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Mediocridade como (in)justiça

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AUTOR: CAUÊ BOCCHI

O fato de determinados povos terem ou não sofridos injustiças numa época passada, remota ou não, deveria ser irrelevante para aquilo que se faz ou deixa de fazer no presente. O passado é passado, e nele deveria ficar. Não quero saber se os negros foram escravizados, os índios aniquilados ou as mulheres desrespeitadas. Não quero saber também da veracidade das acusações daqueles que dizem que essas pessoas estão hoje numa situação pior porque sofreram estas supostas injustiças no passado. Pode ser que estas alegações sejam verdadeiras, pode ser que não. Há literatura disponível em ambos os sentidos. Tudo me leva a crer que há um enorme exagero nestas alegações, mas isso não importa para os propósitos deste artigo.

Vamos assumir, somente e tão somente para fins de argumentação, que os negros, índios, mulheres, e toda outra minoria que se queira criar realmente tenham sofrido injustiças em épocas passadas, e que eventualmente ainda as sofram. Mesmo assim, o que importa é que não existe qualquer ação afirmativa neste mundo que vá trazer justiça a estas minorias. Dar aos pobres aquilo que eles não são capazes de conseguir num confronto direto e igual com os privilegiados empobrece todo o sistema, e não o contrário. Quem se revolta com esse tipo de afirmação e que, por esse motivo, discorda do que foi dito, advoga com todo o seu bom coração em favor de um relativismo burro que só serve para nos distanciar cada vez mais daquilo que se produz de relevante neste mundo. Também me entristeço e me revolto com a situação dos menos privilegiados, mas isso não me confere qualquer licença para ser um idiota.

Um branco rico e vagabundo sem grandes conhecimentos formais merece estudar em uma universidade de ponta tanto quanto um negro pobre e esforçado sem grandes conhecimentos formais; isto é: os dois devem ficar o mais longe possível de uma universidade de elite. O fato do negro pobre eventualmente ser muito mais admirável do ponto de vista humano é irrelevante para qualquer diferenciação entre eles sob este aspecto. O fato de termos pena do negro pobre é irrelevante do mesmo modo. A variável que importa é ter o conhecimento formal, e essa não é uma escolha arbitrária: ele é passível de medição (mesmo que existam falhas), e é diretamente relacionada à produção de um conhecimento de qualidade. Dar pérolas aos porcos será sempre inútil, seja o porco rosa ou azul, venha ele de um latifúndio ou de uma pequena propriedade rural. São as pérolas que chafurdarão na lama, e não os porcos que usarão colares de pérola.

Os enfurecidos irão dizer: é fácil fazer todas as afirmações quando se é um branco de classe média e de boa formação. Pior é que é mesmo. Só que, mais uma vez, isso é completamente irrelevante. Eu poderia ser filho de uma índia guarani-kaiowá com um descendente congolês nascido no interior do Piauí e homossexual (ok, ele teve uma pequena recaída ao ver os cabelos negros e sedosos e pele cor de jumbo da minha mãe) que o argumento continuaria válido. Eu poderia morar no meio do esgoto e não ter o que comer, e o argumento continuaria igualmente verdadeiro. A veracidade de um argumento independe do agente que o professa. Quem julga pelo sujeito e não pela matéria pode ter inúmeros méritos, mas com certeza não estão entre eles o pragmatismo e o amor à verdade. Dois mais dois são quatro mesmo que quem diga isso seja um Hitler, do mesmo modo que dois mais dois nunca serão cinco, mesmo que o homem mais santo o diga no alto da sua santidade. Os menos privilegiados não devem ter privilégios, mesmo que quem diga isso seja um privilegiado.

Eu me calaria de bom grado se qualquer pessoa me demonstrasse, empiricamente, que um cotista em qualquer cargo ou universidade produz sistematicamente mais e melhor do que aqueles que, privilegiados ou não, conseguiram alcançar seus objetivos sem a ajuda de qualquer ação afirmativa. E que não me venham dizer que a produção não deveria ser o parâmetro utilizado para medir o sucesso das ações afirmativas, porque é dela que o nosso sistema depende, e é a ela que todos, inclusive os mais pobres, devem tributo pelo aumento constante em seu padrão de vida. Sei que muitos não gostam de medidas de aferição tão desumanas. Essas pessoas têm todo o direito de fundar suas próprias comunidades e viver de paz e amor, enquanto observam a vista idílica de lindos unicórnios que infelizmente não existem. Se não o fazem, é porque elas mesmas sabem que o sistema também as beneficia, ou porque são hipócritas (provavelmente um pouco dos dois).

Pode parecer que eu sou conformista, o que não é verdade. Meu ponto é apenas que aqueles que foram mais bem preparados produzirão potencialmente mais do que aqueles que são menos preparados. Não é ilógico supor que bons alunos de boas escolas são mais preparados do que alunos de más escolas, e que por isso serão mais produtivos. Claro que gostaríamos que todos estudassem em boas escolas, mas esse nosso desejo é irrelevante para a discussão. O que é óbvio, mas poucos querem perceber, é que vivemos sob o domínio de um Estado pai que será tanto mais poderoso quanto maior seja o número de pessoas que sejam ou se considerem excluídas. O fato deste Estado pai se considerar um defensor dos fracos e oprimidos evidencia como é importante que permaneçamos fracos e oprimidos. Se todos puderem andar com as próprias pernas o governo perde a razão de ser. Até os ingleses, no auge da sua ganância, lutaram para acabar com a escravidão porque isso os beneficiava. Não há razão para crer que uma sociedade civil livre não vá agir para dar igualdade de oportunidades a quem quer que seja. Os indivíduos não precisam ter bom coração para que isso aconteça, e é ótimo não depender da santidade alheia. Para isso, contudo, qualquer governo que seja maior do que o mínimo necessário constituirá a maior injustiça possível, inclusive e especialmente para aqueles que se consideram os maiores injustiçados.

*Cauê Bocchi é Advogado e cursando de MBA em finanças pela FGV/SP. Trabalha no setor de infraestrutura ferroviária.

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