fbpx

Você quer um mundo em que as pessoas andem descalças?

Print Friendly, PDF & Email

NB-Rand

Carolina de Vasconcellos*

De acordo com Nathaniel Branden, psicólogo americano autor do livro “The Psychology of Self-Esteem” (“A Psicologia da Autoestima”), autoestima é “a disposição de experienciar-se como competente para lidar com os desafios básicos da vida e ser merecedor da felicidade. É a confiança na eficácia da nossa mente, nossa capacidade de pensar. Portanto, é a confiança na nossa habilidade de aprender, fazer escolhas apropriadas e responder efetivamente à mudança. É também a experiência de que sucesso, realização, preenchimento – felicidade – são certos e naturais para nós.”

Não é de se admirar que, diante disso, Branden se classifique como um libertário.

Em sua palestra na Libertarian Party of California, em 2000, o americano discorreu a respeito de temas libertários e sua relação com a psicologia. Neste artigo, me propus a analisar algumas de suas colocações mais marcantes (em aspas, as frases dele; no resto do artigo, minhas ponderações).

“A mentalidade libertária pressupõe a disposição em aceitar responsabilidade por sua própria existência”.

A questão da autorresponsabilidade é um dos pilares do conceito de autoestima de Nathaniel Branden. Trata-se da compreensão de que nós temos a capacidade de causar efeitos desejados em nossas vidas e sermos responsáveis por nosso futuro, através de uma vida orientada ativamente e não passivamente (ou “victim-like”).

De acordo com Branden, apesar dos programas de bem-estar social terem surgido com o objetivo de diminuir a dependência, eles somente pioraram este problema, através da corrosão da autoestima e autorrespeito das pessoas.

Imagine que você esteja doente ou passando por momentos de dificuldade. É comum que sua autoestima fique fragilizada, por vezes desacreditando em sua capacidade de enfrentamento ou no sucesso futuro. Entretanto, diversos estudos mostram que pessoas que lidam com essas dificuldades de forma positiva tem melhor qualidade de vida e saem das dificuldades com maior facilidade. Bem, isso é o que a psicologia nos ensina.

E o que nos ensina a política? O exato oposto. O poder político sobrevive justamente das demandas de auxílio e proteção. O governo certamente faz um bom trabalho em convencer as pessoas de que, sem ele, não seriam capazes de conquistar quase nada e ficariam indefesas. E quanto mais vitimizado e frágil você se sentir, mais delegará sua própria existência ao auxílio e proteção externos. Com isso, cresce o poder do Estado, o estatismo e as demandas, num círculo vicioso.

“Nós criamos uma nação com números crescentes de pessoas que realmente pensam que tem direito a tudo aquilo que acham que precisam”.

Uma das consequências esperadas da mentalidade estatista é a transferência da responsabilidade pelo próprio futuro para o outro. O “outro” seria o Estado, não fosse o próprio Estado dependente de “outros”. Como se caíssem do céu e precisassem somente de “vontade política” para recolhê-los e distribuí-los, bens e serviços recebem uma nova nomenclatura: direitos. Basicamente são uma “garantia”, em forma de lei, de que você receberá aquilo de que necessita ou deseja. No mundo real, aquele que existe fora das fantasias megalomaníacas de legisladores (que acreditam em canetas com poderes sobrenaturais), temos restrições executivas e morais a este plano. Bens e serviços não nascem pela “vontade política”, mas pelo trabalho das pessoas. Se alguém tem que te dar algo de graça, significa que está trabalhando de graça. Portanto, bens e serviços não são direitos, como Branden explica primorosamente:

“Você não pode ter um direito natural a algo que outra pessoa tem que produzir. Você não pode ter um direito somente pelo fato de ter nascido, porque veja a posição em que isso coloca as pessoas de quem você coletará este direito, elas viram seus servos”.

Outro aspecto interessante em relação aos estudos de Branden refere-se à capacidade de responder às mudanças. Em seu discurso, ele compara a transição de duas eras – a de economia industrial, nos anos 1980, para a economia de informação, nos anos 2000.

“Estamos vivendo em um mundo em que o principal ativo de capital é o que carregamos entre as orelhas”.

Para o psicólogo, este novo mundo em que vivemos requer um nível mais alto de desenvolvimento psicológico do que em épocas anteriores. Há poucas décadas, a maioria dos trabalhos necessitava de um curto treinamento prévio, com posterior aplicação deste treinamento de forma quase monótona; com a era da informação, devido à rapidez com que o conhecimento tem se aprimorado, o mundo tornou-se um lugar cheio de oportunidades, porém também mais assustador – depende de como está sua autoestima e, portanto, sua resposta a essas mudanças.

“Uma das razões para o ressurgimento do fundamentalismo religioso, do tribalismo, do racismo, é que as pessoas estão assustadas”.

Na própria conceituação de autoestima, a palavra “confiança” é continuamente repetida, ela é peça-chave do próprio conceito. Em uma mente dominada pelo medo, há pouco espaço para a confiança. Os movimentos acima citados são movimentos coletivistas, que anulam o indivíduo. Com a perda da confiança no indivíduo e a atribuição externa das responsabilidades, a ideia de “grupos” se fortalece – inclusive de “grupos inimigos”. O medo aumenta a demanda por segurança – para isso, muitos estão dispostos a abrir mão da própria liberdade.

“Uma sociedade libertária requer um nível de maturidade psicológica mais alto que a requerida num estado de bem-estar social, ou numa sociedade socialista”.

A ideia de autorresponsabilidade e adaptação a mudanças são essenciais para uma sociedade libertária, que não se baseia em coerção, proteção ou privilégios estatais, e sim em voluntarismo. Infelizmente, como bem ressalta Braden, não nos preparamos para ela, pelo contrário: as crianças hoje tendem a ser criadas com um senso de merecimento inato, sem os instrumentos para lidar com a realidade econômica atual ou as oportunidades de uma sociedade livre.

“Uma das maneiras que considero úteis para fazer as pessoas ao menos entenderem o que é o Libertarianismo é construir pontes entre a arena em que elas entendem o que é autorresponsabilidade e mostrar como se aplica à área em que não pensaram em aplicar ainda”.

Finalmente chegamos à parte dos sapatos, que deu o título a este artigo. Branden pede que imaginemos que estamos no início da formação dos EUA e que chegou-se à conclusão de que o governo deveria ser responsável por prover sapatos para as pessoas. Isso pareceria óbvio, já que ninguém quer que os cidadãos andem descalços. Imagine então que um “radical maluco” dissesse: “Eu não acho que o governo deve prover sapatos, acho que deveríamos privatizar a questão dos sapatos”. As pessoas diriam: “Você está maluco? Não tem compaixão? Você quer um mundo de pessoas pobres e criancinhas andando descalças?”. Então Nathaniel Branden interrompe a imagem mental e diz: “Este é um erro que não cometemos”. Pelo acesso aos sapatos pelas diferentes classes sociais em todo o mundo, sabemos que ele está certo.

E você, quer um mundo em que as pessoas andem descalças?

*Psiquiatra

Faça uma doação para o Instituto Liberal. Realize um PIX com o valor que desejar. Você poderá copiar a chave PIX ou escanear o QR Code abaixo:

Copie a chave PIX do IL:

28.014.876/0001-06

Escaneie o QR Code abaixo:

Roberto Barricelli

Roberto Barricelli

Assessor de Imprensa do Instituto Liberal e Diretor de Comunicação do Instituto Pela Justiça. Roberto Lacerda Barricelli é autor de blogs, jornalista, poeta e escritor. Paulistano, assumidamente Liberal, é voluntário na resistência às doutrinas coletivistas e autoritárias.

3 comentários em “Você quer um mundo em que as pessoas andem descalças?

  • Avatar
    08/11/2014 em 1:13 pm
    Permalink

    Imagine um indivíduo, qualquer sexo, entre 30 e 40 anos, com uma patologia degenerativa de coluna (é sua carga genética – ele não tem culpa), entra em benefício no INSS e aí permanece por 3 anos. Recebe auxílio-doença, algumas vezes um pouco maior do que o salário que recebia na empresa. Ele vai concordar em ter alta do benefício, voltar a “ter de trabalhar”, para receber um pouco menos, cumprir horário e produção?
    Se o INSS der alta, entra com processo contra a Previdência, vai a nova perícia e, às vezes, retorna ao benefício por decisão judicial, mesmo contra decisões periciais (de peritos sérios).
    Pensem.
    Vejo isso toda a semana, várias vezes.

  • Avatar
    06/11/2014 em 10:15 pm
    Permalink

    Muito bom! Náo poderia ser mais didático.

  • Avatar
    06/11/2014 em 3:22 pm
    Permalink

    Brilhantíssimo!!!!!!!!!!!!

Fechado para comentários.

Pular para o conteúdo