A síndrome do crescimento
ANTENOR BARROS LEAL *
Quanto devemos crescer anualmente? Em que devemos crescer? Nos jornais há uma discussão constante entre o governo (crescendo 3%) e a verdade, com muito menos. No ano passado o Ministro Mantega perdeu todas as disputas. Pela parte oficial, há vários anos, a felicidade estava traduzida na informação de que o Brasil crescera mais do que a França e a Inglaterra, entre outros. Mesmo tendo aumentadoo seu “pibinho” de forma inexpressiva.
Mas deveria haver outra forma de ver o crescimento. Aliás, devia ser a única. Quantos brasileiros passaram a ter esgoto e água encanada? Quantos deixaram as vergonhosas filas para obter uma consulta ou uma cirurgia de simples qualificação? Quantos ainda padecem nas imensas esperas de filas de ônibus e trens sem horários e sem conforto? Quantos não tem a proteção democrática da justiça universal? Quanto deveríamos crescer anualmente para obter níveis de civilidade, de segurança, de educação, de qualidade de vida iguais aos mesmos países sobre o quais dizemos ser maiores ou melhores? A comparação de percentuais com países desenvolvidos é material de propaganda e não conquistas a comemorar.
A indignação atual pelos dados do PIB apenas repete os mesmos números do ano passado, se não piores, mas ainda caberá algum comentário de que crescemos mais do que a França ou a Itália. Provavelmente algumas instituições servis ao governo e representantes do patrimonialismo dominante, festejarão alguma coisa. Apenas satisfarão a alguns, enquanto, mantendo seus privilégios, escondem a realidade.
Quando se diz que o Japão (é importante falar desse país asiático que passou quase dez anos com a economia estagnada) está numa situação econômica difícil, devemos, por responsabilidade informativa, dar os dados sociais dos japoneses, para avaliar o que significa não crescer via PIB, mas manter intacta a dignidade de seu povo.
Não pararam as escolas de ensinar, não pararam os centros científicos de produzir inovação e tecnologia, não pararam os hospitais de fornecer tranquilidade e conforto a seus doentes e os cem por cento da população continuaram a beber água pura e com esgotos fluindo com respeito ao meio ambiente.
A verdade que nos interessa como nação é o crescimento social. Não traduzido pelo número de tvs compradas ou pelos carros novos financiados a perder de vista. Ou pelos dados entusiasmados do consumo pelo consumo.
Quando comparamos nossos percentuais “pibianos” com os países desenvolvidos estamos encobrindo a verdade, mas na dura realidade, vendendo um peixe eleitoral que, elegendo alguns, derrota o futuro do país.
Os dados publicados no mundo inteiro sobre o Brasil (agora mesmo saíram os referentes à competitividade) são os que importam efetivamente para o desenvolvimento verdadeiro.
Não se constrói um país verdadeiramente grande e digno se não tivermos índices de saúde pública aceitáveis. Escolas que sejam orgulho para seus alunos e professores e não batam recordes de greves ou atinjam níveis de aprendizado abaixo da media mundial.
Crescimento econômico é uma coisa. Social é outra. O que acontece se formos buscar dados sociais comparativos, não com os desenvolvidos ricos, mas com nossos parceiros latino-americanos? Quem educa melhor Chile ou Brasil? Colômbia ou Brasil? Quem trata melhor seus aposentados?
Não precisamos de comparações humilhantes. Necessitamos, urgentemente, de uma varredura na mentira do sonho novelesco. Nas conquistas anunciadas e nunca entregues. Porque discutir para onde vão os recursos do pré-sal se ainda não temos os próprios? Por que anunciar que seremos o maior produtor de álcool combustível, se estamos importando milhões de litros (dos americanos…)? Por que anunciar reservas imensas de petróleo a explorar, esquecendo que não basta ter ( é só ver a Venezuela) e sim obtê-los com perspicácia econômica e aplicar bem seus resultados.
O governo não precisa se preocupar com o “pibinho”. O importante é provar que a escola melhorou. Que o hospital está atendendo em prazo digno. Que produzimos alguma tecnologia nova. Ou inovamos no liquidificador ou no avião. Tanto faz!
Vamos melhorar e engrandecer a dignidade dos nossos compatriotas. Isto é que é importante.
* PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DO RIO DE JANEIRO