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Produtividade: as empresas brasileiras precisam de mais competição

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Um tema que considero central para a economia brasileira e que eu sempre coloco em destaque nas palestras que apresento pelo Brasil é a questão da produtividade. Nas apresentações começo o tema comparando o desempenho da produtividade no Brasil, na Coreia do Sul e nos EUA. Deixo claro que comparar com a Coreia é apelação, mas que é válido por ilustrar a diferença entre o crescimento da produtividade em um país que deu certo no processo de convergência para um país rico e em um país que não conseguiu completar esse processo. A comparação está na figura abaixo.

As linhas foram feitas de forma que todos os países começam de cem em 1970; dessa forma, a figura não diz nada sobre o nível da produtividade e só serve para comparar crescimento da produtividade nos três países. O que se espera de um país emergente que entre em trajetória de crescimento é um crescimento da produtividade maior que o observado nos EUA. Uma das explicações para isso é que nos EUA a produtividade cresce apenas com a criação de novas tecnologias, enquanto em um país emergente o crescimento da produtividade pode ocorrer por conta de novas tecnologias e/ou adoção de tecnologias já existentes. A Coreia é um bom exemplo de país que conseguiu um ritmo de crescimento da produtividade superior ao dos EUA. Países com um crescimento de produtividade entre a linha azul, que representa o crescimento da produtividade nos EUA, e a linha marrom, que representa o crescimento da produtividade na Coreia, também podem ser chamados de casos de sucesso. Países com a linha de crescimento da produtividade abaixo da linha azul estão com problemas. É o caso do Brasil, onde o crescimento da produtividade é representado pela linha verde. Note que nossa produtividade em 2014, último ano da série, é menor que em 1970. Outras fontes de dados dão resultados menos drásticos, mas o padrão de quase estagnação é o mesmo (para quem se interessar pelo tema, ver o link aqui).

Comparações com mais países reforçam a tese de que a produtividade no Brasil é baixa. Na figura abaixo, comparo o Brasil com os países de renda média alta com mais de cinco milhões de habitantes que constam nas bases de dados do Banco Mundial e da Penn World Table. Dos dezenove países da amostra, apenas Paraguai, Tailândia e China possuem produtividade menor que a do Brasil. Fica pior: nos três países menos produtivos que o Brasil, a produtividade cresce mais do que por aqui. No caso da China, tal como a Coreia do passado, a produtividade cresce mais do que a dos EUA.

A verdade é que hoje existem poucos economistas que discordem de que a produtividade no Brasil é baixa e cresce pouco e que esse é um dos maiores, se não o maior, desafio para que tenhamos uma trajetória de crescimento de longo prazo que nos aproxime de países ricos. Se hoje existe pouca polêmica quanto ao diagnóstico, o mesmo não pode ser dito em relação ao tratamento. Uma lida em blogs e colunas de jornais assinadas por economistas interessados no tema apresenta uma série de soluções para a questão; algumas dessas soluções são complementares, outras podem até ser excludentes. Não é difícil encontrar textos colocando capital humano, infraestrutura, estímulo à indústria de transformação e uma série de outras medidas que isoladamente ou combinadas podem resolver o problema da nossa baixa produtividade. Cada uma dessas variáveis pode contar parte da história (tenho dificuldades de comprar a tese da indústria de transformação, mas isso é assunto para outro artigo), mas creio que sem um ingrediente chave nenhuma medida vai resolver o problema. O ingrediente a que me refiro é competição.

Edward Prescott, prêmio Nobel de Economia em 2004, afirma que a principal causa para explicar o desempenho da produtividade é o grau de resistência à adoção de novas tecnologias e ao uso eficiente das tecnologias existentes. Esse grau de resistência está associado a arranjos institucionais de uma determinada sociedade (link aqui). O grau de competição entre as firmas é uma das peças fundamentais desse arranjo. Em uma sociedade com pouca competição entre firmas, os incentivos para adotar tecnologias e usar de forma eficiente as tecnologias existentes podem ser de tal monta que a firma prefira ser ineficiente. Tanto adotar tecnologias novas quanto usar tecnologias de forma eficiente tem custos e sem a pressão de um concorrente pode não ser interessante incorrer em tais custos para ganhar eficiência.

Se aceitarmos a tese de que competição é a chave para o crescimento da produtividade, deixo essa decisão para cada leitor; o principal desafio para resolver nosso problema de baixa produtividade é aumentar a competição entre as firmas brasileiras. O aumento da competição pode ocorrer por meio de forças internas e/ou externas. Por forças internas falo de facilitar a entrada de novas firmas no mercado brasileiro; por forças externas falo de abrir a economia para que nossas empresas tenham de competir com empresas em outros países. Estamos mal nos dois critérios.

O ambiente de negócios do Brasil está longe do ideal, de fato pode ser considerado hostil (link aqui). Em relação à facilidade de fazer negócios, ocupamos a 109º posição em uma lista de 190 países. Estamos entre Papua-Nova Guiné e o Nepal. Para que o leitor tenha uma melhor ideia de nossa posição, registro que o México aparece no 54º lugar, o Chile no 56º, a Colômbia está na 65º posição e o Peru na 68º. A China está na 46º posição. No quesito “começar um negócio”, estamos na 140º posição, para conseguir permissão para construção nossa posição é a 175º e para pagar impostos estamos na 184º posição. A figura abaixo compara o Brasil com os países de renda média alta nos vários quesitos analisados; na maioria deles estamos abaixo da média do grupo. Para aumentarmos a competição interna, é urgente fazer reformas que melhorem o ambiente de negócios e reduzam as barreiras à entrada de novas firmas no mercado.

A outra opção para aumentar a competição é abrir a economia. Tratei do tema em meu blog (aqui e aqui). A figura abaixo mostra a tarifa média no Brasil comparada com a de outros países de renda média alta. Os links que coloquei mostram outros critérios de abertura da economia. É fácil constatar que estamos bem acima da média no quesito protecionismo. Dos países listados na figura abaixo, apenas Irã e Venezuela possuem tarifas médias maiores do que a nossa.

Sempre que falo em abrir a economia aparece alguém dizendo que isso seria o tiro de misericórdia na indústria nacional. Essa é uma discussão gigantesca que foge ao propósito desse artigo, mas vale registrar que o padrão de queda da participação da indústria de transformação no PIB, seja lá o que isso estiver medindo, está presente na América Latina, mas no México, desde 2005 o padrão não aparece. A figura abaixo ilustra esse fenômeno. Para quem não lembra, em 2005 nossos defensores da indústria comemoram a implosão do tratado que criaria o livre comércio em toda a América, deixando o acordo restrito aos países da América do Norte. É curioso que em 2018 López Obrador, o presidente esquerdista do México, queira manter o tratado, enquanto Donald Trump, eleito pelo Partido Republicano, quer rever o tratado, alegando que o México está tomando empregos industriais dos EUA. Talvez abertura não faça tão mal à indústria como pensam alguns aqui pelo Brasil.

Um último ponto interessante diz respeito ao timing das reformas. Os economistas Jose Asturias, Sewon Hur, Timothy Kehoe e Kim Ruhl argumentam que a ordem das reformas importa (link aqui). Segundo eles, o ideal seria primeiro abrir a economia e depois facilitar a entrada de novidades no mercado. A abertura coloca um filtro mais restritivo nas empresas que vão sobreviver no mercado; empresas pouco produtivas podem ser expulsas pela competição das empresas estrangeiras. Se isso for verdade, uma agenda de reformas que primeiro facilite a criação de empresas e depois faça a abertura da economia pode gerar frustrações à medida que algumas das empresas criadas serão expulsas do mercado após a abertura*. Não sei com certeza o quanto desse argumento pode ser aplicado ao Brasil, mas estou convicto de que devemos fazer as reformas necessárias para aumentar o grau de competição no Brasil. Sem isso, temo que outras medidas adotadas para estimular a produtividade não tenham o sucesso desejado e até acabem atrapalhando.

*No artigo o argumento vai na direção de que, se a abertura vier primeiro,empresas menos produtivas não vão nem chegar a entrar no mercado. Isso ocorre porque os autores não modelam a decisão de a firma sair do mercado. De toda forma vale que abrir primeiro e depois facilitar a entrada tem um impacto maior que a ordem contrária por conta do filtro a empresas pouco produtivas que é imposto pela abertura.

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Roberto Ellery

Roberto Ellery

Roberto Ellery, professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB), participa de debate sobre as formas de alterar o atual quadro de baixa taxa de investimento agregado no país e os efeitos em longo prazo das políticas de investimento.

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