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O fim de uma democracia ou nota de solidariedade ao povo venezuelano

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Venezuela2Começo a escrever esse artigo sem decidir o seu tom. Não sei se devo usar frios argumentos ou apelar para a emoção porque, de fato, escrevo efetivamente inflamada de indignação com o que está acontecendo na Venezuela e com a cumplicidade do governo brasileiro e do povo brasileiro – não apenas os que apoiam o atual governo (pois há críticos do governo Dilma que são alinhados com a ala mais radical do PT), mas todos que ainda defendem essa maldita ideologia que justifica a ditadura na qual vive o país vizinho.

Fui dormir depois de ter visto pelo twitter o assassinato do estudante de 14 anos e tive pesadelos com a imagem da sua cabeça esfacelada. Com ele, são seis o número de estudantes assassinados com um tiro na cabeça na Venezuela em menos de dez dias. Diante do meu alarme, o meu marido me disse: “e daí, morreu ontem um aqui em Messejana (bairro da periferia de Fortaleza) e também me mandaram o vídeo. O mundo é uma porcaria.” A contra-argumentação me lembrou outra que ouvi por ocasião da minha indignação em relação aos atentados terroristas contra os cartunistas do Charlie Hebdo: “E daí? Quantas pessoas são assassinadas no Oriente Médio?”. Qual o problema dessas contra-argumentações? Elas são uma crítica velada à nossa sensibilidade natural, a capacidade humana de se indignar e de sofrer diante de uma injustiça, além de oferecer, por outro lado, um perigo de banalização do mal.

Há alguns anos, quando ainda era uma jovem estudante de graduação em Filosofia, escrevi um ensaio que abordava um episódio narrado por Camus no livro O homem revoltado. No capítulo intitulado Os assassinos delicados, o jovem terrorista, revolucionário e poeta Kaliaiev – determinado em nome da causa da revolução a atirar-se sob os cascos dos cavalos do ministro que deveria assassinar – recusa-se a matar as crianças que se encontravam na carruagem do grão-duque. Que sentimento momentâneo e imperioso foi esse capaz de impedir o desfecho ideal do ideal de uma vida? Que sentimento foi esse capaz de se sobrepor ao espírito de rebeldia e revolta? Foi o espírito de compaixão. Foi o que não teve ontem o agente da Guarda Nacional Bolivariana (KGB) que atirou na cabeça do garoto Kluiver Rua, ontem no estado de Táchira, na Venezuela. Compaixão é um sentimento do qual o atual ditador Maduro está desprovido e senso moral ou bom senso é o que está faltando aos estadistas que ainda não se manifestaram contra as loucuras desse delinquente embriagado pelo poder.

O mal não se justifica. E, nesse momento, enquanto digito, vou mudando o rumo do texto que escrevi a punho. Nas próximas linhas eu mostraria de que forma a Venezuela chegou a esse ponto, de que modo o ideal da revolução bolivariana serviu de pretexto para a destruição das instituições da democracia liberal garantida pela constituição venezuelana, cedendo lugar ao poder arbitrário de homens malucos a partir de um discurso populista hipócrita que apregoava um aprofundamento da democracia, como se a democracia não fosse essencialmente um equilíbrio incompatível com uma radicalização: um equilíbrio garantido pela divisão de poderes e pela autoridade da constituição. Tentaria em seguida mostrar como, no Brasil, o processo é semelhante e quão patética, quando não perigosa, é a encenação do espetáculo protagonizado ontem por Lula e que se chamou “ato em defesa da Petrobras”, cujo objetivo era desmoralizar a Polícia Federal, um dos poucos órgãos que atua com independência e que ainda não foi engolido pelo PT. Faria ainda notar que, caso o PT consiga o seu intento de sabotar a operação Lava Jato, dias tenebrosos virão.

No entanto, não me vem ânimo para escrever tudo isso. Meu estado de espírito é outro. Gostaria apenas de me solidarizar com as mães dos estudantes assassinados, com os estudantes que hoje vão às ruas novamente arriscar suas vidas, com as esposas e filhos dos oposicionistas sequestrados e com os guerreiros e guerreiras que, a exemplo da deputada Maria Corina Machado, vão continuar lutando. Exponho também meu total desprezo ao governo brasileiro, alertando que qualquer postura que ele venha a ter em relação a esse problema será uma concessão política à pressão da oposição porque a ideologia que cega os ativistas do PT e da qual se servem os seus dirigentes é a ideologia da justificação do mal. O mal que mais uma vez está diante de nossos olhos e cuja análise e crítica os intelectuais de esquerda deixarão para os historiadores do futuro enquanto continuarão se ocupando da nossa ditadura que passou.

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Catarina Rochamonte

Catarina Rochamonte

Catarina Rochamonte é Doutora em Filosofia, vice-presidente do Instituto Liberal do Nordeste e autora do livro "Um olhar liberal conservador sobre os dias atuais".

2 comentários em “O fim de uma democracia ou nota de solidariedade ao povo venezuelano

  • Avatar
    26/02/2015 em 9:54 am
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    O Brasil ainda não está assim, mas o que os militantes do PT fez nesses dias mostra exatamente como será o nosso futuro daqui a pouco tempo.

  • Avatar
    25/02/2015 em 2:47 pm
    Permalink

    Artigo muito forte. Que o governo do PT se cale diante da escalada fascista do governo da Venezuela, se entende; pois são cúmplices desde os tempos de Lula da Silva. Mas onde estão a UNE, a OAB, a CNBB, a ABI, os Direitos Humanos?

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