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Carnaval e economia de mercado

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Escrevo, neste momento, para os interessados em ideias políticas e econômicas de ordem liberal, e não para sambistas ou fãs de Carnaval; sendo assim, alguma introdução pode ser necessária. Nascidas na década de 30, a partir da Deixa Falar, no morro do Estácio, as escolas de samba constituem uma tradição tipicamente carioca, associada ao gênero de música popular “samba”, e representam um forte elemento aglutinador das comunidades onde se instalam e florescem. Seu sistema, que o carnavalesco Joãozinho Trinta – aliás, autor da famosa frase “pobre gosta de luxo, quem gosta de miséria é intelectual”, que pode ser lida como um “tapa na cara” de muitos autores de esquerda – e outros realizadores do espetáculo chamam de “ópera ao ar livre”, em que diferentes segmentos de uma comunidade desfilam fantasiados, reproduzindo uma história ao longo da avenida e cantando um samba, dentro de uma competição de agremiações, foi exportado para outros estados e até para fora do país.

É um modelo de entretenimento e uma manifestação da cultura popular legítima, de origem brasileira, e com a qual milhares se envolvem de forma apaixonada e dedicada. Também gera empregos e retorno financeiro, além de muitas escolas desenvolverem projetos sociais junto a suas comunidades. No entanto, são bastante conhecidas as discussões sobre esse setor a partir das reclamações e questionamentos de alguns quanto ao uso dos recursos públicos nessa festa, e em outras manifestações do Carnaval no Rio e demais estados.

Não entraremos em debates morais mais específicos; todos têm total liberdade de gostar ou aprovar o que bem entenderem, não estaremos discutindo gostos ou convicções. Tem quem goste de Carnaval, tem quem não goste. Liberdade, liberdade (isso é até samba-enredo!)… É sabido que essa festa se desenvolveu com ligações notórias, ao menos no Rio de Janeiro, com o poder público – estamos falando, afinal, de algo que começou seu desenvolvimento nos anos Vargas, que imprimiam um forte nacionalismo e uma intensa e lamentável presença do Estado em todas as esferas – e a contravenção (bicheiros), o que levanta questionamentos pertinentes e debates longevos.

Desejaria inclusive, particularmente, como apaixonado confesso pelas escolas que sou, que esse debate fosse mais sadio, de parte a parte, reconhecendo-se que festividades e celebrações populares existem em todos os lugares do mundo. Não faz muito sentido tratar as escolas de samba, por mais discordâncias que se possa ter com as relações econômicas que se estabelecem na estruturação do evento em que se apresentam – o que, diga-se de passagem, tão somente reflete os problemas e dificuldades já conhecidos em todos os aspectos da vida brasileira -, como algo a ser anatematizado para que o país avance, como se fossem elas as responsáveis objetivas por todos os males de nosso estado e de nosso país. Por outro lado, também, os sambistas devem entender as hesitações da outra parcela da população, preocupada com a forma como as verbas públicas são geridas e a que são destinadas, e que muitas vezes não se identifica com a apresentação promovida nos dias de Momo.

O que pretendemos mostrar é que, para o desgosto daqueles que radicalmente opõem mercado e cultura, uma mentalidade menos amadora e mais economicamente responsável vem sendo objeto de reflexões no meio do samba, bem como de iniciativas interessantes que podem potencializar os benefícios econômicos dessa atividade. Existe um debate sobre a fomentação de patrocínios, onde alguns dirigentes manifestam disposição a uma forma de gerir o Carnaval que dependa cada vez menos dos recursos públicos. Acreditamos que, mesmo entre os defensores mais ardorosos do liberalismo econômico e da prevalência da iniciativa privada na maioria dos setores – e, na dimensão pessoal, estou com eles bastante identificado -, essa atitude deve ser vista como um avanço animador no sentido de um desligamento cada vez maior da influência estatal na produção artística e popular. Um avanço a ser encorajado.

Sem discorrer detalhadamente sobre a complexa situação no Rio e em São Paulo, onde os espetáculos de grandes proporções exigiriam muitas discussões delicadas, envolvendo, por exemplo, o monopólio de transmissão televisiva dos desfiles – que gera insatisfação entre boa parte dos próprios sambistas.

Quando a presença excessiva do Estado se reduz, ainda que não como muitos de nós gostaríamos, não seria isso algo a comemorar? Sem pretender impor nada, avançamos apenas em que, em tempo de Carnaval, quando esse assunto volta à baila e os partidos – pró e contra os desfiles – se acirram, cremos seja oportuno que um movimento liberal ou conservador pense nessas e outras manifestações da cultura popular brasileira com mais cautela e eventualmente com menos prevenções extremadas; desse modo, ganharíamos muito na busca de uma comunicação com o público que devemos todos visar como movimento político, que abrange toda a população brasileira e não apenas alguns segmentos, com preferências estéticas e artísticas particulares.

* Este artigo foi adaptado de original intitulado “Carnaval, empreendedorismo e economia de mercado” publicado em 2015.

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Lucas Berlanza

Lucas Berlanza

Jornalista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), colunista e presidente do Instituto Liberal, membro refundador da Sociedade Tocqueville, sócio honorário do Instituto Libercracia, fundador e ex-editor do site Boletim da Liberdade e autor, co-autor e/ou organizador de 10 livros.

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