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Obama visita a Índia: tem alguém ouvindo?

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BARUN MITRA*

Liberty Institute

Mumbai à noite
Mumbai, Índia

O Presidente Barack Obama virá à Índia no final desta semana. Ele é o terceiro presidente dos EUA a visitar a Índia nessa década, e o único a fazê-lo bem no início de seu mandato. No entanto, a visita não despertou nenhum interesse popular.

Em meu artigo intitulado “In Bush’s footsteps in India” [“Nos passos de Bush na Índia”] no Wall Street Journal Asia, publicado em 2 de novembro, 2010, exponho, em linhas gerais, os possíveis assuntos a serem tratados e a razão para a falta de interesse por essa visita.

Numa versão maior do artigo “Obama visita a Índia: tem alguém ouvindo?” [“Obama calls on India: Is anyone listening?“] comparo os diferentes contextos políticos entre a visita de Obama agora e a de seu antecessor, o presidente Bush, em 2006. Insinuo que o Presidente Bush e o Primeiro Ministro Manmohan compartilhavam da mesma visão política para a Índia, e isso permitiu que os dois líderes investissem tanto capital político em questões como o acordo nuclear civil que os dois assinaram. Em contraste, a Índia parece não fazer parte do quadro geral de interesses do Presidente Obama, conseqüentemente, nenhum dos lados está querendo arriscar capital político precioso em nenhuma questão. Eis uma passagem do artigo:

Na política, o momento certo e o humor popular têm grande impacto e avivam a percepção. O Presidente Barak Obama está vindo à Índia nesta semana. Mas a visita do líder da única superpotência mundial não criou muitas expectativas entre os indianos desta vez. A única esperança é que não haja nenhum ponto novo de atrito, dada a enorme gama de assuntos sobre os quais a percepção dos dois governantes diverge hoje. O mais importante, entretanto, o que falta, é uma visão mutuamente compartilhada que convença!

Vamos olhar as duas questões que poderiam ter transformado a dinâmica entre os dois lados, e conduzido as relações a uma fase realmente nova. Pela primeira vez, o lado indiano concordou em comprar aviões de caça dos EUA, no valor de US$11 bilhões. E pela primeira vez em décadas os EUA concordaram em vender equipamento militar de ataque para a Índia. No entanto, o governo indiano é incapaz de pôr o guizo no pescoço do gato, na incerteza do custo político.

Da mesma forma, o governo americano está na expectativa de que a lei de responsabilidade civil nuclear, da Índia, satisfaça os anseios dos parceiros privados. Isso teria levado o conflituoso acordo nuclear Índia-EUA à sua consumação. Mas depois de reacendida a controvérsia sobre o vazamento de gás em Bhopal em 1984, o governo indiano está em dúvida se arrisca mais capital político neste momento.

O contraste com a visita de George W Bush em 2006 não poderia ser mais desolador. Bush e Manmohan haviam investido enorme capital político no acordo nuclear Índia-EUA. Bush já estava se tornando impopular em casa por causa dos rumos da guerra no Iraque, e havia fortes protestos na Índia também. Manmohan Singh arriscou a sobrevivência de seu governo para obter a assinatura do acordo.

Bush & Singh, Nova Déli

Nenhum presidente dos EUA fez tanto para favorecer a Índia. E nenhum primeiro ministro indiano pôs tanta fé numa única questão da política indo-americana. Até hoje muitos especialistas políticos indianos não conseguiram entender por que e como tal fato ocorreu. Esta foi uma rara ocasião em que dois líderes decidem assumir de frente a questão, em face à enorme oposição ao acordo, dos dois lados. Mas esta centelha de liderança foi fortalecida por um nível de confiança e autoconfiança fora do comum de que os dois líderes pareciam usufruir.

Obama fará um pronunciamento na sessão conjunta do Parlamento durante esta visita. Em 2006, a temperatura política elevada na Índia não permitiu que Bush tivesse a mesma honra. Bush falou a uma audiência selecionada na sombra do velho forte em Déli. A maior parte dos indianos que ouviram aquele discurso saiu convencida de que George W Bush acreditava realmente na democracia da Índia. Os valores compartilhados de democracia, tolerância e pluralismo não eram meros clichês, mas ideais nos quais Bush e Manmohan realmente acreditavam e estavam convencidos de que o outro realmente compartilhava da mesma crença. No contexto do surgimento do terrorismo internacional, o significado político da pauta democrática teve grande destaque, e ao mesmo tempo marcou um enorme contraste.

Uma vez que esse tipo de relacionamento é estabelecido, quase todos os obstáculos políticos podem ser superados. Manmohan Singh e o líder do partido no Congresso foram completamente justificados quando os partidos que se opuseram às novas relações de amizade Índia-EUA perderam fragorosamente nas eleições gerais de 2009. Foi por essa razão que, de forma rara, o primeiro-ministro indiano recebeu calorosamente Bush mesmo depois que ele já havia saído do governo.

Obama surgiu no cenário mundial fascinando as pessoas com seu inspirado tema “Sim, nós podemos”. Apesar disso, parece faltar a ele a ampla visão política que une muitas pessoas em torno de um propósito comum. Em conseqüência, Obama, que venceu prometendo bipartidarismo em assuntos domésticos, conseguiu agora polarizar os americanos tanto quanto Bush ou Bill Clinton. Na esfera internacional, a aprovação pessoal de Obama é ainda elevada, mas nos últimos anos seu carisma perdeu muito do brilho que tinha.

A falta de visão unificadora pode ficar em evidência durante sua primeira viagem à Índia. A seu favor, ele é o primeiro líder dos EUA a vir à Índia logo no início de seu mandato. Caso venha a ser reeleito em 2012, Obama poderá ter a oportunidade de vir à Índia novamente, e talvez venha a descobrir sua própria visão nesse momento futuro. Mas desta vez, está claro que em dois anos a Índia e os EUA mantiveram divergência numa ampla gama de questões.

Obama tem três assuntos importantes em sua pauta internacional – Af Pak**, a taxa de câmbio yuan – dólar americano e a mudança climática. Em nenhum deles os dois lados compartilham da mesma perspectiva. Ou o governo dos EUA não vê nenhum papel importante para a Índia, como em Af-Pak, ou as prioridades indianas são diferentes, como na mudança climática.

Quando Bill Clinton visitou a Índia em 2000, a recepção foi eufórica. Muitos indianos viram a primeira visita de um presidente dos EUA depois de um intervalo de 20 anos, logo após as reformas econômicas dos anos 1990, como um indicador da ascensão da Índia ao cenário mundial. Mas depois da Índia ter explodido seus dispositivos nucleares em 1998, Clinton pouco teve de concreto para oferecer à Índia.

Em 2006, Bush visitou a Índia em meio a condições muito polarizadas, ouvindo elogios de um lado do espectro político e recebendo extrema hostilidade do outro. A democracia indiana, ao mesmo tempo com seus debates, discórdias e sujeiras, estava em plena exposição.

A falta de visão de Obama para essa viagem resultou em que ele não conseguiu atrair apoios entusiásticos, nem deu força aos tradicionais críticos da política americana. Para o líder da mais antiga e segunda maior democracia do mundo, a viagem à maior e vibrante democracia tem tudo para se tornar num grande fracasso.

* Diretor do Liberty Institute, um think tank de políticas públicas independente, em Nova Déli, Índia.

** N.T.: Neologismo para as relações Afeganistão-Paquistão

TRADUÇÃO: LIGIA FILGUEIRAS

fonte das imagens: Wikipedia

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