descobre que a racionalidade não é uma característica tão apreciada e enfrenta a opressão do status quo em sua versão mais brutal. Diante da iminente destruição de seu império, Wynand finalmente se rende à vontade popular e é obrigado a reconhecer quem, verdadeiramente, detém o poder sobre quem. Gail representa o indivíduo com qualidades e determinação correta para fazer grandes coisas, mas que, por fim, se curva ao senso comum.

Chegamos a Ellsworth Toohey. Escritor progressista renomado, crítico de artes e conferencista, assumiu desde criança que se destacaria pela manipulação das massas, pois não teria o talento e a determinação necessários para competir honestamente. Seu método é exaltar o que é desprezível e cuidar para que as pessoas nunca experimentem o que é, verdadeiramente, brilhante. Teme o homem virtuoso, que não se curva à vontade alheia e, por isso, trabalha para destruí-lo, aprisioná-lo, limitá-lo. Defende o altruísmo e o coletivismo como ótimas maneiras de direcionar a mente humana a abandonar seu próprio eu, suas individualidades, e viver condicionada à visão dos outros. Afinal, o que é o altruísmo senão se curvar à vontade alheia? O que é o coletivismo senão o império do senso comum?

Toohey representa pessoas, crenças e grupos que tentam retirar do homem sua própria ambição. Representa aqueles que buscam aprisionar a mente humana em um lugar onde possa ser controlada, direcionada conforme a vontade de quem estiver no poder. Ele defende causas tidas como nobres, mas que nada são além uma tentativa de tornar tudo igualmente desprezível. Diz lutar pelos mais necessitados, mas, na verdade, quer apenas derrubar o virtuoso e torná-lo igualmente dependente.

A Nascente expõe de forma brilhante o arranjo social que o coletivismo tenta nos impor: o império dos incapazes sobre os virtuosos, dos improdutivos sobre os produtivos, dos controladores sobre aqueles que desejam ser livres. Vemos um Roark na figura de cada empresário tentando competir honestamente no mercado, em cada trabalhador vivendo do fruto da atividade produtiva que tanto ama ou nos desbravadores buscando inovar em sua área de atuação. Enquanto isso, Toohey representa aqueles tentando controlar a virtude. São os governos autoritários impondo obrigações financeiras e regulatórias. São grupos de pressão que só fazem defender os incapazes. São todos aqueles tentando inibir o mérito sob a justificativa de que todos somos iguais.

Identificamos um Keating na figura de cada pessoa que vive sem objetivos próprios, condicionados apenas ao que lhe foi imposto pelo padrão bem aceito. Um filho exercendo, sem paixão, a profissão que seus pais escolheram. Um profissional trabalhando exclusivamente pela atratividade financeira, sem qualquer identificação com a atividade. Um casal vivendo um relacionamento estratégico, mas sem afeto. São pessoas muitas vezes reconhecidas como a representação do sucesso, mas jamais conquistaram algo que realmente quiseram. Não são como Roark, que luta pelo que acredita, pois nem mesmo sabem no que acreditam.

Em Gail enxergamos aqueles que deveriam ser, mas, ocasionalmente, se rendem. Pode ser um empresário com histórico de realizações, mas que, diante de uma oportunidade de enriquecimento ilícito, se deixa levar (“afinal, é o que todo mundo faz e se eu não fizer, alguém vai ganhar no meu lugar”). Pode ser também um pensador lutando pela liberdade de seu povo, mas que perde o ímpeto quando é pressionado pela opinião pública. Ele representa todo aquele que está disposto a defender o que acredita, desde que isso não signifique enfrentar a força impositiva do bem comum.

Finalmente, a história de A Nascente demonstra que o indivíduo racional vence, mesmo diante de toda a opressão imposta. A conquista de Roark é a vitória do homem que sabe o que quer e está disposto a seguir em frente, mesmo quando o contexto indica o contrário. Um homem que vive por seus próprios ideais é um homem feliz e um homem feliz é independente. Não há quem possa dobrar um homem independente.

*Gabriel Salvatti é associado II do Instituto Líderes do Amanhã.

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