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IDADE DAS TREVAS

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COLABORADORES

19.02.09

 
 

IDADE DAS TREVAS

Maria Lucia Victor Barbosa*

 

 

O legado do Império Romano foi marcante para a humanidade por suas inúmeras realizações em diversas áreas, especialmente, na política, na arte da guerra e no Direito. Mas, nem mesmo o maior poder, o esplendor mais estonteante duram para sempre nessa vida de incertezas e finitudes.

 

A queda de Roma não ocorreu com dramática subtaneidade, mas, prolongou-se durante cerca de dois séculos (284-476). Na verdade, a partir do século III, concomitante ao declínio econômico, pode-se dizer que se inicia a Era do Obscurantismo para toda Europa Ocidental.

 

Várias foram as causas do complexo fenômeno da decadência do Império global daquela época e, entre elas, se pode apontar: a degradação do intelecto pelas religiões, as invasões bárbaras, a exaustão dos recursos do Estado para manutenção de imensa máquina militar, a depravação moral.

 

Entre 400 e 800, desenrola-se o primeiro período medieval que abarca a Europa Ocidental e que se caracteriza pela maioria dos atributos designados como medievais ou Idade das Trevas. É um interregno de profunda ignorância e superstição, no qual o homem viveu com olhos vendados. A cultura, em certos aspectos, representou uma volta ao barbarismo. A atividade econômica baixou a níveis primitivos de troca direta, enquanto o ascetismo mórbido substituía as atitudes sociais racionais.

 

A história seguiu, veio o Renascimento, a Idade Moderna e não há que se negar o gigantesco progresso do mundo contemporâneo. Ciência e tecnologia avançaram de modo rápido e extraordinário. O enorme desenvolvimento dos meios de transporte e comunicação tornou o planeta globalizado. E na era dos computadores, especialmente através da impressionante Internet, as comunicações humanas superaram tempo e espaço. O mundo hoje é de fato a “aldeia global” com os benefícios materiais que trazem confortos inimagináveis até bem pouco tempo atrás para o ser humano como um todo. O desenvolvimento da indústria a partir da Revolução Industrial, começada na Inglaterra no final do século XVII, princípio do século XIX, ensejou no transcorrer do século XX a sociedade de consumo que englobou as classes mais baixas e lhes possibilitou o acesso a bens antes restritos às classes mais altas. O liberalismo, nascido no século VIII, também na Inglaterra, como ideologia da burguesia ascendente, e que em sua forma original se achava dissociado da idéia democrática, ao defender as liberdades como as de mercado, de expressão, de associação, de pensamento, enfim, a idéia de que o homem tem liberdade de escolher sua vida e seus objetivos, e de que o governo não pode negar essa liberdade, fez aparecerem novas forças sociais, que mesmo sem propriedades passaram a ter voz e vez. O liberalismo, associado ao capitalismo, trouxe a democracia com o voto universal, as eleições livres, a pluralidade partidária. Avançou também o arcabouço jurídico e com ele a noção de Estado de Direito, aperfeiçoada depois para Estado Democrático de Direito.

 

A par de tantos progressos a natureza humana em essência não evoluiu. O século XX conhecerá o flagelo dos totalitarismos, o comunismo e o nazismo com a indelével mancha do Holocausto, enquanto o fascismo lançava suas garras sobre a Itália.

 

O Muro de Berlim caiu, o Império Soviético desmoronou, a China continua comunista em termos políticos, mas capitalista na esfera econômica. Entretanto, em todo mundo, o século XX trouxe consigo um processo de degradação moral, de perda de valores, de alteração da família e o aparecimento de órfãos de pais vivos, de orientalismo religioso através do avanço do fundamentalismo Islâmico.

 

Dois males sociais se agigantaram com força nefasta e destrutiva: o terrorismo e o tráfico de drogas com conseqüente consumo de tóxicos. E enquanto a crise econômica que atingiu a nação mais desenvolvida do planeta se espraia por todo mundo, aumentam as explosões sociais das sociedades que, acostumadas ao bem-estar proporcionado pelos avanços proporcionados pela globalização, não se conformam em perdê-los, ou então querem destruí-los para voltarmos em outro mundo possível à Idade da Pedra Lascada.

 

Os ideólogos do atraso pregam contra o progresso adquirido, enquanto, perigosamente, Estados vão readquirindo cada vez mais controle econômico em suas sociedades, o que levará a maior domínio político e social. Aumentam a violência, a falência das empresas, as demissões em massa, enquanto governantes perplexos parecem impotentes diante da crise, em que pesem os esforços empreendidos para atenuá-la. E assim, o mundo do progresso material submerge e acentua a vulgaridade, a superficialidade dos relacionamentos, a propaganda enganosa, o desregramento dos costumes, a perda dos valores, a banalização da vida.

 

Os processos históricos, porém, são dinâmicos, e se o homem não destruir o planeta, poderá vir, em tempo não previsto, um novo Renascimento onde o ser humano evoluirá para construir um mundo, se não perfeito, porque isso é impossível, pelo menos melhor, mais aperfeiçoado, menos pleno de ignorância.

 

Por enquanto, aqui no Brasil, já regredimos à prática do canibalismo, que certamente será descrito com volta à antiga pureza, como politicamente correto ou ecológico. Na verdade, por nossa livre e espontânea vontade estamos todos sendo canibalizados pelo governo. Como bárbaros que estamos nos estando tornando, agradecemos ao pai Estado e submergimos alegremente nas trevas cantando uma marchinha carnavalesca.

 

 

* Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga. (mlucia@sercomtel.com.br)

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Bernardo Santoro

Bernardo Santoro

Mestre em Teoria e Filosofia do Direito (UERJ), Mestrando em Economia (Universidad Francisco Marroquín) e Pós-Graduado em Economia (UERJ). Professor de Economia Política das Faculdades de Direito da UERJ e da UFRJ. Advogado e Diretor-Executivo do Instituto Liberal.

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