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O universo paralelo onde as coisas não são chamadas pelo que elas são

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Com o mundo em choque pelos aberrantes atos praticados pelo Hamas contra civis israelenses, essa tragédia tem especial repercussão no Brasil, visto que o palco da principal chacina ocorrida foi numa festa que contou com a participação do pai do DJ brasileiro Alok, chamada “Universo Paralello”.

Ironia das ironias, estamos vivendo neste país, de fato, um universo paralelo, onde as coisas não são chamadas pelo que elas são — especialmente pela imprensa pátria.

De acordo com a teoria da linguagem, os conceitos que exprimem o significado de cada palavra são criados e compreendidos por meio de um processo complexo que envolve a cognição, a experiência sensorial, a cultura e a interação social. Por mais que um indivíduo tenha uma relação pessoal com as palavras e seus significados, seja por experiência sensorial, abstração racional, contexto ou associatividade, para a formação geral do sentido da palavra, é necessária uma convenção linguística, ainda que natural, com a sociedade definindo e aceitando o significado por meio de acordos culturais. A linguagem não é dada, é construída, e dentro de um processo mais social do que individual.

Vivemos em tempos de alta polarização e retórica inflamada, especialmente no cenário político. Uma tendência que tem se intensificado nos últimos anos é o uso de rótulos carregados de significado para descrever atos e pessoas, muitas vezes de maneira imprecisa e desproporcional, com fins de confundir e distorcer a realidade presente, em especial com os termos “genocida” e “terrorista”, ignorando a construção social em prol de significados que são particulares apenas para um determinado grupo de pessoas politicamente enviesadas.

Sobre genocídio

O título “genocida” tem sido frequentemente utilizado pela esquerda brasileira, seja políticos ou imprensa, para descrever o ex-presidente Jair Bolsonaro, o que é uma alegação extremamente séria e controversa. O termo “genocídio” é definido pela Convenção de 1948 para a Prevenção e a Punição do Crime de Genocídio como atos cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso. Enquadrar um ex-presidente como genocida exige uma base factual sólida, demonstrando que ele realizou tais atos com a intenção de causar destruição em massa de um grupo específico.

A alegação base desse grupo social é a de que Bolsonaro teria sido contrário à vacinação durante a crise sanitária da covid-19. Ainda que partíssemos desse pressuposto, que é um ponto controverso, a mera postura pessoal de um então presidente contra o uso e aplicação de determinadas vacinas em favor de medicamentos com eficácia duvidosa não é causa suficiente para enquadrá-lo no crime de genocídio. Não ocorre subsunção do fato realizado ao tipo penal descrito na convenção, ainda mais em um cenário onde vacinas, de todos os tipos e empresas, foram compradas e aplicadas em tempo recorde.

A utilização desse termo sem fundamentação compromete a seriedade do debate político e enfraquece a luta contra o genocídio real, tais como os promovidos pelos membros do Hamas contra a população israelense. Matar mais de mil pessoas, apenas e tão somente motivados pelo fato de esse grupo ter como característica étnica ser judeu e característica nacional de israelense se coloca perfeitamente ao artigo segundo da convenção contra o genocídio.

Um grupo genocida

O Hamas é, por definição de convenção internacional, um grupo genocida, com esse adjetivo já tendo sido reconhecido por muitos países importantes, como Estados Unidos, Canadá e membros da União Europeia, mas não o Brasil.

Outro exemplo bizarro é a aplicação do termo “terrorista” para descrever os elementos envolvidos nos eventos de 8 de janeiro em Brasília. De acordo com a Resolução 1566 (2004) do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), terrorismo é definido como “atos criminosos destinados a provocar um estado de terror no público em geral, num grupo de pessoas ou em determinadas pessoas a fim de intimidar uma população ou obrigar um governo ou uma organização internacional a fazer algo, ou a se abster de agir”.

Quando a esquerda brasileira, dentro e fora da mídia tradicional, rotula os atos de 8 de janeiro como terrorismo, está banalizando o termo e o desvirtuando de sua real gravidade. A imprensa se recusa a aplicar o apropriado termo de terrorista ao que eles chamam de “combatentes” do Hamas, esses sim causando terror com assassinatos, degolas de bebês, estupros de mulheres de todas as idades e várias outras atrocidades, enquanto usa esse rótulo para pessoas que nada disso fizeram.

A Justiça brasileira, por meio do Supremo Tribunal Federal (STF), com ministros embebidos nas suas próprias vaidades e no fato de terem, de fato, sido vítimas de crime de dano, ultrapassa o tipo penal cometido pelos manifestantes para aplicar a eles os crimes de “abolição violenta do Estado Democrático de Direito” (art. 359-L) e “golpe de Estado” (art.359-M), ambos insculpidos no Código Penal brasileiro. Reforçam, assim, o mau uso de expressões muito graves com condenações fora do padrão legal.

Mais uma manifestação imprecisa

A mais clara manifestação da imprecisão e da parcialidade do julgamento se dá nos arroubos do ministro Alexandre de Moraes ao tentar enquadrar o ministro André Mendonça ao dizer que “o plenário do STF foi destruído”, ou quando admoesta o ministro Nunes Marques ao dizer que “a cadeira dele foi parar na praça”, chantageando emocionalmente julgadores que deveriam trabalhar tão somente com a razão.

Resta clara e correta a tese de Marques de crime impossível, ou seja, não pode haver condenação quando os meios dispostos para a prática do crime não são hábeis para o fim descrito no tipo penal. Se cidadãos desarmados não podem abolir violentamente o Estado Democrático de Direito e praticar golpe de Estado, então somente no direito do universo paralelo é que essas condenações têm procedência constitucional e legal.

Chamar danificadores de patrimônio público de “terroristas”, e, pior, condená-los por subversão, sem evidência clara de motivação terrorista, enquanto o governo brasileiro se recusa a declarar o Hamas, esse sim, como grupo terrorista, é uma evidente seletividade política fruto de um enviesamento ideológico, ou mesmo questões de cunho pessoal, e não deveria acontecer em um Estado Democrático de Direito, onde o império da lei deve prevalecer sobre as vontades pessoais.

O que esperar de tudo isso?

Mas o que se esperar de um presidente que, ao ser eleito, teve congratulações oficialmente expressas por esse grupo terrorista? Sem contar que, em 2010, no segundo mandato de Lula, esse movimento palestino recebeu “ajuda internacional” milionária vinda do governo brasileiro.

Para sairmos do universo paralelo em que nos encontramos, é fundamental que chamemos as coisas pelo que elas são com base em fatos e nas convenções sociais, evitando generalizações simplistas e rótulos carregados de emoção. Devemos buscar uma discussão construtiva que promova a compreensão, o respeito pelos direitos humanos, a solução pacífica de conflitos e, se for o caso, administrar conflitos de guerra sempre dentro dos parâmetros da Convenção de Genebra.

Assim, quem sabe, a “passada de pano” feita por movimentos, pensadores e mídias de esquerda a genocídios praticados por grupos terroristas, como no caso do Hamas no “universo paralelo”, nunca mais venha a ocorrer no nosso universo real, feito de pessoas reais, que sofrem e morrem de verdade como vítimas nas mãos desses seres monstruosos.

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Bernardo Santoro

Bernardo Santoro

Mestre em Teoria e Filosofia do Direito (UERJ), Mestrando em Economia (Universidad Francisco Marroquín) e Pós-Graduado em Economia (UERJ). Professor de Economia Política das Faculdades de Direito da UERJ e da UFRJ. Advogado e Diretor-Executivo do Instituto Liberal.

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