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Capitalistas de Araque

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JOÃO LUIZ MAUAD *

Benjamim Steinbruch é presidente da Companhia Siderúrgica Nacional – uma ex-estatal cujo controle acionário foi adquirido através de operações no mínimo estranhas  – e  vice-presidente da famigerada FIESP.  Este festejado empresário tupiniquim publicou, na última terça-feira, um artigo na Folha de São Paulo que chega a causar náusea em copo de bicarbonato, dado o nível de bajulação ali contido.

O artigo visa a defender as políticas fiscais do Governo Dilma, cujas contas têm sido objeto de críticas cada vez mais duras por parte da oposição e analistas do mercado.  Em seu libelo, o valente compara o déficit fiscal e a dívida pública brasileira com iguais índices de diversos países, a maioria deles desenvolvidos, para concluir que não estamos tão mal assim, como querem fazer crer os “fundamentalistas fiscais”.  Mas deixemos que ele mesmo fale:

O deficit fiscal nominal brasileiro, estimado pela revista [The Economist] para este ano, é de 3% do PIB. Com esse índice, o Brasil poderia se enquadrar no critério do Tratado de Maastricht, que criou a União Europeia e, entre outras medidas, estabeleceu em 3% do PIB o limite para o déficit orçamentário dos países da UE.

Só para se ter uma ideia, relaciono alguns déficit previstos para este ano: EUA, 4%; Japão, 8%; Reino Unido, 7,2%; França, 4,1%; Espanha, 7,1%; Índia, 5,2%; Israel, 3,5%; China, 2,0%; e Argentina, 3,3%.

Poucos países importantes têm moral para recriminar o Brasil em matéria de déficit fiscal. Talvez só a Noruega (superavit de 13,1% do PIB).

As agências de classificação de risco têm observado que a dívida pública brasileira está próxima de 70% do PIB. Sem dúvida, é muito alta. Mas, o que dizer de outras grandes economias, como os EUA, com 102% do PIB; França, com 86%; Reino Unido, com 85% e o Japão, com incríveis 228%?

Diante desses números, tendo a concordar com a ideia de que houve de fato um certo terrorismo fiscal após o anúncio dos resultados de setembro. O controle e a transparência da política fiscal são necessários e as contas públicas estão piorando, mas não se pode dar aos problemas uma dimensão maior do que eles efetivamente têm.

Como bem lembrou Carlos Alberto Sardemberg em sua coluna de hoje, no Globo, se você quiser ser campeão em tudo, basta escolher bem os seus adversários, um para cada tipo de jogo.  De fato, Steinbruch pinçou uma relação de países problemáticos, quase todos saindo de uma crise bancária avassaladora (não foi o caso do Brasil) e cujo “tratamento” realizado pelos respectivos governos esteve de acordo com a velhaca receita keynesiana do aumento de gastos públicos e da liquidez monetária.

O que o valente não mencionou foi que, ao contrário do Brasil, as taxas de juros nos EUA, no Japão, no Reino Unido e na França, por exemplo, estão perto de zero, enquanto aqui os juros pagos pelo governo estão entre os mais altos do planeta.  Se tivesse calculado, por exemplo, o serviço da dívida em relação ao PIB, certamente o Brasil não teria se saído tão bem na foto.

Mas a bajulação não parou aí.  Referindo-se às privatizações, nosso pseudo-capitalista foi patético:

E as privatizações? É óbvio que a iniciativa privada tende a ser mais eficiente na administração de negócios, seja via aquisição de estatais seja via concessão de serviços públicos.

Mas é sempre necessário agir com cuidado nessa área. Defendi e continuo defendendo a permanência de setores estratégicos nas mãos do capital nacional. Alguém terá coragem de propor a desnacionalização de símbolos nacionais como Petrobras, Banco do Brasil ou Caixa?

Viram como se misturam alhos com bugalhos?  Privatizações se transformam, de uma hora para outra, em desnacionalizações.  O que o valente não disse foi que tanto a Cia Vale do Rio doce quanto a CSN eram vistas também como símbolos nacionais pelos nacionalistas mais empedernidos, mas isso não impediu que fossem devidamente privatizadas no Governo FHC, para deleite do senhor Steinbruch, cujo patrimônio multiplicou-se exponencialmente com elas. Pano rápido.

Agora o trecho em que o valente diz, explicitamente, a que veio.

A questão fiscal nos leva ao chamado nacional-desenvolvimentismo. Deverá o próximo governo manter os incentivos a setores da indústria com vocação para o crescimento e a internacionalização?

Não é segredo para ninguém que minha resposta é sim, apesar dos desmandos recentes. Qualquer raciocínio lógico indica que esse incentivo faz sentido. Pode-se divergir quanto a setores, a volume de crédito e outros benefícios que cada um pode receber. Mas soa incoerente argumentar que eles não devem ser incentivados ou que os eventuais estímulos devam atingir a todos os setores de forma igualitária.

Seria o mesmo que estimular a produção de oliveiras no Brasil com igual ênfase dada ao cultivo de café, soja ou laranja. Assim como a agricultura, a indústria também tem vocações, pelas condições naturais, pelas reservas de matérias-primas, pelas peculiaridades de sua mão de obra e até por suas tradições.

Só faltou dizer que o setor siderúrgico é um desses setores com “vocação” para receber estímulos do governo, muitos estímulos.

Confesso que essa cara-de-pau desperta em mim a vergonha alheia. O senhor Steinbruch faz parte de uma turma que sempre arranja um jeitinho de locupletar-se à custa do dinheiro público, independentemente da ideologia eventualmente no poder.  Estão sempre dispostos e disponíveis para uma boa troca de favores com o governo de plantão.

O desserviço que estes capitalistas de araque prestam ao país é enorme e os prejuízos causados incalculáveis.  Expressões como livre mercado soam nos ouvidos desses senhores como palavrões em dispensário de freiras.  Apoiados na surrada lengalenga da proteção ao produto nacional, eles estarão sempre clamando por mais e mais protecionismo, reservas de mercado e outras benesses não menos nefastas.  Apelando invariavelmente para um nacionalismo exacerbado, os falsos empreendedores farão tudo o que estiver ao seu alcance para perpetuar seus privilégios.

Intervencionismo estatal costuma ser a menina dos olhos desses abutres.  Subsídios diversos, financiamentos públicos a custo e prazos sempre mais atrativos que os de mercado, além da formação de monopólios e oligopólios são a sinopse da cartilha do falso capitalista.  Na sua visão deformada e oportunista, o importante não é agradar ao consumidor, mas obrigá-lo a pagar o maior valor possível por produtos e serviços nem sempre de boa qualidade.

Nas “sociedades solicitantes”, para usar a expressão cunhada por Bastiat há quase dois séculos, eficiência e êxito perdem qualquer relação de causa e efeito, já que as prioridades da atividade econômica passam a estar voltadas não para a produtividade, a austeridade ou a satisfação do consumidor, mas para a bajulação, a corrupção e a troca de favores

Infelizmente, esse tipo de “empresário” existe em qualquer lugar do planeta.  Não é um privilégio do Brasil ou dos países mais pobres. Nenhuma sociedade está imune a eles.  No entanto, quanto maior for o grau de intervencionismo do Estado, maior será a probabilidade de que obtenham êxito.  Deixando de lado questões sociológicas, culturais e políticas, trata-se de uma questão estatística.

* DIRETOR DO INSTITUTO LIBERAL

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