Sobre Carlos Lacerda e a livre iniciativa
“Faltava na vida brasileira a presença de uma aliança política que afirmasse, com essa clareza, o seu apreço pela iniciativa individual. O medo de parecer liberal é tamanho que muitos acabam por se tornar, na prática, inimigos da liberdade. (…)
Quando o vice-presidente Café Filho (…) critica esse hábito tão brasileiro, falta apenas acrescentar o que o sr. Café Filho deixou de dizer desde 1950: quem agravou esse mal foi o inventor do mito do ‘Pai dos Pobres’, o criador do Estado Novo, que é o Estado Papai Noel dos discursos e o Estado Papão das perseguições e das torturas. O Estado não dá para tudo.
Deve, pois, concentrar-se no que tem ele mesmo de fazer porque o particular não encontraria estímulos ou recursos para fazer.
(…) A livre iniciativa, assim revista e atualizada, é a grande novidade a aplicar a este país. Tudo o que ele é, tudo o que ele, apesar de tudo, vai sendo, deve à livre iniciativa. Basta um exemplo: São Paulo. Desde a imigração à energia elétrica, e podemos ir mais longe: desde o desbravamento dos sertões, pois as bandeiras e entradas nada mais foram do que epopeias do homem, à margem e, em tantos casos, até contra o Estado, em busca de espaço e riqueza.
O que acontece é que este país tem vivido assombrado por frases feitas, por tiradas de sobremesa, por ideias mal digeridas e conceitos de farsantes e simuladores de cultura, a serviço das ambições caudilhescas de um primário dotado de astúcia política – e somente disso, pois de outra coisa não cuida senão de aplicar esse dom nefasto. Valorizar a iniciativa privada é, pois, um ponto programático da maior atualidade e importância. Basta ver a reação que vai surgir contra ela – e ver de onde partirá.” (Trechos de artigo publicado por Carlos Lacerda na Tribuna da Imprensa de 12 de julho de 1954, replicados na p. 202 de meu livro “Lacerda: A Virtude da Polêmica”)