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O que é contrato social e qual sua relação com as ideias liberais?

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“Se o contrato social existe, porque eu nunca assinei ele?”. Esta frase me aterroriza, tanto pela ignorância de quem a pronuncia quanto pela mentalidade cartorial de parte dos anarco capitalistas brasileiros em achar que o contrato social é um papel timbrado pela comarca de sua cidade representada por um juiz.

O termo contrato social se refere a um conjunto de teorias políticas que tentam explicar os caminhos que levam as pessoas a formarem Estados e/ou manterem a ordem social. Essa noção de contrato traz implícito que as pessoas renunciam a certos direitos para um governo ou outra autoridade de modo a obter as vantagens da ordem social. Nesse prisma, o contrato social seria um acordo entre os membros da sociedade, pelo qual reconhecem a autoridade, igualmente sobre todos, de um conjunto de regras, de um regime político ou de um governante.

“Mas eu não assinei nada”, “Eu não renunciei à minha liberdade”, “Eu não reconheço o Estado”. Esta questão se torna secundária na ordem do contrato social e em explicar o que é o mesmo, pois, como a filosofia objetivista de Ayn Rand nos ensina, não é porque você deseja algo que a realidade se contorna à sua vontade. Antes de você tomar conhecimento de ordens sociais e do conceito de poder e Estado, você já estava incluso num mundo que segue esta ordem desde que a humanidade passou a se organizar em sociedade, há mais de 6 mil anos. Se você pode subverter sua ordem, renunciar ao modelo social, não é o assunto deste artigo.

Para entendermos melhor, é considerável revisitar as obras que trataram do tema pela primeira vez. O Leviatã é uma obra que indico para ajudar na compreensão do nascimento da doutrina liberal, visto que o contratualismo é um tema primário para a concepção liberal.

O Leviatã; Thomas Hobbes – Thomas Hobbes é um filósofo da era humanista, porém seu Magnus Opum, O Leviatã, se torna a obra primária para as primeiras concepções do liberalismo concreto de John Locke mais à frente. Hobbes teorizou que o governo é o resultado de ações individuais e traços humanos, e que foi motivado principalmente pelo “interesse”, um termo que se tornaria crucial no desenvolvimento de uma teoria liberal de governo e economia política, visto que é o fundamento da ideia de que os indivíduos podem ser autogovernados e autorregulados. Sua obra não defende esse ponto de vista, mas, em vez disso, que apenas um governo forte poderia conter os interesses irrestritos: ele, no entanto, avançou em uma posição proto liberal ao defender um “direito da natureza” inalienável, o direito de se defender, mesmo contra o Estado. Embora sua própria posição ideológica esteja aberta ao debate, seu trabalho influenciou Locke, Hamilton, Jefferson, Madison e muitos outros liberais, levando Lévi-Strauss a identificar Hobbes como o “pai do liberalismo”.

Para Hobbes, o ser humano em estado de natureza era dotado da capacidade de ser predador do outro; por isso, para ele, um governo forte seria capaz de limitar a ação natural dos homens, promovendo a paz pela racionalidade.

Dois Tratados Sobre o Governo; John Locke – Um pai do liberalismo mais consolidado, John Locke pode ser considerado de fato o primeiro liberal. Influenciado pela concepção de contrato social e do Leviatã de Hobbes, Dois Tratados Sobre o Governo sintetiza o entendimento do Estado no liberalismo pela primeira vez. O Primeiro Tratado refuta as ideias de Robert Filmer, sistematizador do patriarcalismo, enquanto o Segundo Tratado delineia a teoria política da sociedade civil baseada no direito natural e na teoria do contrato social. Essa obra propõe o estabelecimento de um acordo entre governantes e governados que tem como base um conjunto de leis escritas. Diferentemente de Hobbes, John Locke acreditava que o estado natural era o de igualdade e paz. Os Direitos naturais eram: o direito de vida, liberdade, propriedade e resistência à tirania.

Para manter esses direitos naturais, era necessário um governante que respeitasse o desejo da maioria. Caso o governante coloque em risco os direitos naturais, o povo tem direito de resistir e fazer uma revolução.

Para Locke, o estado de natureza não é apenas uma construção teórica, ele sempre existiu. Locke entendia que no estado de natureza as pessoas eram submetidas à Lei da Natureza, o que era possível porque elas eram dotadas de razão. Nesta Lei da Natureza, cada indivíduo poderia fazer o papel de juiz e aplicar a pena que considerasse justa ao infrator. Essa arbitrariedade individual é um dos principais motivos de as pessoas buscarem entrar num estado civil, discordando de Hobbes de que o homem seria um predador de si mesmo em estado de guerra constante.

Do Contrato Social; Jean Jacques Rousseau – Rousseau influenciou, posteriormente à sua vida, os socialistas utópicos franceses, base da inspiração socialista de Karl Marx, e sua doutrina segue longe dos padrões liberais da modernidade. Porém, em seu tempo, esta obra foi parte da corrente iluminista francesa e ajuda a compreender conceitos filosóficos relevantes do liberalismo, como a concepção antropológica de Immanuel Kant, relevante contribuidor do Estado liberal de Direito, conforme o professor Antônio Paim coloca em seu livro História do Liberalismo.

Rousseau neste livro vai na contramão da tradição contratualista inglesa e afirma que o homem na natureza vive o seu estado de bondade, onde está desprovido de posses, numa espécie de propriedade moldada à sua vontade. A partir da delimitação da propriedade privada, surgiria a necessidade de socialização para o estabelecimento de limites e, portanto, estar-se-ia entrando em guerra generalizada.

Nos Limites da Ação do Estado; Wilhelm von Humbolt – Livro mais complexo de encontrar, disponibilizado apenas em inglês e alemão. Neste, o filósofo alemão do século XVIII discorre sobre como um Estado que transpassa suas funções primordiais acaba sendo danoso ao cidadão ao destruir sua liberdade e criatividade, tornando-se contrário ao que se propõe: proteger os seus cidadãos da repressão arbitrária.

Seu livro inspirou a filosofia liberal de John Stuart Mill.

Desobediência Civil; Henry David Thoreau – Neste livro, o americano Henry David Thoreau discorre sobre o papel do governo sobre a consciência de seus cidadãos e sobre os deveres do mesmo. Thoreau defende neste livro pela primeira vez o conceito de Desobediência Civil, um boicote a ser promovido contra o governo diante de uma lei considerada injusta – no caso de Thoreau, a escravidão e os impostos cobrados para patrocinar a Guerra Americano-Mexicana.

Os ensinamentos de Thoreau mais tarde influenciaram movimentos mundiais como A Marcha dos Direitos Civis de Martin Luther King e a Independência da Índia. Thoreau também pode ser considerado um dos pais do conceito de objeção de consciência.

*Artigo publicado originalmente na página Liberalismo Brazuca no Facebook.

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