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Kevin Carson não representa o libertarianismo

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Filipe Rangel Celeti*

kevin-carsonHá um ímpeto comum entre os seres humanos. Atinge do inculto ao culto, do esquerdista ao direitista, do ateu ao fundamentalista religioso e dos mancebos aos anciãos. Este ímpeto é o de concluir que uma característica das partes deva se aplicar ao todo. Na vontade de refutar, surgida da indignação com um texto de Kevin Carson e com um radicalismo ideológico de internet, Luciano Ayan cedeu e abraçou o erro categorial de composição. Ayan desejou mostrar como o libertarianismo de Kevin Carson é utopista ao dizer que sem estados não haveria guerras.

Primeiramente, Ayan acerta ao colocar Carson como um libertário de esquerda. Entretanto, é preciso lembrar que “o libertarianismo de esquerda não é uma posição política homogênea. Antes, designa diferentes abordagens de questões políticas e sociais num contexto teórico nos quais diferentes teorias relacionam-se. Deste modo, falar em libertários de esquerda pode-se referir aos seguintes grupos teóricos: (1) esquerda libertária, (2) georgismo (geoísmo), (3) escola Steiner–Vallentyne, (4) agorismo, (5) left-libertarianism (libertarianismo de esquerda de livre mercado).”1

Antes, porém, que atribuam ao libertarianismo as características de uma parte, repito que a teoria libertária é um todo complexo que inclui: “o liberalismo neoclássico de Friedrich Hayek e Milton Friedman, o anarcocapitalismo de Murray Rothbard e David Friedman (são anarcocapitalismo diferentes), o objetivismo de Ayn Rand, o geolibertarianismo (georgismo) de Fred Foldvary, o libertarianismo de esquerda de Hillel Steiner e Peter Vallentyne, o agorismo de Samuel Konkin III, o minarquismo de Robert Nozick, o neo-mutualismo de Kevin Carson, além de diversas outras posições à esquerda de anarquistas e libertários clássicos e contemporâneos e à direita como a ética argumentativa de Hans-Hermann Hoppe.”2

Dito isto, podemos começar a falar sobre a posição de Kevin Carson a respeito dos conflitos entre Israel e Hamas. Em Gaza: O feitiço de Israel se vira contra o feiticeiro, Carson busca analisar o atual conflito resgatando a sua origem. A partir de duas obras sobre a história do conflito, o autor chega a uma conclusão parecida com muitas análises feitas anos atrás acerca do conflito Estados Unidos – Osama Bin Laden. Foram os EUA que financiaram Bin Laden contra um inimigo maior, a URSS. Portanto, os ataques de 11 de setembro, foi o feitiço (o treinamento e financiamento de Osama) contra o feiticeiro. Do mesmo modo, Israel apoiou o Hamas contra outros grupos islâmicos. O apoio e financiamento do passado se voltam a Israel hoje. É óbvio que o Hamas tem culpa ao bombardear Israel, não vou negar isto e nem dizer que uma ética se baseia em consequências indesejadas. O ponto que merece atenção é que este tipo de apoio externo, financiamento e treinamento, se mostrou extremamente fracassado. Os Estados, ao tentarem promover a paz, geraram guerras. Significa que confiar em Estados para que tenham uma boa relação externa é ingenuidade.

O ponto de Carson é que a tentativa de governos em atuar no exterior malogrou. A história cobrou um alto preço por conta da tomada de posição em conflitos externos. É por conta disto que conclui duas coisas: (1) não se deve confiar na narrativa oficial sobre as ameaças externas e (2) “há uma boa chance de que todos os problemas no exterior sejam repercussões das ações do próprio Estado”.

Dizer que há uma boa chance de que todos os problemas externos sejam causados pelo Estado não é dizer que um mundo sem Estado não possui guerras. Isto seria uma negação do antecedente, o que evidentemente Carson não fez.

Mas e se não houvesse Estados na região, como será que as coisas funcionariam? No texto Israel e Palestina: uma guerra estatal, Markus Bergström mostra que muito além de se perguntar quem tem legitimidade de controlar os territórios reivindicados o problema começa justamente pela existência de Estados conclamando para si territórios.

As soluções existentes, Estados de Israel e Palestina coexistindo e acordados sobre os territórios ou a fusão num só Estado, não resolveriam os conflitos. Uma terceira posição seria a abolição de ambos os Estados. Não haveria mais o Estado israelense e um dos fatores mais agregadores e pacificadores, o comércio, conseguiria evitar conflitos grandes e custosos. (Não repetirei tudo o que Bergström colocou em seu artigo, o bom leitor o lerá.)

Antes de terminar, dizer que sem Estados não haveria as guerras estatais não é afirmar que a natureza humana é boa. É a maldade humana nas mãos de líderes com incentivos que geram grandes guerras. O ser humano entra em conflito com outros o tempo todo. Numa sociedade sem Estado, a segurança funcionaria bem diferente e um ótimo começo é ler o livro Teoria do Caos do Bob Murphy.

Em tempo, o erro de Kevin Carson não é apontar que os conflitos sejam de responsabilidade das autoridades israelenses e palestinas. Sua teoria econômica e seus pressupostos marxistas são problemas bem mais graves. Ainda bem que ele não representa o libertarianismo.

*Bacharel e licenciado em Filosofia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela mesma instituição. Leciona disciplinas para os cursos de Pedagogia e Administração da Faculdade Sumaré e é editor-executivo da Bunker Editorial. Colabora com diversos institutos e publicações como Instituto Ludwig von Mises Brasil (IMB), Liberzone, Portal Libertarianismo (L+) e Estudantes Pela Liberdade (EPL), sobre temas referentes à educação, política e cotidiano. Foi tutor de formação do Instituto de Formação de Líderes de São Paulo (IFL-SP) em 2013. Atuou como professor de Filosofia na Rede Estadual de Ensino de São Paulo durante 6 anos e colaborou com artigos sobre Filosofia para o portal Mundo Educação. Tem poesias publicadas em três antologias do Bar do Escritor

 

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