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Verdades inconvenientes sobre o intervencionismo de John McCain

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Noto que após as eleições americanas e todos os conflitos recentes que vão desde a vitória do Joe Biden até as teorias conspiratórias que alegavam que a eleição teria sido fraudada e que resultaram na invasão ao Capitólio, surgiu uma nova idolatria na Internet (tanto no Brasil quanto nos EUA): a idolatria e misticismo em torno do finado senador republicano e candidato à presidência dos Estados Unidos John McCain.

Não faltam comentários nas redes sociais por parte de liberais e conservadores alegando que McCain era o “conservador do bem”, o republicano de que os Estados Unidos precisam, um sujeito moderado e prudente, etc. Como todo tipo de idolatria, esta também é problemática e pautada em inverdades.

Nisso fica a dúvida: será que eles realmente conhecem o verdadeiro John McCain?

John McCain era um ex-oficial da Marinha americana, tendo lutado na guerra do Vietnã e sendo considerado pela população do Arizona um herói de guerra. Elegeu-se senador em 1987 e perdurou no cargo até 2018, quando faleceu em virtude de um câncer no cérebro. Foi também candidato à presidência dos Estados Unidos pelo Partido Republicano em 2008, sendo derrotado pelo democrata Barack Obama.

Além da sua biografia, quem era o John McCain, qual sua ideologia e o que ele defendia como político?

McCain era um neoconservador no sentido correto do termo (não no sentido banalizado que vigora no Brasil). Partia da crença de que os Estados Unidos eram a maior democracia do mundo e que deveriam espalhar suas políticas para o “terceiro mundo” nem que fosse por meio da força. Defendia os Estados Unidos como a polícia do mundo. Era um belicista e um belicista muito mais radical do que seu colega de partido George W. Bush.

Em 2000, ainda antes de o Bush se eleger e antes de a guerra ao terror se iniciar, McCain era candidato à presidência nas primárias republicanas (sendo derrotado pelo George Bush) e já defendia abertamente uma intervenção no Iraque, dizendo que era necessário os Estados Unidos invadirem o país para derrubar o presidente Saddam Hussein. Ele pregava também que o país deveria invadir a Líbia e a Coreia do Norte, além de ter defendido que os EUA deveriam treinar e armar grupos rebeldes nesses países (algo que já foi feito diversas vezes e resultou tanto no surgimento da Al-Qaeda no século XX e quanto no do ISIS durante o governo Obama), demonstrando-se muito mais radical que o seu então concorrente (e futuro presidente).

Em 2001, após o atentado do 11 de setembro, ele apoiou a invasão ao Afeganistão (mesmo o país não tendo nada a ver com o atentado) e, em 2005, ele comemorava os resultados da invasão, mesmo já sendo de conhecimento público que a Al-Qaeda agiu de forma independente no atentado.

Em 2003, ele obviamente votou a favor da invasão ao Iraque (guerra que gerou mais de 500 mil vítimas), sendo descrito como mais radical que o próprio presidente Bush nessa questão.

Já em 2008, durante as eleições presidenciais contra o democrata Barack Obama, McCain era o grande defensor do belicismo como método geopolítico. Quando perguntado sobre quanto tempo os Estados Unidos deveriam permanecer no Iraque, McCain falou abertamente que se dependesse dele o Estados Unidos continuariam mais 100 anos naquele país.

Após as eleições, McCain surpreendeu, mostrando-se bastante alinhado com o então presidente Barack Obama no que tange à política externa. Apoiou uma intervenção americana na Líbia em 2011 para derrubar o ditador Muammar Gaddafi, indo visitar grupos rebeldes na região (vale lembrar que tais grupos são tão autoritários quanto o ditador em questão).

McCain apoiou também a guerra civil síria. Visando a depor Bashar Al Assad, McCain defendeu também o armamento dos grupos rebeldes sírios, que em alguns casos são até mais radicais do que o próprio Assad – e vale ressaltar que esse armamento de alguns grupos foi o que acabou gerando a formação do Estado Islâmico.

Como podemos ver, McCain era um típico belicista, sem o menor apreço por uma política externa liberal e que faz liberais como Hayek se revirarem no túmulo sempre que algum dito liberal o exalta (ler: Socialism and war).

McCain e os neoconservadores também estão entre os culpados pela ascensão do trumpismo dentro do partido republicano, que surge como uma resposta ao belicismo e intervencionismo dos republicanos tradicionais, defendendo uma retirada massiva das tropas americanas do Oriente Médio e com um discurso extremamente populista. McCain e Bush certamente estão entre os culpados pelo que o Partido Republicano é hoje.

Não pensem que os posicionamentos eram antiliberais somente em matéria de política externa; vamos conhecer os outros posicionamentos do McCain.

John McCain era radicalmente contra o casamento gay e a adoção por parte de casais homossexuais. Ele também era contra a legalização das drogas. Já para os que acham que McCain seria um conservador ponderado e sensato, ledo engano. McCain na campanha de 2008 defendeu teorias anti-vacina, alegando que vacinas causariam autismo e popularizando toda uma onda negacionista que perdura até hoje no país.

Em economia, McCain era um típico centrista. Na avaliação feita pelo Almanaque de política americana de 2008, McCain foi classificado como 53% conservador e 47% liberal. Vale ressaltar que nos Estados Unidos a palavra “liberal” não significa liberal, mas sim algo similar a social-democrata, enquanto os “conservatives” são a favor da liberdade de mercado. McCain era bem moderado na questão econômica, aderindo tanto a posições democratas (mais estatizantes) quanto republicanas (liberalizantes).

Como podemos ver, McCain era antiliberal em todos os aspectos, seja em questões políticas, econômicas ou diplomáticas. Está muito distante de republicanos que de fato acenam para ideias liberais, como Rand Paul, Marco Rubio, Mike Lee, Thomas Massie e outros.

Nisso fica a dúvida: qual a razão para um liberal ou conservador idolatrar o John McCain ou dizer que “na época do McCain tudo era melhor”? Recentemente, certos liberais ressuscitaram e compartilharam o discurso do McCain reconhecendo a derrota nas eleições 2008 e parabenizando o Obama. De fato, um belo discurso; ao contrário do Trump, ele não era um mau perdedor; mas isso não é o suficiente para tanta idolatria.

O fato de ele se ter notabilizado como o anti-Trump do Partido Republicano não muda o que ele defendia, nem o torna alguém moderado, não o torna alguém passível de ser idolatrado.

McCain deve ser visto como aquilo que ele era: um ser humano com erros e acertos. Ele foi um herói de guerra e teve seus méritos no combate ao trumpismo dentro do Partido Republicano. Isso está consolidado na História e nada poderá apagar; mas seus erros e defeitos também estão registrados e não podemos desconsiderá-los.

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Lucas Sampaio

Lucas Sampaio

Advogado, assistente jurídico do ILISP, conselheiro do Instituto Liberal e fundador da Juventude Libertária de Sergipe.

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