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Outra aula sobre Fusionismo

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Filipe Rangel Celeti*

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Sinto-me incomodado quando os debates virtuais limitam-se a duas coisas: “Você não me entendeu” e “Você é muito idealista”. Dito isto, gostaria de encerrar minha participação esclarecendo o que pode não ter ficado claro. Para tal, volto a explicar o que seja fusionismo e o motivo de rejeitá-lo.

 

O Fusionismo

Resumidamente, o fusionismo é uma corrente de pensamento. Isto significa, um conjunto de ideias que advoga, antes de mais nada, teoricamente, uma fusão entre o tradicionalismo, o conservadorismo social e o libertarianismo de direita. Principalmente, como Altamir colocou em sua tréplica, o pensamento de Frank Meyer.

O que Meyer defende é uma sociedade que saiba balancear a tensão entre liberdade e tradição, visto que uma sociedade livre iria apenas funcionar se estivesse baseada na virtude.

Desta posição teórica, decorrem ações práticas, ou seja, uma aliança política real na qual libertários e conservadores se unam tendo como objetivo a realização de mudanças políticas reais.

 

Contra o fusionismo teórico

Ao escrever sobre as diferentes correntes do pensamento libertário deixei implícito, para quem quisesse entender, que o fusionismo não se sustenta teoricamente com “todo” o pensamento libertário. Altamir diz ter escrito sobre “as variantes mais comuns de se encontrarem no Brasil e com mais adeptos”. Ele não falou de variantes, disse apenas “libertarianismo defende isso”. O que mais encontro no movimento libertários são discordâncias. Baseado em que se pode afirmar qual corrente libertária possui mais adeptos? Alguns colegas, rothbardianos radicais como quem vos escreve, talvez apareçam um pouco mais por conta da polêmica. Poucos apoiam a ideia de tutela dos filhos publicamente e o tema é pouco aceito pela maioria dos leitores da Ética da liberdade. O pensamento de Meyer é anti-utilitário. Muitos libertários são utilitaristas. Basta ler os artigos do Portal Libertarianismo e do Mercado Popular para perceber isto.

Além disto, o pensamento de Meyer foi rejeitado por conservadores e libertários.

Russel Kirk rejeitou uma aliança entre conservadorismo e libertarianismo. Para ele tal aliança seria tentar juntar gelo e fogo[1]. Para Kirk não há nada em comum entre conservadores e libertários. Para ele, as pessoas inteligentes do movimento libertário que entenderem que política é a arte do possível irão tornar-se conservadoras, prevê. Kirk concordaria comigo quando disse que a fusão entre libertarianismo e conservadorismo seria abandonar o libertarianismo para vestir a camisa conservadora.

Outros conservadores também criticaram Meyer por ser um ideólogo da liberdade e advogar um individualismo radical.

Murray Rothbard escreveu sobre o pensamento de Meyer e sobre o fusionismo[2]. Para ele, os tradicionalistas não compreenderam que o libertarianismo é uma visão política, sem prescrição moral. A liberdade do libertário não é o fim máximo, mas necessária para que os homens possam buscar os fins que desejarem. Resumidamente, Rothbard defende a ideia de que Meyer seja apenas um libertário que, por alguma confusão, tenha tentado uma suposta síntese com o conservadorismo. O individualismo meyeriano o coloca para longe dos conservadores e sua defesa da “comunidade”. Além disto, o libertarianismo de Meyer discorda de diversos pontos dos conservadores sobre o que seja liberdade, ordem natural e o papel do Estado. Com isto, não haveria fusionismo algum, apenas um libertarianismo falho.

Outra crítica libertária ao fusionismo seria afirmar que muitas posições libertárias se aproximam de posições progressistas. Realizar uma fusão com a liberdade econômica na qual os conservadores concordam seria fechar as portas para um diálogo com a esquerda. Fundir seria impedir avanços das liberdades individuais.

 

Contra o fusionismo prático

Além dos problemas teóricos, há problemas práticos. Basta observar os resultados políticos do fusionismo na política norte-americana. Os fusionistas ampliaram o Estado, intensificaram ações militares no exterior e aumentaram o controle sobre a educação. Um advogado da liberdade não consegue compactuar com isto. Eis a explicação para uma enorme evasão de libertários do partido republicano durante a gestão Bush.

Falou-se sobre uniões pontuais. Ora, nenhum libertário é contra políticas que diminuam o tamanho do Estado. Apoiar ações concretas para a realização de tal diminuição é algo que toda pessoa de bom senso deveria fazer. Isto significa, apoiar conservadores, progressistas e quem mais que, por um lampejo de consciência, tenha entendido que as pessoas não precisam ser dirigidas em suas vidas privadas e em suas interações sociais.

Este tipo de apoio, entretanto, não é fusionismo.

Estamos em ano eleitoral e a apologia de tal fusão tem a finalidade clara de convocar os libertários, adeptos da não participação eleitoral, a apoiarem aqueles que tenham um pouco de liberdade em seus discursos e programas. Entendo o medo que paira sobre os conservadores e os pesadelos que possuem por conta de uma possibilidade de venezuelizacão do Brasil. Apesar disto, não precisa forçar tal união. Libertários não são ingênuos e massa de manobra de implantação de uma conservadorização moral.

O conservador pode ser anti-aborto por compreendê-lo enquanto assassinato. Os libertários também são contra matar inocentes, mas também são a favor de cada um ser dono de seu corpo. Neste conflito, há uma posição chamada “eviccionismo”. A mãe pode retirar o bebê, mas não pode matá-lo. Bem possível que tecnologicamente seja possível gestar bebês em úteros artificiais, possibilitando tal posição.

O conservador é contra as drogas por birra. Ignora todos os dados para se agarrar ferrenhamente à ideologia que possui (quem que são os dogmáticos, utopistas, adoradores de panaceias?). Todos os dados mostram que com a legalização diminuem os crimes, a violência e, no longo prazo, os usuários.

Obviamente que há muito pelo o que lutar e muitas batalhas são conjuntas. Isto não significa que os libertários irão abandonar o que defendem em nome de uma unidade com aqueles com os quais discorda e com aqueles que não evitam, uma vez sequer, de taxá-los de malucos sectários.

A verdade é que os jovens têm deixado de ser conservadores. Os libertários têm a linguagem e o espaço no qual floresce muito do interesse por política no Brasil. A nossa juventude está na mira de muitas aves de rapina. Todo cuidado é pouco para que nossos libertários não se percam no belo discurso de gestão eficiente, perdendo a direção no furor da possibilidade de governar os outros.

 

Conclusão

O que deveria ter ficado claro na aula anterior era: “tenha perícia na hora de conceituar”, “estude o libertarianismo e suas diversas correntes”, “o fusionismo não é bom para os libertários”. Espero que este texto tenha servido como complemento para o terceiro ponto.

O debate não é uma questão de errar ou de não entender. Se exortei no outro texto foi para que se pudesse melhorar enquanto escritor. Como todos podem perceber, minha tréplica não é nada mais do que a explicação didática do fusionismo ser ruim. Do outro lado buscou-se autores libertários escrevendo sobre conservadorismo (o conservadorismo do Hoppe é diferente do de Kirk e de Burke. É uma tentativa de tornar conservadores em libertários.).

Talvez o grande problema tenha sido o de conceituar “apoio pontual” como fusionismo. Se não ficou claro que são coisas diferentes eu não tenho mais nada a falar sobre este assunto.

*Bacharel e licenciado em Filosofia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela mesma instituição. Leciona disciplinas para os cursos de Pedagogia e Administração da Faculdade Sumaré e é editor-executivo da Bunker Editorial. Colabora com diversos institutos e publicações como Instituto Ludwig von Mises Brasil (IMB), Liberzone, Portal Libertarianismo (L+) e Estudantes Pela Liberdade (EPL), sobre temas referentes à educação, política e cotidiano. Foi tutor de formação do Instituto de Formação de Líderes de São Paulo (IFL-SP) em 2013. Atuou como professor de Filosofia na Rede Estadual de Ensino de São Paulo durante 6 anos e colaborou com artigos sobre Filosofia para o portal Mundo Educação. Tem poesias publicadas em três antologias do Bar do Escritor

 

[1]             Russell Kirk. Libertarians: The Chirping Sectaries.

[2]             Murray Rothbard. Frank S. Meyer: The Fusionist as Libertarian Manqué. Disponível em: http://www.lewrockwell.com/1970/01/murray-n-rothbard/the-failure-called-fusionism/

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