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Coronavírus: uma crise de saúde com impactos na economia

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É importante sempre frisar que esse difícil momento que estamos vivendo atualmente, talvez o pior momento da humanidade pós Segunda Guerra Mundial, é uma crise de saúde, que tem impactos na economia. Por isso que essa crise é diferente da de 2008, por exemplo, ou de tantas outras crises que o mundo e o Brasil passaram nos últimos anos.

Caso o vírus ficasse somente na China, diminuindo o crescimento da economia chinesa, por exemplo, ou no episódio da crise financeira internacional de 2008/09, o impacto de um menor crescimento mundial teria algum impacto na nossa economia. Verdade que seria um impacto menor do que na maior parte dos países, dado que o Brasil é um dos países mais fechados do mundo. Além disso, o mercado financeiro mundial está sendo muito afetado nessa crise, como em outras, com uma volatilidade muito grande, quedas das bolsas muito fortes, aumento do risco, mudanças no câmbio… Poucas vezes, em nove oportunidades somente, a bolsa brasileira caiu mais de 10% no fechamento do dia, sendo que, dessas nove datas, quatro foram em 2020. Na crise de 2008, essa forte queda ocorreu duas vezes. Nem no dia 11/09/01, com o atentado em NY, ou no dia seguinte do episódio conhecido como “Joesley Day”, o Ibovespa recuou tanto.[1]

Porém, o que diferencia essa crise de saúde, que tem impactos na economia, de outras crises econômicas ou financeiras, é que, com o isolamento social, as pessoas não estão saindo de casa, seja para ir ao trabalho ou lazer. Com isso, o setor de serviços, que corresponde a mais de 60% do PIB, e é o que mais emprega as pessoas, está sendo (e vai ser mais ainda) impactado com essa diminuição da circulação das pessoas. Por isso que essa crise do coronavírus vai impactar muito fortemente a economia, pois além de um menor crescimento da economia global, com uma possível recessão; do aumento do risco, queda das bolsas, crescimento da incerteza; o impacto no setor de serviços, que em outras crises não existia, pelo menos nessa magnitude, vai influenciar muito no baixo crescimento brasileiro. Lembrando que esse não é um problema exclusivamente do Brasil, mas sim de todos os países que estão passando por essa crise – por exemplo, pensemos no quanto o setor de turismo não deve representar na economia italiana, e os enormes prejuízos, agora e depois, inevitáveis!

Aqui vale frisar que o parágrafo acima mostra os impactos dessa crise de saúde na economia, não sendo um juízo de valor sobre o isolamento social. Porque, na minha opinião pessoal, as medidas que estão sendo tomadas pelo Governo Federal, através do Ministério da Saúde, e dos governadores, de começar e manter o isolamento social em diversas cidades e estados brasileiros, é a medida adequada nessa fase do problema em que estamos e médicos, e não economistas ou políticos, é que devem estar no comando da situação nesse atual momento de crise de saúde, e falar quando deve ser a data (gradual, e não para todos) do fim do isolamento social. Brigas políticas acontecem na maior parte do mundo e isso faz parte do jogo democrático; mas a condução da crise, principalmente pelos Ministros da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e da Economia, Paulo Guedes, assim como os Governadores, em especial os dos dois estados com o maior peso na economia brasileira e mais afetados pelo coronavírus, João Dória (SP) e Wilson Witzel (RJ), vão na direção correta.

Como nessa crise há muita incerteza (médica, econômica, entre outras), as decisões dos governos e eventuais mudanças acontecem, pois quanto mais informações se tem, melhor podem ser tomadas as medidas. Como essa crise é de saúde, as medidas mais urgentes são no combate a essa pandemia. Aumentar o dinheiro para a saúde, comprar testes, aumentar o número de médicos, de leitos, etc, todas essas medidas, algumas já tomadas e outras ainda a serem feitas,  são o ponto inicial do combate ao problema. Já do lado da economia, a principal medida, mais urgente, é chegar dinheiro na mão dos mais pobres no Brasil. Sempre é bom lembrar que após a forte recessão que o país passou em 2014-15-16, nos três anos seguintes de recuperação lenta e gradual da economia, a principal consequência para a população brasileira são os quase 70 milhões de brasileiros numa situação mais precária do mercado de trabalho, sendo 12 milhões de desempregados, quase 5 milhões de desalentados, 8 milhões de subocupados e os 40 milhões de trabalhadores informais. Por isso que a medida conhecida como “coronavoucher”, que começou em R$ 200, passou para R$ 300, depois para R$ 500 e fechou em R$ 600 mostra o quanto as mudanças ocorrem rapidamente.

O aumento do Bolsa Família também foi na direção correta, pois também sempre é importante frisar a “eficiência” desse programa, que atinge 13 milhões de beneficiários, impactando então mais de 40 milhões de brasileiros, dos mais pobres, com um custo muito baixo, menos de 0,5% do PIB! Só para efeitos de comparação, o déficit da previdência do setor público é superior a 1% do PIB, sendo que esse pagamento é para um milhão de pessoas, e dos maiores níveis de renda do país. Por isso a importância da reforma da previdência, exaustivamente discutida no Brasil nos últimos três anos e aprovada pelo Congresso no ano passado.

Medidas divulgadas pelo Ministério da Economia, Banco Central, BNDES e bancos públicos vão na direção de dar mais liquidez na economia, aumentar o crédito, ajudar no pagamento da folha de pagamentos das empresas, entre outras, estão na direção correta, e na linha do que o resto do mundo também vem fazendo. Claro que pode haver críticas ao tempo, magnitude das ações, mas a direção é correta. Ajustes podem e devem ser feitos, pois dada a gravidade do problema, sempre se poderá fazer mais, e as medidas não serão totalmente suficientes.

No momento, de forte crise, de saúde e de economia, o Brasil tem que aumentar os gastos mesmo, como está fazendo. Aumentar o gasto na saúde, aumentar o gasto com os mais vulneráveis, ajudar as empresas, principalmente pequenas, e “esquecer” o déficit deste ano e o aumento da dívida. Lembrando que, em situações “normais”, sem esse vírus, a dívida bruta do Brasil aumentou muito, passando de pouco mais de 50% do PIB em 2013 para mais de 75% atualmente. Porém, não é necessário modificar o teto dos gastos, medida importante que o Brasil implementou há pouco tempo. Com o Estado de calamidade pública, é possível fazer esses aumentos no déficit sem alterar o teto dos gastos. O que não pode ocorrer é esses “gastos temporários” virarem permanentes, como justificativa pelo coronavírus. Por exemplo, esse “coronavoucher” é uma medida temporária, para minimizar os efeitos dessa crise atual. Num primeiro momento, o pagamento será feito por três meses. Pode ser que, a depender da duração da crise, esse pagamento tenha que ser feito por mais algum tempo. Justo! O que não pode é isso virar permanente, tendo se iniciado como uma medida de combate à crise atual. Se o governo quiser, como uma política pública, manter esse voucher para os informais, aí sim, pode-se discutir com a sociedade, Congresso, ver os custos, e tudo mais, e optar, ou não, por essa medida. Assim como o aumento do Bolsa Família, seja no número de beneficiários ou no valor do benefício. Mas teria que ser uma decisão do governo, em um “momento normal”, não como justificativa como resposta à tragédia do vírus.

Uma discussão recente também é se o Brasil está gastando menos do que outros países no combate à pandemia. Um ponto importante, já ressaltado pelo secretario do Tesouro, Mansueto Almeida, é que o Brasil já gasta muito com assistência social. Então, a comparação mais justa não seria comparar essas porcentagens do PIB de combate à crise entre os países e sim o somatório de gastos de assistência social que o país já faz. Por exemplo, o Brasil, mesmo sendo um país relativamente jovem, gasta 14% do PIB com previdência, mais do que os demais países, inclusive com populações mais velhas. Esse assunto também já foi debatido exaustivamente no Brasil nos últimos anos de amplo debate sobre a previdência.

Outra questão relevante é que, de 2016 até hoje, o cenário de juros e inflação mudou drasticamente no Brasil. Após ter uma inflação de 10,7% em 2015, 6,3% em 2016, a inflação média do triênio 2017-19 foi de 3,7%. E, além disso, a meta de inflação, que ficou constante por 14 anos até 2018, diminuiu para 4,25% ano passado, 4,0% esse ano, 3,75% no ano que vem e 3,5% em 2022. Isso ocorreu após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, com a mudança de governo e a alteração na direção do Banco Central. Na gestão Ilan Goldfajn, a taxa básica de juros caiu de 14,25% em 2016 para o mínimo histórico, 6,5% em 2018. Na gestão do Roberto Campos Neto, a Selic caiu mais ainda, para os 3,75% atuais. Com isso, o pagamento dos juros pelo governo brasileiro diminuiu em mais de cem bilhões de reais nesse período, dinheiro esse que pode ser gasto em medidas no combate à crise. Ou seja, se essa crise do coronavírus tivesse ocorrido quando o Brasil ainda tinha os juros em dois dígitos, a situação poderia ser pior ainda.

Passando esse grave momento, transitório, pois o coranavírus (num menor ou maior tempo) vai acabar algum dia, e o Brasil e o mundo vai continuar. Por isso que, posteriormente, e visando ao médio e longo prazo, a “volta” dos assuntos referentes às reformas é muito importante para que o Brasil volte a ter um crescimento mais robusto, algo que possivelmente já ocorreria em 2020, caso não houvesse esse choque. Após a reforma Trabalhista (gestão Temer), Previdenciária (gestão Bolsonaro), outras reformas, como a tributária, administrativa, privatizações, melhoria do ambiente de negócios, etc, precisam voltar ao radar do Governo, Congresso, imprensa e sociedade! Por fim, acredito que o Brasil vai passar por esse grave momento, espera-se que com o menor custo, em termos de mortes e de problemas de saúde, possível, e tentando minimizar os impactos econômicos. Que todos possamos voltar à “maior normalidade” possível em breve!!

[1] O artigo citado indica oito episódios, sendo três em 2020, pois mais uma queda do Ibovespa maior de 10% no fechamento ocorreu após a publicação do artigo. Portanto, na data em que o artigo foi escrito, ainda eram oito datas, três vezes em 2020.

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Marcel Balassiano

Marcel Balassiano

É mestre em Economia Empresarial e Finanças (EPGE/FGV), mestre em Administração (EBAPE/FGV) e bacharel em Economia (EPGE/FGV).

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