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Tem sempre um francês por trás de uma ideia torta

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Ben JonsonBenjamin_Jonson_by_Abraham_van_Blyenberch, grande dramaturgo da Era Elizabetana, já dizia: Generalizations are odious. Tinha toda a razão, ao menos no que se refere ao tipo mais comum de generalização: a generalização abusiva.

Esse é o tipo mais frequentemente encontrado na boca das pessoas na vida cotidiana e consiste no conhecimento particular de meia dúzia de casos indevidamente estendidos a todos os casos.

Por exemplo: sabendo que alguns brasileiros são preguiçosos, e de fato o são, o generalizador não hesita em asseverar veementemente: “Todos os brasileiros são preguiçosos”, o que não é verdade. Há brasileiros que trabalham muito e alguns até gostam de trabalhar!

E é justamente esse leviano tipo de generalização que leva à formação de estereótipos tais como: “Os gregos (modernos) são picaretas”, “Os italianos são falastrões e comilões, etc.

Nesses casos, ocorre um uso descuidado do quantificador universal “Todos os X” e/ou “Para todo e qualquer X”, que não é usado no seu sentido próprio de “Todos os X, sem nenhuma exceção”.

E por isso mesmo, basta um único contraexemplo para tornar falsas generalizações desse tipo.

Antes da descoberta da Austrália, a proposição: “Todos os cisnes são brancos” era tida como verdadeira em toda a Europa. Nunca tinha sido visto um cisne que não fosse branco…

Mas com a chegada dos ingleses à Austrália, essa proposição se revelou falsa. Os cisnes australianos eram tão negros quanto as asas da graúna. Provavelmente, uma aleatória mutação genética.

No entanto, não costumamos usar a linguagem com esse rigor lógico digno de Aristóteles. Usamos “todos” com a acepção de “a avassaladora maioria”. Trata-se de um uso enfático do termo que não deve ser tomado rigorosamente ao pé da letra. É algo semelhante a uma hipérbole (figura de linguagem, não termo da matemática).

David Hume, filósofo escocês do século XVIII, deu uma grande contribuição para a Filosofia, ao elaborar seu famoso argumento contra a indução.

Não há indução sem generalização porque num raciocínio indutivo tomamos conhecimento de alguns casos particulares e chegamos ao geral mediante uma generalização.

Quando se trata de uma generalização restrita a um número finito de casos – a chamada indução por enumeração – não há nenhum problema, pois todos os casos, um a um, foram examinados e o que se afirma de cada um deles, devidamente constatado.

Não é por nada que Francis Bacon, filósofo inglês contemporâneo do dramaturgo Ben Jonson, já dizia: “Inductio per enumerationem res puerilis est [A indução por enumeração é coisa pueril].

Todavia, quando se trata da chamada indução ampliativa, isto é: a que tem a pretensão de cobrir uma classe infinita de casos, aí a coisa torna-se problemática.

Não há nada que nos garanta que uma regularidade observada em muitos casos, do passado ao presente, venha a ocorrer futuramente no caso n+1.

E é por isso que Hume dizia que, apesar do Sol ter nascido bilhões de vezes, não podemos ter certeza (no sentido rigoroso do termo) de que o Astro-Rei nascerá amanhã, embora haja grande probabilidade de que isso ocorra.

Para Hume, a dedução – como a de um silogismo e/ou de um modus ponens – conduz à certeza. Mas a indução jamais conduz à certeza, porém a um grau maior ou menor de probabilidade.

Filósofo inglês contemporâneo, Lord Bertrand Arthur William Russell, ao examinar o conceito de indução e seu caráter probabilístico, conta uma estória muito interessante.

Um fazendeiro costumava dar milho todo dia às suas galinhas. Bastava ele aparecer à porta do galinheiro para que os galináceos ficassem todos alvoroçados. Isto indicava que estava na hora de papar.

Um belo dia, o fazendeiro chega à porta do galinheiro. Se as galinhas pensassem – admitamos isso por mera hipótese – pensariam logo: “Oba, chegou o fazendeiro, vamos encher a pança!”

Mas o fazendeiro entra no galinheiro, pega uma das galinhas mais gordinhas, torce seu pescoço e a leva para a panela!

Moral da estória: a dedução, uma vez feita de acordo com princípios lógicos, não falha jamais. Porém a indução corre sempre o risco, maior ou menor, de falhar… E é por isso mesmo que os únicos saberes exatos (no sentido rigoroso do termo) são a Matemática Pura e a Lógica Formal.

Apesar das ponderações de Bacon, Hume e de Russell, o fato é que não podemos deixar de fazer generalizações ao longo das nossas vidas neste mundo, mesmo correndo o risco de fazer generalizações abusivas ou, coisa pior, gerar muitos estereótipos.

Contudo, eu não tinha a pretensão de dar uma aula de Filosofia em estilo tipicamente britânico como, aliás, sempre faço com inenarrável prazer.

Se disse tudo isso acima, é porque em alguns artigos fiz uma generalização que não pretendia ser abusiva nem tampouco era expressão de mero estereótipo, porém um modo enfático de dizer as coisas. “Tem sempre um francês por trás de uma ideia torta”.

Eu aludia aos bem-pensantes franceses, principalmente os assim chamados “pós-modernos”: Michel Foucault, Jacques Derrida, Gilles Deleuze et caterva.

Eles costumam fazer intragáveis coquetéis ideológicos e brindar a “Santíssima Trindade” pós-moderna: Marx, Nietzsche e Freud, argh!

[Já está escrito e aguarda um editor interessado meu livro: Nem Marx, Nem Nietzsche, Nem Freud, com perdão para esse marketing pessoal].

Ao afirmar isso, pus de lado o rigor lógico e tive a intenção de ser enfático, para causar uma forte impressão no leitor. Mas longe de mim uma afirmação leviana e sem nenhum fundamento.

Estou certo de que meu amigo Rodrigo Constantino, ao mencionar minha enfática asserção num artigo em que criticava asperamente o pensante francês Thomas Piketty, compreendeu bem o espírito da minha generalização.

Piketty_in_CambridgeTrata-se do autor do livro O Capital no Século XXI. Ainda não o li, para dizer qualquer coisa sobre ele, mas há uma afirmação nele que basta para qualificá-lo como membro da esquerda delirante ou da esquerda caviar, como gosta de chamá-la o Rodrigo.

Piketty propõe, entre outros absurdos, um imposto de 80% sobre ganhos de capital aplicado aos “mais ricos”. Disto se infere que esse pensante francês pensa como a maioria dos ressentidos intelectualóides brasileiros:

Eles não querem que os pobres fiquem ricos, porém que os ricos fiquem pobres. Desse modo, conseguiriam atingir a igualdade na miséria. Isso se chama igualitarismo e/ou nivelamento por baixo.

José Guilherme Merquior, em seu livro Liberalism Old and New, apresenta o pensamento de um pensador e político francês, cujo nome não me lembro, que costumava exortar o povo em geral dizendo: Enrichessez-vous! (Enriquecei-vos!). Ah! Bons tempos…

Essa exortação é simplesmente impensável saindo da boca dos pós-modernos franceses e brasileiros.

Antes de ser vista como um bem apreciável, a riqueza passou a ser um maldito “sonho burguês” e o sucesso na vida, uma ofensa pessoal, como disse recentemente um pop star brasileiro. Haja ressentimento!

Há um deputado brasileiro, cujo nome não me lembro, que tem um projeto dessa mesma cepa. Chama-o de “empréstimo compulsório”. Já assisti a este filme e o final foi decepcionante. (Os ossos de Aristóteles se agitam no túmulo diante dessa descarada contradictio in adjectio!). Se é empréstimo, como pode ser compulsório? E se é compulsório, está mais perto de um imposto (particípio passado do verbo impor).

Os “mais ricos” seriam obrigados a dar dinheiro ao governo federal e o teriam de volta após 15 anos! Mas quem são, para este sofista tupiniquim, “os mais ricos”? Ora, todo aquele que ganha mais de R$9.000 (nove mil reais). Pode?! M’engana qu’eu gosto!

Ah! Eu, simples professor universitário, com 36 anos de carreira, estou entre “os mais ricos”, e não sabia! Pertenço à mesma classe social do Eike Batista, apesar de não ter um filho chamado Thor nem um pai chamado Wotan (ou Odin).

Lendo, porém, nas páginas amarelas de Veja (ano 47, n.o 19) uma excelente entrevista com o Prof. Dr. Cláudio Haddad – PhD em Economia pela Universidade de Chicago – (nenhum parentesco de sangue e/ou de ideologia com o Prefeito de S. Paulo), deparei-me com uma passagem muito próxima da minha franca francofobia.

Haddad estava criticando, virulenta e justamente, a esquerdização no ensino no Brasil atual, e Veja perguntou: “Isso é uma característica exclusiva da educação brasileira?”. Haddad respondeu na bucha:

“Não. Há um movimento atualmente na França destinado a revisar o ensino da Economia que, com o tempo, foi se tornando distorcidamente anticapitalista. Está sendo difícil na França restaurar o equilíbrio”.

“No Brasil a situação é pior. Aqui o discurso ideológico se mistura com a falta de conhecimento. O resultado é desastroso. É o triunfo de uma visão de mundo simplista e equivocada. (…) A prova do MEC é um espelho dessa simplificação”.

Recentemente, uma equipe da TV Globo fez provas do ENEM. Todos deram propositalmente respostas absurdas, tais como: “O automóvel foi inventado na Idade Média”, e nenhum deles foi reprovado! Deus me livre e guarde!

E é por isso que os posudos e arrogantes argentinos nos chamam de Los Macaquitos. Brasileiros, em geral, imitam os americanos, mas somente no que eles têm de ruim. Se são intelectuais, os brasileiros adoram as modas de Paris, não clássicos como Montesquieu, Voltaire, Tocqueville, etc.

E é por essas e outras que o ator Gérard Depardieu já manifestou a vontade de se mudar para a Rússia. Para ele, não pode ser pior do que a douce France. Será mesmo?

Milhares de jovens franceses se veem diante de duas alternativas: fazer concurso público (como os incontáveis concurseiros brasileiros) ou atravessar o Mer de La Manche (ou English Channel, como é chamado do outro lado). Empreendedorismo? Meritocracia? Competição leal? Tributação razoável? Jamais, mon ami! 

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Mario Guerreiro

Mario Guerreiro

Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor do Depto. de Filosofia da UFRJ. Membro Fundador da Sociedade Brasileira de Análise Filosófica. Membro Fundador da Sociedade de Economia Personalista. Membro do Instituto Liberal do Rio de Janeiro e da Sociedade de Estudos Filosóficos e Interdisciplinares da UniverCidade.

3 comentários em “Tem sempre um francês por trás de uma ideia torta

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    08/05/2014 em 10:57 am
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    Perdão a ignorância (mas ao mesmo tempo fique curioso), mas o que Marx, Nietzsche e Freud tem em comum mesmo? E o que os eles teriam de pós moderno mesmo, a não ser Nietzsche talvez?? Alguma relação entre esses pensadores seres alemães e os pensamentos tortos dos franceses? tudo muito nebuloso, mas eu “no geral” concordo que a França so tem trazido uma masturbação mental inútil.

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    07/05/2014 em 2:08 pm
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    Duas pequenas objeções:
    A primeira é superficial e simplesmente estética. Por que ainda usa o termo “estória”? Num texto de conteúdo tão moderno e oportuno, este vocábulo dá um tom mofado à sua escrita.
    A segunda sequer pode ser uma objeção propriamente dita. Na verdade, seria apenas uma curiosidade intelectual. Por que Nietzsche foi posto ao lado de Freud e Marx?

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    07/05/2014 em 9:27 am
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    Não gosto de perder tempo lendo ou ouvindo besteiras. É por isso que não lerei o livro deste senhor. É por isso que não assisto pronunciamentos oficiais da presidente, muito menos entrevistas do Mantega, o nosso antiprofeta (tudo o que promete acontece ao contrário).

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