A exacerbação do serviço público é mais deletéria que as cotas nele aplicadas
BERNARDO SANTORO*
A Presidente Dilma declarou ontem, na abertura da III Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, que pretende elaborar lei reservando 20% das vagas nos concursos públicos para negros e pardos. Muito se fala que as cotas raciais são imorais e anti-utilitárias, e vou até defender que esse ponto de vista está correto, mas é pouco relevante perto do problema maior: a própria existência e exacerbação do instituto do serviço público.
A parcela da sociedade que luta contra a criação de cotas raciais ou sociais no serviço público normalmente se baseiam em dois argumentos: um moral e um utilitário.
Do ponto de vista moral, o estado deveria sempre observar um estrito sendo de isonomia, não podendo diferenciar seus cidadãos pela cor, credo, classe, e por aí vai. Essa regra é desrespeitada em todos os lugares, pois todo governante usa o estado para privilegiar a si mesmo e sua base eleitoral, seja ela qual for, mas o que a ideia de isonomia quer fazer é justamente impedir isso, o que concordo.
Do ponto de vista utilitário, as cotas acabam aprovando pessoas com notas menores que a de seus concorrentes, o que dá a entender que o serviço prestado pelo cotista seria inferior ao prestado pelo não-cotista. Já nesse caso, salvo em casos em que realmente se exige uma perícia e um conhecimento muito técnico, em regra isso não é verdade. Estimo que 50% do serviço público é burocrático e pode ser feito por pessoas até mesmo sem nenhuma instrução, necessitando talvez apenas ter um grau mínimo de alfabetização e de algum treinamento na área. Para confirmar o que estou dizendo, e isso é dado concreto, somente na área educacional essa taxa é de 50%, pois existe um burocrata para cada professor nesse setor.
Portanto, pelo menos para mim, o argumento ético é mais realista que o argumento utilitário.
Mas tudo isso é pouco importante, pois cotista ou não cotista, precisamos destacar o verdadeiro problema do Brasil: o serviço público.
O serviço público é um dos grandes problemas desse país. Ele traz os piores incentivos possíveis para o servidor que trabalha nesse regime. A estabilidade tira do servidor o estímulo natural de estar sempre melhorando para não ser demitido. A remuneração fixa o desestimula a melhorar. A lógica da verba, em que quanto pior o serviço, maior a pressão públicas por mais verbas, injetando ali mais dinheiro, faz com que o órgão público como um todo receba mais dinheiro quando deteriora seu serviço. As licitações em que pode se superfaturar em benefício próprio às custas de todos. Soma-se tudo isso e se vê que o sistema do serviço público é uma lástima.
E os incentivos deletérios desse sistema incidem sobre o servidor público, não importando sua cor, credo, classe social, sexo ou preferência sexual. Cada um irá reagir a esses verdadeiros desincentivos de melhor ou pior maneira, mas a força dos desincentivos é aplicada, essa sim, sempre de maneira isonômica sobre todos os servidores públicos.
Isso faz com que o serviço público, seja ele prestado por negros, brancos, amarelos ou vermelhos, na média, seja sempre inferior em qualidade ao serviço privado. Os efeitos anti-utilitários das cotas são ruins, mas são pequenos perto dos efeitos anti-utilitários do serviço público em si.
Por isso, precisamos sim defender a isonomia, mas muito mais importante é defender a redução das atribuições de estado, com fins à extinção em larga escala de cargos públicos, que verdadeiramente fazem mal ao brasileiro comum.
*DIRETOR DO INSTITUTO LIBERAL
OBS: Apenas à guisa de exemplo, leiam essa notícia sobre a votação de uma PEC que garantiria que várias carreiras públicas passariam a ter salários de R$ 25.000,00 por mês. É um salário simplesmente surreal, criando uma elite nababesca.