A lei Roberto Carlos: direitos ou interesses?
NEY CARVALHO *
A Imprensa tem noticiado, constantemente, as circunstâncias nefastas que envolvem a publicação de biografias no Brasil. No foco dos debates estão os artigos 20 e 21 do Código Civil. De um lado o Sindicato Nacional dos Editores de Livros e os principais autores nacionais daquele gênero literário. De outro um grupo de artistas notórios, ou não tanto, sob o manto de certa “Associação Procure Saber”. Esse grupo foi iniciado pela atuação do famoso Roberto Carlos, contrário à liberdade de biografar. Hoje conta com a adesão de outras estrelas platinadas do “show business” nacional, como Caetano Velloso e Chico Buarque, e é liderado pela Senhora Paula Lavigne.
O Globo de cinco de outubro corrente publicou artigo da referida Senhora sob o título Agenda Oculta. A matéria se inicia mencionando e interpretando os tais artigos do Código. Fala de privacidade e inviolabilidade da vida pessoal. Aparenta defender princípios e direitos individuais que seriam inalienáveis. E envereda pelas intenções, comerciais ou não das possíveis biografias. Mas no último parágrafo, a autora revela que não são bem convicções doutrinárias que movem a dita associação:
“Nesse sentido, a Procure Saber pretende apresentar proposta de alteração desses dois dispositivos do Código Civil, de forma a acomodar interesses comerciais de todas as partes – escritores, editoras, biografados e seus herdeiros – cuidando de preservar a intimidade e a vida privada do biografado, que não podem ser subjugados para proteger outros direitos que, de fato, não estão sendo prejudicados ou violados.”
O objetivo claro não é defender princípios jurídicos, mas eventuais interesses comerciais dos participantes da “Procure Saber”. A propósito, a Folha de São Paulo de hoje, quarta-feira, nove de outubro, traz uma carta aberta de Benjamim Moser, biógrafo de Clarice Lispector, a Caetano Velloso, participante da Associação, incitando-o a voltar para o lado do bem, abandonando a censura que propugna. E a matéria ao lado tem a chamada: Grupo de artistas, agora, reivindica pagamento a biografados ou herdeiros.
Não são direitos, princípios ou intenções nobres que movem a chamada “Procure Saber”. Apenas o vil metal, mola da humanidade.
* ESCRITOR E HISTORIADOR