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A mentalidade anticapitalista segundo Ludwig von Mises

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Ludwig von Mises foi um notável economista do século XX, nascido no Império Austro-Húngaro (1881), formado em Economia e professor na Universidade de Viena, além de ter se destacado como o principal conselheiro econômico do governo austríaco. Na segunda metade de sua vida, em virtude da Segunda Guerra Mundial e da perseguição nazista aos judeus, refugiou-se nos Estados Unidos, onde lecionou na Universidade de Nova York.

Mises teve contribuições importantes no pensamento econômico. Podemos destacar o fato de ter sido mentor de economistas importantes para a história da economia, como Friedrich von Hayek, Gottfried Haberler e Fritz Machlup. Ele trouxe ainda contribuições para o debate acerca do cálculo econômico no socialismo, bem como alguns trabalhos acerca do desenvolvimento da metodologia econômica.

Vale destacar ainda o papel de Mises como um filósofo político, como na obra Liberalismus (1927), em que resgata a tradição do liberalismo clássico. O professor destacou-se ao longo de sua vida como um defensor da economia de mercado e da propriedade privada. Foi justamente com esse objetivo que escreveu a obra A Mentalidade Anticapitalista.

A mentalidade anticapitalista, segundo Ludwig von Mises

Uma das contradições que intrigam na política é o ódio ao sistema capitalista, a despeito de este ser responsável pela redução da pobreza e da desigualdade a níveis jamais vistos na história da civilização humana.

E é justamente esse paradoxo que Mises se propõe a analisar na obra, ao longo de cinco capítulos.

1. As características sociais do capitalismo e as causas psicológicas da sua difamação 

No primeiro capítulo, o professor Mises enfatiza os benefícios de uma economia de mercado, que, em última análise, seria a melhoria sustentável do padrão de vida e enriquecimento das pessoas.

Além disso, a continuidade do sucesso econômico do capitalismo depende do crescimento do capital acumulado em relação ao crescimento da população. Isso significa que quanto maior a quantidade de capital investido por trabalhador, bens melhores e em maior quantidade podem ser produzidos e consumidos.

Mises critica ainda o capital conquistado pela aristocracia, pois não é resultado de produção de bens e serviços em benefício dos consumidores, sendo uma apropriação forçada da propriedade de terceiros.

O autor aponta que o capitalismo difere de uma sociedade de castas, como a que vigorou na Europa ao longo da Idade Média e do apogeu do Feudalismo. Nesta, o nascimento do indivíduo determinava as condições a que ele estaria submetido durante toda a sua existência. Já no capitalismo, a situação de vida dos indivíduos depende da própria ação de cada um.

Assim, de acordo com o autor, o motivo de as pessoas odiarem tanto o capitalismo é o ressentimento de quem não consegue ascender na economia de mercado. As capacidades intelectuais, a ambição e a dedicação separam os indivíduos que prosperam e os que fracassam.

2. A filosofia social do homem comum 

Mises aponta que a evolução econômica e de bem-estar proporcionadas pela sociedade capitalista não são, de forma equivocada, atribuídas à economia de mercado.

O autor aponta que a obra de Karl Marx exerceu essa influência nas massas e endossa, ao longo do capítulo, a necessidade de acumulação de capital, a fim de se ter desenvolvimento tecnológico.

O professor divide entre três classes os méritos pelo avanço capitalista: os poupadores, os investidores de capital e os empreendedores, que empregam esses recursos em busca de novos métodos para o emprego dos bens de capital.

Para Mises, as ideias socialistas demonizam esse processo de produção por interpretarem de forma errada que ele prejudica as massas.

Por fim, o professor novamente atribui aos anticapitalistas o rótulo de “invejosos”, “ignorantes” e que eles “se recusam a estudar”.

3. A literatura sob o capitalismo 

Mises aponta que a escrita e a comunicação apenas passaram a ser viáveis para as massas com a evolução da sociedade capitalista, pois anteriormente tratava-se de algo reservado para a aristocracia e a realeza.

“O homem sem dinheiro, primeiramente, deveria se sustentar para depois pensar em escrever”, como ele resume.

Dessa forma, o capitalismo deveria ser celebrado para todas as pessoas que abraçam a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa.

4. As objeções não econômicas ao capitalismo 

Mises aponta que críticos ao capitalismo afirmam que possuir bens e propriedades não é garantia de felicidade, mas acredita que há uma contradição, pois quem critica a economia de mercado afirma que o problema do capitalismo é que as propriedades não são distribuídas de forma análoga.

Outra crítica comum que o autor busca argumentar é a de que a inovação tecnológica não beneficia todas as pessoas. A despeito de inovações chegarem na ponta mais rica da população, elas tendem a se popularizar ao longo do tempo.

5. Anticomunismo versus capitalismo

No último capítulo da obra, o autor aponta que a economia de mercado move a sociedade por meio das inovações e que ideologias utópicas buscam vender uma segurança e previsibilidade ao atacar a dinâmica da sociedade capitalista.

Os problemas da obra

A despeito das contribuições de Mises para a Ciência Econômica e ao próprio liberalismo, A Mentalidade Anticapitalista é uma obra que representa um desserviço aos defensores de uma sociedade livre e de uma economia de mercado.

O paradoxo do capitalismo, em que mesmo beneficiários do sistema econômico são seus maiores críticos, é uma questão a ser analisada, até em busca de melhorias ao sistema ou explicá-los de forma melhor para a sociedade.

Contudo, Mises expõe uma simplista e grosseira tese de que toda a oposição ao capitalismo é gerada por ressentimento e inveja. Quando a premissa de um argumento é de que seus opositores são mal-intencionados, não há pontes para um diálogo e busca de verdades científicas ou pontos de melhoria e convergência entre os debatedores. Além disso, tratar um crítico como inimigo significa, na prática, jamais conseguir convencê-lo de seus argumentos.

Além disso, há muitos outros trabalhos de economistas e filósofos políticos que exploram o paradoxo do capitalismo de forma muito mais completa, abrangente e sem esse tratamento equivocado evidenciado por este livro de Mises. Entre os exemplos, destaca-se The ugly market: Why capitalism is hated, feared and despised (A feiúra do mercado: por que o capitalismo é odiado, temido e desprezado, em tradução livre), de Israel Kizner, que, inclusive, teve aulas com Mises.

O economista londrino elenca no artigo que há uma percepção equivocada de que o livre mercado possibilita a diversos agentes agirem de forma egoística sem restrições, ou que a crítica à eficiência ou moralidade do capitalismo muitas vezes se dá em comparação a um mundo idealizado pelos anticapitalistas, “o que apresenta pouca relevância para problemas reais”.

Kizner aponta a falta de compreensão sobre o real funcionamento do mercado e a geração de riqueza, falsos medos de que a economia de mercado pode contribuir para o surgimento da anarquia, medo das consequências da ganância ou mesmo quem se confunde e culpa o mercado por consequências de intervenções governamentais que, em última análise, são anticapitalistas.

Ao contrário das ideias evidenciadas em A Mentalidade Anticapitalista, Kizner compreende que para combater o paradoxo do capitalismo é preciso o “ensino paciente e dos debates”, a fim de dissipar o ódio e a ignorância que cercam o livre mercado. Apenas fomentando think tanks, discussões públicas e a prática pelo exemplo será possível construir uma cultura que aprecie melhor uma sociedade de mercado.

Este artigo de Kizner foi publicado em 1974, um ano após o falecimento de Ludwig von Mises. A obra do londrino representa uma aula que o professor deveria ter aprendido antes de escrever sobre a mentalidade anticapitalista. Neste caso, é mais indicado ler o ensaio do discípulo do que o do mestre.

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Luan Sperandio

Luan Sperandio

Analista político, colunista de Folha Business. Foi eleito Top Global Leader do Students for Liberty em 2017 e é associado do Instituto Líderes do Amanhã. É ainda Diretor de Operações da Rede Liberdade, Conselheiro da Ranking dos Políticos e Conselheiro Consultivo do Instituto Liberal.

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